domingo, outubro 31, 2010

Os Símbolos dos Clubes

O Benfica homenageou hoje os seus primeiros campeões europeus, de 1960/61, quase cinquenta anos depois da proeza.

Felizmente estas acções são normais no clube da Luz, que nunca se esquece que os títulos e as vitórias, foram conquistados por gente especial, que contribuiu de uma forma ímpar para
a grandeza do Benfica.

Percebe-se que Guilherme Espírito Santo, Rogério "Pipi", Mário Coluna, José Augusto, Eusébio, Jaime Graça, Tony, Humberto Coelho, Nené, Shéu ou Chalana, embora pertençam a gerações diferentes, são respeitados da mesma forma pelo clube que representaram e pelos seus associados e simpatizantes.

Esta homenagem fez com que recordasse o desabafo de Vítor Baía, onde ficou expresso algum desencanto pela forma como foi dispensado pelo F.C.Porto. Ele disse que se tivesse representado o Benfica ou o Sporting, seria olhado de outra forma, e de facto tem razão, pois estes clubes tratam de outra forma os seus campeões.

Vítor Baía seria seguramente mais respeitado na Luz ou em Alvalade, que no Dragão, pois no F.C.Porto é demasiado evidente que o ego do presidente Pinto da Costa, não admite qualquer tipo de "sombra".

sábado, outubro 30, 2010

Sempre o Humor de Mão Dada com o Drama

Este "boneco" de Luís Afonso, publicado na revista "Sábado" de 21 de Fevereiro de 2008, está mais actual que nunca...

O humor é algo quase intemporal, é por isso que sorrimos quando olhamos os "bonecos" do grande Rafael Bordalo Pinheiro, com mais de cem anos...

Infelizmente ou felizmente, sorrir continua a ser o melhor remédio para enfrentarmos os problemas de sempre, com políticos que revelam a mesma incompetência de sempre (salvo as excepções que confirmam a regra...).

sexta-feira, outubro 29, 2010

Provavelmente sim, ou Talvez não...

O Mohamed qualquer coisa passou quase ao nosso lado acompanhado por uma das suas sete mulheres, que o seguia atrás, de cabeça baixa.

Américo ia fazendo desaparecer um cigarro, ao mesmo tempo que criava nuvens à volta da nossa mesa da esplanada. Calado e desatento à nossa conversa, foi o único que o viu passar e disse:

«O sonho secreto de todos os homens, mesmo que finjam que não, é ter um "harém", por muito pequeno que seja.»

Só percebemos o porquê da frase, quando ele nos apontou com o olhar o comerciante das arábias, que atravessava a rua na passadeira mais próxima.

A frase interrompeu a conversa ligeira sobre a greve dos árbitros e animou a mesa, como animam quase todas as conversas que metem mulheres, nas mesas de homens. O primeiro a responder ao Américo foi o Adriano:

«Acho que sim. E porque não o sonho também de muitas mulheres? Quando pensamos melhor, esta possibilidade de mudar, às vezes dá um certo jeito...»

A conversa manteve-se animada até que o "pacheco pereira" de Cacilhas se intrometeu, para nos chamar à razão:

«Se uma mulher já nos dá tantos trabalhos, imaginem meia dúzia...»

Voltámos a perder o sorriso e a falar, desta vez não de árbitros, mas da canção do Zé Mário Branco sobre o pesadelo do FMI, que se aproximava, cada vez mais, do nosso cantinho...
Fiquei a pensar que o mundo era mais giro e alegre sem a presença dos "pachecos pereiras"...
O óleo é de Pierre de Mougins.

quinta-feira, outubro 28, 2010

Pequenos Gestos Fazem Toda a Diferença

Já li e ouvi algumas criticas à atitude de Ana Paula Vitorino, por há largos meses, ter negado ser vitima de pressões, em relação ao caso "face oculta", aos jornalistas, e de agora dizer o contrário, ao ser inquirida pela investigação do caso.

Nessa altura ela era secretária de estado do ministério mais "perigoso", com a tutela das obras públicas e dos transportes, no tempo áureos do TGV e do novo aeroporto, negócios com muitos zeros, que deixavam tanta gente com água na boca...

Não conheço a senhora, mas acho a sua atitude correcta e louvável, pois o país está farto de "teresas costas macedo", que enchem páginas de jornais e são presença assídua em programas de televisão com testemunhos de tudo e mais alguma coisa, e que depois, quando são interrogadas em sede própria, pelas polícias e pelo ministério público, dizem precisamente o contrário. Muita desta gente até é capaz de dizer que afinal não viu nada, que foi tudo invenção dos jornais e das televisões.

Muitas vezes têm é azar, pois são tão vaidosas que ao falarem para as câmaras e para os microfones, deixam um rasto maior que o da pata de um elefante, e sempre de dedo em riste...

O óleo é da Jacqueline Osborne (embora o Verão já tenha partido, a senhora até usa um fato de banho outonal...)

terça-feira, outubro 26, 2010

Irresistível

Vi esta fotografia, dos anos noventa, e não resisti, tive de a colocar hoje, por ser um dia especial no "cavaquistão".


Não sei se estamos na presença do senhor Silva ou do presidente Cavaco. Um gere muito bem os silêncios, porque sabe que "burro calado se torna sábio ". O outro estraga tudo quando abre a boca para mastigar... e desta vez nem foi bolo rei, presumo que tenha sido pêra rocha...
A fotografia é de Luís Vasconcelos.

domingo, outubro 24, 2010

Sinais de Outono

Há cada vez mais sinais de Outono à nossa volta.

No começo da manhã e ao fim da tarde já se notam diferenças na temperatura, somos obrigados a vestir um casaco ou uma camisola para nos protegermos do frio.


Mas onde se notam mais os sinais de Outono, é nos campos, com as folhas das árvores a ganharem tonalidades entre o dourado e o castanho, ao mesmo tempo que começam a esvoaçar com o vento, que também sopra mais forte de Norte e de Sul.

Hoje vi voar e cair a primeira folha a meus pés...


O óleo é de Luís Serrano.

quinta-feira, outubro 21, 2010

A Janela da Casa de Jantar...

Eu fui assim, olhei muito o mundo pela janela da nossa casa de jantar, principalmente de Inverno.
Era pequenote mas lembro-me bem daquele espectáculo, de quando o tempo ficava péssimo e eu era proibido de sair para a rua.
E como a nossa rua era perigosa nesse Inverno longínquo do meu contentamento, ainda sem alcatrão...
Quando chovia as estradas de areia e barro do Bairro dos Arneiros, onde cresci, ficavam transformadas num autêntico lamaçal...
Um dos meus prazeres era ficar ali, a ver os poucos carros que passavam, a "pintarem" de castanho as pessoas que passavam, que barafustavam com os condutores, embora fosse impossível circular sem dar banho a quem se cruzava no caminho...
As pessoas encharcadas caminhavam aos ziguezagues e aos saltos, numa tentativa de fintar as poças da tal água castanha, enquanto eu as olhava como se estivesse a ver um filme, sem pensar no seu mau estar e na necessidade de terem de sair para a rua, para ir às compras ou para o trabalho...

O óleo é de Denis Ithikovkin.

quarta-feira, outubro 20, 2010

O Pudor e as Lendas

O pudor não é apenas um palavrão esquisito, é muito mais que isso.

Tanto pode lutar contra nós, para que tenhamos o comportamento de "meninos do coro", como ainda é capaz de nos "castrar", de nos fazer apagar estórias que queriam ser muito mais que ficções.

Algumas vezes dou por mim a pensar, como seria eu se não tivesse sido educado segundo a "moral católica" e não chego a conclusão nenhuma.

Nem sequer sei se seria mais livre. Talvez fosse mais vazio. Ou talvez não, talvez partisse em busca do sentido das coisas, com mais cepticismo. Digo isto porque a ideia de Deus acaba sempre por explicar o que não tem explicação nenhuma, mesmo que seja pouco credível.

Por outro lado há quem não tenha qualquer religião e cultive o pudor.

Acho que fazemos muita confusão entre os valores éticos e os valores da "fé". Esquecemos-nos que a ideia do bem e do mal não é um exclusivo das religiões. Provavelmente a filosofia fez mais por ela que todos os "credos" que nos condicionam, directa e indirectamente.


O mais curioso neste texto, é que não era para escrever sobre o Pudor, mas sim sobre as Lendas que nos "vendem" aqui e ali. Sobre os "milagres" que resistem e que se agarram à história dos lugares, de uma forma incrível.
Sim, porque foi impossível "vender" ao meu filho de doze anos a estória da existência da marca da pata do cavalo de D. Fuas Roupinho, no Sitio da Nazaré...

segunda-feira, outubro 18, 2010

Mar e Sol

O último fim de semana teve muito Sol, nem parecia que já tinhamos atravessado metade de Outubro.
Foi por isso que me soube bem voltar ao meu Mar, ver a Ilha misteriosa da infância (a tal que devia ter tesouros de piratas e tudo...), tantas vezes escondida pelo manto de neblina, ao mesmo tempo que assistia ao mergulho do Sol no Oceano.
Deu para aproveitar bem o momento e tirar várias fotos...

quinta-feira, outubro 14, 2010

Almoço com Bilhete de Viagem

Almocei há pouco com um amigo raro, que encontro muito menos vezes que as que queria.

Recuámos no tempo e falámos de pessoas, lugares, até voltámos à noite lisboeta que nos empurrava fora de horas para espaços distintos, que tanto podiam estar povoados de "putas" a tomarem a ceia (guardadas por proxenetas de casacos amarelos, vermelhos, camisas berrantes de colarinhos grandes, e claro, dentes e fios de ouro, que brilhavam quando se cruzavam com as luzes dos candeeiros, dignos de qualquer filme) - como eram os casos do "Truque" ou da "Cave do Vale" - ou de "paneleiros" (discretos e indiscretos...), do "Finalmente" ao "Harris".

Isto porque as discotecas e bares normalizados fechavam às quatro da manhã e depois desta hora, só era possível beber uma cerveja nos espaços alternativos, abertos. Aventuras da primeira metade dos anos oitenta do século passado, em que quase ninguém tinha carro e o primeiro cacilheiro só se banhava no Tejo, quase às seis da manhã...

Este meu amigo era o mais bem sucedido com a fauna feminina, por razões que escapam quase sempre à compreensão masculina. Era e é uma pessoa extremamente séria, mas quando estava com uma mulher, era capaz de lhes contar as histórias mais absurdas, satisfazendo para lá dos limites do tolerável, a curiosidade e a intuição feminina. Muitas vezes eu tinha de virar a cara para o lado para não me desmanchar a rir.

Quando lhe disse que ele é que devia escrever estórias e não eu, sorriu com o ar malandro que ainda mantém.

Recordámos quando um dos nossos amigos comuns quis saber qual era o truque que ele usava: «tens de me explicar como é que engatas as gajas.» E explicou, com um ar sério: «primeiro olho bem para elas, depois finjo que me esqueci da sua presença. Escondo-me, atrás das colunas ou das pessoas e fico a ver se elas andam com a cabeça no ar, à minha procura. E está feito.»

O nosso amigo seguiu à letra as instruções, mas de pouco ou nada lhe valeram, olhava-as profundamente, escondia-se e recebia toneladas de indiferença...

Há coisas que não se explicam e embora hoje existam muitos livros de "auxílio", provavelmente é necessário um livro de instruções para cada mulher...

O óleo é de Pierre de Mougins.

quarta-feira, outubro 13, 2010

O Regresso das Profundezas

Segundo as últimas notícias, os primeiros mineiros chilenos aprestam-se para subir, a caminho da superfície, depois de terem passado mais de dois meses, isolados num pequeno recanto, a setecentos metros de profundidade.

Graças aos avanços tecnológicos foi possível conseguir o que há uma dúzia de anos não passaria de um milagre.

É a prova de que nem tudo é mau, neste tempo de "crises"...

Só nos resta esperar que a operação de resgate seja um sucesso, que os trinta e três mineiros regressem bem, sem complicações de maior, preparados para este saudado "renascimento" pelo mundo inteiro...

A fotografia mostra outros mineiros, mais descontraídos, acompanhados do amigo "cigarro", que hoje é tratado como um verdadeiro "assassino"...

terça-feira, outubro 12, 2010

Mulheres Sim, Homens Não

Pensava que a homossexualidade já era encarada com normalidade na nossa sociedade, não estava à espera de assistir a um diálogo, quase a roçar o ordinário, entre a dona do café e um cliente, que estava a meu lado.

A conversa teve inicio assim que um um rapaz deixou o balcão do café, com a discrição possível. O fulano virou-se logo para a mulher que me tinha acabado de servir o café e disse: «viu esta coisa? O mundo está mesmo perdido!» Recebeu como resposta feminina: «e ainda não viu o outro, esse até pinta as unhas dos pés.» Ele foi ainda mais longe: «esta gente devia ser proibida de andar na rua e frequentar lugares públicos.» A mulher resolveu meter mais gente na conversa: «mas não são só eles que entram aqui, há duas jeitosas que passam aqui de manhã, que também não enganam ninguém.»

«Ah, mas elas são diferentes. Agora estas aberrações...»

De repente apeteceu-me meter na conversa, perguntar quais eram as diferenças entre um homem e uma mulher "gay", ao sujeito tão entendido em homossexualidade. Lá me contive, paguei o café e sai em silêncio, enquanto eles continuavam com o "disco".

Pensava que já não havia disto, que esta etapa já estava ultrapassada. Puro engano. Só espero que o janota, vestido com roupas de marca, não tenha nenhum filho ou neto, "bicha"...


O óleo é de Francis O' Leary.

segunda-feira, outubro 11, 2010

Uma Rameira Diferente (IV)

«O passeio a Espanha foi a oportunidade de ouro para o avô e a amiga se conhecerem melhor, ainda por cima fora do ambiente de "alcova".

Passaram momentos inesquecíveis nos primeiros dias, aproveitando a aventura da melhor maneira, como se o amor andasse no ar.

Visitaram museus e monumentos, frequentaram restaurantes e cafés, assistiram a espectáculos musicais e de variedades, sempre de braço dado, como se fossem marido e mulher.

Toda aquela magia só foi quebrada na terceira noite, quando o avô sentiu uma forte dor de cabeça, algo que raramente lhe acontecia. Depois do jantar preferiu ficar a descansar no quarto, sem sair à noite. Ela fez-lhe um pouco de companhia e depois disse que ia até ao bar do hotel ouvir um pouco de música. Foi e só voltou depois da meia noite...

O avô ainda resmungou, mas ela deu-lhe um beijo e desceu. Este incidente fez com que ele percebesse pela primeira vez que ela era uma mulher demasiado livre, pelo menos para a sua mentalidade e educação.

Embora ela não tivesse percebido de imediato, muitas coisa mudaram nessa noite.

O avô tentou disfarçar mas não conseguiu e a magia foi se quebrando pelas ruas de Madrid...

Regressaram dois dias depois e nada voltou a ser como dantes.

O avô não mais visitou o bordel.

Curiosamente continuou a enviar-lhe livros, duas vezes por ano, no dia do seu aniversário e no Natal.»

(é um dos possíveis finais deste "conto"... que tem como pano de fundo o início dos anos sessenta do século passado)

O óleo é de Mark Keller.

domingo, outubro 10, 2010

A Minha Barbearia

Embora não seja um freguês muito assíduo, pois corto o cabelo quase de três em três meses, frequento uma barbearia especial - aliás, estes espaços são quase todas especiais -, onde quem me corta o cabelo é uma mulher.

Enquanto ela faz desaparecer a "trunfa", conversamos sobre isto e aquilo. Desta vez achei-a mais calada que o costume, foi então que procurei satisfazer a minha curiosidade, com uma pergunta que poderá ser entendida quase como "sexista": como é que ela tinha ido parar ali, aquele reduto tradicionalmente masculino.

Ela, com a sua simplicidade contou-me que já estava ali há dezassete anos, e que antes trabalhara num cabeleireiro de senhoras, mas por necessidades financeiras teve de arranjar um outro trabalho, onde fosse mais bem paga.

Depois falámos da diversidade de ambientes existentes num cabeleireiro e numa barbearia, e claro, das diferenças mais nítidas entre os homens e mulheres, o género de conversas, as exigências, as intrigas, etc.

Fiquei a saber, entre outras coisas, que os homens são mais exigentes e chatos que as mulheres em relação ao corte e penteado. E esta?

Foi então que entrou um daqueles homens que nós tradicionalmente chamamos de "molheres", que adoram falar da vida dos outros, com pormenores que inquietam qualquer pessoa.

Mal ele sonhava que tínhamos acabado de falar do "género" e que nos fez sorrir com cumplicidade...

O óleo é de Leone Holzhaus.

sexta-feira, outubro 08, 2010

Mário Vargas Llosa, Nobel da Literatura

Sei que escrever hoje sobre o Prémio Nobel da Literatura soa quase a lugar comum. Mesmo assim acho que devo dizer algo sobre Mário Vargas Llosa e sobre a magia da literatura da "latina-america".

As minhas leituras de autores da América do Sul começaram com Gabriel Garcia Marquez e os seus "Cem Anos de Solidão" (passando ao lado de Jorge Amado, claro, que é quase português e de quem li ainda na adolescência coisas tão deliciosas e marcantes como os "Capitães da Areia", "Mar Morto", "Navegação de Cabotagem" ou "Capitão de longo Curso").

Depois fui lendo Pablo Neruda, Mário Vargas Llosa, Luís Sepúlveda, Juan Rulfo, entre outros, cuja magia das palavras, conseguia tornar a vida dorida e difícil dos povos deste continente, ainda mais inquietante.

Sei que as ditaduras e os ditadores não fazem bem a ninguém, mas penso que sem a sua existência, a literatura latino-americana, não seria tão rica.

Há ainda outra coisa que quero referir, sabe-me sempre melhor que o Prémio Nobel, seja ganho por alguém que eu conheça, de quem já tenha lido livros, que de um autor, do qual nunca tenha ouvido falar (e isso tem acontecido vezes demais nos últimos anos, para um prémio tão importante como este).

Parabéns Mário!


A fotografia que publico é da autoria da sua filha, Morgana Vargas Llosa.

quinta-feira, outubro 07, 2010

Uma Rameira Diferente (III)

«Quando o avô me falou do livro de Hemingway, que foi bem adaptado ao cinema e deu um bonito filme sobre a Guerra Civil Espanhola, com Ingrid Bergman e Gary Cooper, perguntei-lhe, porquê aquele livro.

O avô respondeu-me simplesmente porque era e é um bom livro. E tinha toda a razão. Só não imaginava o que vinha atrás do livro...

O livro e outras histórias sobre o país vizinho, que foram aparecendo nas conversas, fizeram com que a senhora lhe fizesse um convite aliciante e perigoso: fazerem uma viagem a Espanha, os dois.

Apanhado de surpresa, o avô disse logo que não podia. Mas ela era lá mulher para desistir e disse para ele ir pensando no assunto.

O que é certo é que dois meses depois ele ficou convencido e lá foram de comboio até Madrid, de braço dado.

Quando quis saber qual fora a desculpa que arranjara, sorriu, acrescentando que nesse tempo era fácil inventar desculpas, num mundo ainda moldado à imagem do homem.
Embora nem fosse um adepto fervoroso de futebol e do Benfica, aproveitou a euforia da primeira metade dos anos sessenta, provocada pelo Eusébio, para fingir que ia acompanhar o clube da Luz à capital espanhola...


O óleo é de Maria José Aguillar.

quarta-feira, outubro 06, 2010

Bolo de Aniversário da SIC Sem Cerejas

Nos últimos anos temos sido "educados" a encarar as coisas mais bizarras como normais. E nem estou a falar das "cambalhotas" e dos "pinos" dos políticos. Falo sim da tentativa frustrada de se "apagar" da fotografia, pessoas cujo valor ultrapassará sempre a vontade da gente pequenina, que, graças ao poder que tem, pensa que "pode fazer tudo", inclusive "fintar" o rumo da história.


Foi assim que Paulo Portas tratou Freitas do Amaral. É assim que Pinto Balsemão trata Emídio Rangel.

Rangel pode ter todos os defeitos do mundo, mas foi o grande responsável pelo sucesso da SIC como meio de comunicação e de entretenimento televisivo.

É a cereja maior que falta no bolo de aniversário de hoje, mas há mais gente esquecida, neste lugar onde a hipocrisia, a inveja a incompetência e a vaidade, continuam a dar cartas...

Estou completamente à vontade para escrever isto, pois só falei com Emídio Rangel uma vez, há quase vinte anos, ainda era ele responsável pela TSF.

O óleo é de Fernando Lopez Pascual.


segunda-feira, outubro 04, 2010

Almada Antecipou a República

Almada faz jus à sua situação geográfica, na Margem Esquerda do Tejo e sempre que pode antecipa-se às revoluções, foi assim a 23 de Junho de 1833 e também a 4 de Outubro de 1910. E se recuarmos mais algum tempo, em 1580 também vendeu cara a derrota aos espanhóis...
Voltando ao 4 de Outubro, de há exactamente cem anos, a presença de dois dirigentes republicanos e a acção dos agentes políticos locais, com realce para Bartolomeu Constantino, sapateiro de profissão e ainda mais revolucionário que os próprios republicanos, graças ao seu ideário, próximo do socialismo e do anarquismo, fizeram com que Almada se tornasse republicana, antes do tempo.
Bartolomeu Constantino tinha qualidade oratórias invulgares e foram as suas palavras, junto das fábricas, que conseguiram trazer para a rua cerca de oito mil operários, que percorreram as principais artérias de Almada, com vivas à República, e claro, com outros "mimos" muito menos agradáveis, em relação ao Rei, à Monarquia e à própria Igreja.
O cortejo revolucionário só parou em frente aos Paços do Concelho, ocupados pacificamente e onde se ergueu a Bandeira do Centro Republicano Capitão Leitão e se fizeram discursos inflamados pelas principais figuras da revolta.
O Castelo de Almada também foi ocupado, com a cumplicidade da guarnição, que viu ser içada a Bandeira do Centro Republicano Elias Garcia.
E mais uma vez se fez história em Almada, antes do tempo...

Nota:
A República também foi proclamada a 4 de Outubro no Barreiro, Loures, e Aldeia Galega (Montijo).

domingo, outubro 03, 2010

O Filme do Desassossego

Se há um filme que quero ver, é o "Filme do Desassossego" de João Botelho.
Tenho uma grande curiosidade em ver o que o realizador fez deste livro.
Pessoa escreveu nas suas páginas: «[...] Cheguei hoje, de repente, a uma sensação absurda e justa. Reparei, num relâmpago, aquilo onde supus uma cidade era um plaino deserto; e a luz sinistra que me mostrou a mim não revelou céu acima dele. Roubaram-me o poder ser antes que o mundo fosse. [...]»
João Botelho disse à "Ipsilon, a 24 de Setembro", algumas coisas sobre o filme. Escolhi estas:
«"O Livro do Desassossego" não é um livro definitivo, é um livro aberto.»
«O filme são fragmentos em série, tal como a escrita de Bernardo Soares.»
«Quis mudar a geografia de Lisboa porque Pessoa foi o maior viajante do mundo sem nunca ter saído da cidade.»
E tal como ele também tenho pena, mas:
«Desapareceu a ideia da sala escura, a dignidade do espectáculo.»
Vejo pelos meus filhos, que não conseguem separar as pipocas dos filme que vêem numa das salas dos centros comerciais...

sexta-feira, outubro 01, 2010

Uma Rameira Diferente (II)

«Durante largos meses não voltámos a falar da mulher misteriosa, que o avô visitara num dos bordeis da cidade.


Estava longe de ter esquecido a nossa conversa. Por vezes, quando pegava num livro, era perseguido por pensamentos estranhos. Sentia vontade de recuar no tempo, de visitar aquele lugar, de conhecer aquela mulher. Ficavam sempre no ar várias questões: como seria ela, além de culta e agradável? Porque venderia o corpo? Porque gostava de livros?

O mais estranho foi nunca ter sentido qualquer repulsa ou pena da avó, por ser traída por uma mulher da vida. Não sei se pela cumplicidade que me ligava ao avô, se por ter achado aquela aventura tão pitoresca.

Pensei várias vezes em puxar o assunto quando nos encontrávamos apenas os dois. Mas era tão difícil arranjar um pretexto ocasional...

Estava a ler, "Por Quem os Sinos Dobram" - um dos melhores romances de Hemingway -, quando o avô me perguntou se estava a gostar do livro. Disse-lhe que sim. Ele sentou-se e confidenciou-me que tinha oferecido um exemplar da obra à sua amiga.»

O óleo é de Peter Samuelson.