Não estou aqui a falar do Benfica, por amanhã ser dia de "derby" na Luz, nem tão pouco por ter decidido ser benfiquista numa família de sportinguistas.
Até porque já devia ser adolescente quando soube o porquê do sportinguismo da minha mãe. A história sobre o sportinguismo do meu pai ainda é mais recente. Como nunca lhe perguntei, ele também nunca me contou essa e tantas outras coisas que ficaram por contar sobre a sua vida. Há pouco tempo tive uma conversa deliciosa com o meu tio Valentim, em que ele desfiou um bom novelo de memórias sobre a sua infância e juventude. Fiquei a saber muitas coisas sobre o meu pai, o seu irmão mais velho que o trouxe para a Capital e foi tão importante na sua vida. Foi também no decorrer desta conversa que soube a razão do seu sportinguismo.
O meu pai e os irmãos nasceram na Beira Baixa, numa das muitas aldeia perdidas do interior, distantes do "mundo". Um dia apareceu lá na aldeia um tio, que trazia nos bolsos uns cromos do Sporting da Covilhã, que estava nessa altura na primeira divisão (nos anos quarenta do século passado), e acabou por os oferecer aos sobrinhos. Aquelas imagens a cores foram uma autêntica novidade para quem nunca saíra dali e pouco sabia sobre futebol. A alegria deles foi tanta que nunca mais deixaram de gostar das camisas listradas a verde e branco do Sporting da Covilhã e do de Portugal.
A minha mãe antes de ser sportinguista, começou por ser anti-benfiquista, porque durante a passagem do Caldas pela primeira divisão (nos anos cinquenta...), numa das visitas do Benfica este ficou alojado no Hotel Lisbonense e os seus craques resolveram levar da Cidade uns "recuerdos" sem avisar a gerência, tais como talheres, toalhas, copos, etc. Na altura isto foi um escândalo local, e quem não gostava da equipa da Luz ainda ficou a gostar menos, como foi o caso da minha mãe.
A outra razão para não ser benfiquista é muito mais arrepiante e foi-me contada há mais de vinte anos por uma amiga, que por uma razão qualquer me explicou porque não gostava do Benfica.
Quando ainda não se falava de violência doméstica, era costume um vizinho agredir a mulher e os filhos, especialmente quando o Benfica perdia, mesmo na casa ao lado dela. Toda a vizinhança ouvia a gritaria, o barulho de coisas a partirem-se e os choros, ao qual se seguia sempre um silêncio sepulcral. Ela também chorava muitas vezes no seu quarto, de raiva, por ninguém entrar naquela casa e parar aquele animal. Tinha catorze anos quando se mudou para o centro da cidade e deixou de assistir a este espectáculo degradante, mas nunca o esqueceu. Nem nunca conseguiu perdoar ao Benfica, mesmo que fosse apenas um elemento secundário em toda a história.
Naturalmente, não deixei de ser benfiquista por estas duas histórias. Na época ainda utilizei um argumento para defender o Benfica, mas nada de muito relevante para a história. Importante é dizer que tenho muita vergonha de todos os cobardes que aproveitam as derrotas e as vitórias de um desporto qualquer - que devia ser apenas isso -, para deitarem fora a raiva e a frustração de uma vida falhada, no corpo de inocentes, que se calam tempo demais, quase sempre por amor...
A fotografia é de Maurice Tabard.
Pois eu suponho que a minha ligação forte ao Porto explica em grande parte a minha preferência clubística :-)
ResponderEliminarBeijos, azuis.
Grande senhora a sua mãe! Parabéns! Nos tempos cinzento-negros do salazarismo dizia-se "quem não é benfiquista não é bom chefe de família" e era vulgar os dito bons chefes de família embebedarem-se violentamente de o seu clube perdia (ou ganhava, seria igual!) chegarem a casa e baterem na mulher e nos filhos. Só porque sim! Como não ser anti-benfiquista?
ResponderEliminarAtualmente, com a bela ideia da "jaula" para meter os adeptos do Sporting, volto a dizer: como não ser anti-benfiquista?
Comportamentos de trogloditas!
O título está muito adequado ao texto.
ResponderEliminarbeijinho
Gábi
acredito que sim, Filoxera.
ResponderEliminarse fosse do Porto, quase de certeza que também era do FC Porto.
Carol, isso foi um rótulo que quiseram colar aos benfiquistas, desde o bom chefe de família ao agressor da família.
ResponderEliminarhá gente boa e má em todo o lado.
a ideia da "prisão" foi tão boa, que deu no que deu. :(
eu sou a fazer títulos, Gábi. :)
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