terça-feira, novembro 30, 2021

«Deixámos fugir o Tempo...»


«Deixámos fugir o Tempo...»

Sorrio, sem saber o que dizer. E ele continua: «Era tão bom termos Tempo para conversar.»

Deixo cair o sorriso. Ele tem razão. Andamos a correr de um lado para o outro como baratas tontas, a perder Tempo com inutilidades. 

Ele continua a dizer coisas, demasiado certeiras, sobre este nosso Tempo...

«Há já algum Tempo que deixámos de olhar para os outros. Já viste que só nós dois é que temos telemóveis da idade da pedra? Daqueles que só servem para telefonar?»

Diz isto com orgulho. Detesta que uma simples maquineta rectangular seja o "deus" destes Tempos modernos. 

E depois volta a insistir: «Como é que fomos tão estúpidos, ao ponto de deixarmos fugir, o Tempo, uma coisa que nos era tão preciosa?»

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, novembro 29, 2021

O Futebol (por cá e no mundo) de Farsa em Farsa...


De repente toda a gente ficou escandalizada por uma equipa da Primeira Liga, ter começado um jogo de futebol apenas com nove jogadores (provavelmente por ter sido contra o Benfica e por este já estar a vencer por sete a zero ao intervalo...).

Aceito que isto faça confusão ao cidadão comum, agora aos dirigentes dos clubes...  oh "santa hipocrisia". Sim, foram estes mesmos clubes que aprovaram nas reuniões da Liga (a bem do negócio...), que o futebol não podia parar durante a pandemia e todos os clubes eram obrigados a ir a jogo, desde que tivessem sete jogadores disponíveis para entrarem em campo (o número mínimo autorizado, para que os clubes não perdessem por falta de comparência...). Nessa altura não pensaram na aberração que estavam a aprovar, pois qualquer equipa que entre em campo com menos de onze jogadores, entra logo a perder, ainda antes do apito inicial do árbitro... 

Da mesma forma que acabaram com as "quarentenas" nos planteis dos clubes. Para jogar bastava ter um teste negativo, não importava que estivessem durante a semana em contacto com os infectados... (embora isso estranhamente não acontecesse neste caso, provavelmente por causa da nova variante do vírus). Ou seja, como de costume, o futebol funciona com regras à margem da própria sociedade. 

Talvez não estivessem a contar que acontecesse o inesperado (apesar de estar regulado). Mas aconteceu, e se não alterarem as regras, irá acontecer mais vezes durante a época futebolística.

Embora seja muito menos grave não deixa de ser uma brincadeira de mau gosto a atribuição da Bola de Ouro a Lionel Messi, talvez naquela que foi uma das suas piores épocas de sempre, por todos os problemas que viveu no Barcelona e também pelas dificuldades de adaptação a Paris. Mas o futebol é isto...

Gostava de saber o que disseram Salah, Benzema, Jorginho, de Bruyne ou Lewandowski sobre o assunto, depois de saberem o "resultado final"...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, novembro 28, 2021

A "Véspera de Viagem" do Fernando e da Teresa Rita


Há alguns livros que têm um prazer especial em se meterem mais connosco, ao ponto de nos levantarem mais que duas ou três questões, daquelas que achamos pertinentes, ao ponto de nos apetecer encontrar os autores numa esplanada qualquer, para tirarmos a "pulguita" que ficou a saltitar de orelha para orelha. 

Foi o que me aconteceu com leitura da peça de teatro, "Vésperas de Viagem", de Teresa Rita Lopes, com o Fernando Pessoa já na cama do hospital, preparado para a derradeira viagem, recebendo a visita de Ofélia e Álvaro de Campos. Na última cena, surgem também os "irmãos gémeos" de Álvaro, Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Bernardo Soares.

Foi bom ficar a saber mais coisas sobre o nosso poeta maior e sobre a sua história de amor com a Ofélia. O engenheiro Campos acaba por ter um papel relevante em todo este drama, por de alguma forma funcionar como a "má consciência" do poeta, é aquele a quem é permitido dizer quase tudo. O que é muito bom para o leitor e para a peça.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, novembro 27, 2021

Os "Abraços sem Braços"...

Estava a pensar na importância do convívio entre amigos, nestes tempos estranhos em que quase se acabaram os contactos sociais, quando me surgiu a frase curta que intitula este pequeno texto.

Embora os casos estejam a aumentar de novo, nesta passagem do Outono para o Inverno, vamos fazer os possíveis para continuar a almoçar à segundas-feiras, pela importância que estes encontros de amigos têm dentro de cada um de nós. Há o prazer da conversa à "italiana", mas há também a cumplicidade que se nota no olhar, quase risonho, por estarmos a partilhar muito mais que o bacalhau com grão ou o delicioso arroz doce (para nós o melhor de Almada...), na nossa mesa. 

Durante a pandemia perdi dois amigos com quem também almoçava periodicamente, o Fernando e o Manel. Eram encontros muito ricos, por sermos amigos e por termos bastantes coisas em comum. As conversas fluíam com naturalidade, quase sem pausas ou silêncios. Falávamos ao telefone e sei o quanto sofreram com a quase prisão que lhes foi imposta, onde ficou tão marcado que o nosso país (e o mundo...) não é para velhos...

E é mesmo verdade, os nossos almoços são "abraços sem braços", não precisamos de nos tocar nem de estarmos em cima uns dos outros, para nos abraçarmos com palavras...

(Fotografia de Luís Eme - Alcacer do Sal)


quinta-feira, novembro 25, 2021

«Há anos que não leio um livro. Tenho tantas saudades!...»


Um dos amigos com quem almoço de vez em quando, na última vez que estivemos juntos teve um desabafo, que me tocou particularmente. 

Ele tem uma vida complicada há vários anos, por ser pai de dois filhos problemáticos e também por ter uma esposa com problemas de saúde. Trabalha em vários sítios com conseguir o "milagre da sobrevivência" de todos (há ainda a netinha, de quem ele é mais pai que avô...).

Os almoços e o convívio com os poucos amigos que tem, são a única coisa que o faz esquecer, por momentos, o "turbilhão" em que vive diariamente. Percebemos muito bem quando anda a braços com problemas pelo seu semblante. Nunca o questionamos, por ele estar longe de ser a pessoa mais expansiva do mundo. Tentamos animá-lo com episódios brejeiros e com histórias alegres vividas no mundo do jornalismo e das artes. Acaba por ser uma alegria colectiva vê-lo a sorrir.

No meio da conversa falámos de dois ou três livros e dos seus autores. Foi quando ele me disse: «Há anos que não leio um livro. Tenho tantas saudades!...»

A frase passou despercebida aos outros dois amigos, que entretanto estavam a falar de outras coisas. Não fui capaz de dizer nada, embora estremecesse por dentro... 

Ele também já nos confidenciara uma vez, que não tinha um espaço "seu" em casa, uma simples secretária onde pudesse organizar as suas coisas... o que se compreende, pois são cinco pessoas as que vivem no seu T2.

Por sabermos que a "vidinha" já nos coloca tantos obstáculos, divisões e diferenças no nosso dia a dia, é que é bom que se continue a falar e lutar pela igualdades de oportunidades na "outra vida".

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, novembro 24, 2021

Se Calhar Devia Comprar um Barco...


Tinha decidido ir a Lisboa hoje de manhã, porque precisava de comprar um caderno que só se vende na Capital. Embora fosse uma coisa sem urgências, não me estava a apetecer deixar a viagem para amanhã. Nem sequer me assustei com as nuvens que brincavam às escondidas com o Sol, quando espreitei à janela.

Cheguei a Cacilhas um pouco depois das dez e meia e o próximo cacilheiro era às 10.55 horas. Dei uma volta pelas redondezas e cinco minutos antes da partida, verifiquei que a hora de embarque fora alterada. Passara para as 11.15 horas.

Resolvi voltar a casa, porque não me estava a apetecer ficar ali mais 20 minutos, até porque havia a possibilidade dos funcionários da Transtejo mudarem novamente de ideias e suprimirem mais um horário.

Antes de me vir embora ainda passei pela bilheteira e dei mostras do meu descontentamento, falando da falta de respeito que os trabalhadores da empresa têm pelos outros trabalhadores.

E nem sequer falei da pandemia, de o cais de embarque estar cada vez com mais pessoas, que iriam encher o cacilheiro (sei que agora não há limitação de pessoas, mas um pouco de cuidado não fará, com toda a certeza, mal a ninguém...).

Vinha para casa e comecei a pensar que é um problema quando não temos escolha, como acontece hoje nos transportes fluviais. Antes de Abril de 1974, havia pelo menos três empresas a operarem nas travessias do Tejo. Mesmo alguém como eu, que é a favor do serviço público, detesta ser tratado de forma miserável e não ter outra alternativa (podem falar do comboio ou dos autocarros que passam a ponte, mas isso é outra coisa...). 

Sei que a comparação não é a melhor, porque há restaurantes em quase todas as esquinas, mas gostava de ter a liberdade de fazer com os transportes - ou com outro qualquer serviço público péssimo - o que faço com as casas de pasto: quando sou mal atendido, não volto a colocar lá os pés.

O que eu gostava mesmo era que a minha única solução para resolver este berbicacho e conseguir atravessar o Tejo sem problemas de maior, não fosse ter de comprar um barco...

Apesar de se falar muito de empreendorismo, continuamos a ser um país com poucas escolhas e demasiados "monopólios"...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


terça-feira, novembro 23, 2021

O Surrealismo é Outra Coisa...


A entrevista ao "fugitivo" mais badalado do nosso país (mesmo que esta não tenha tido nada de espectacular, o espertalhaço nem sequer precisou de correr ou disparar para o ar. Bastou-lhe apenas comprar bilhete de avião para Londres e partir, sem que alguém o incomodasse, antes de ser lida a sentença que o iria condenar a prisão efectiva), foi o grande "furo jornalístico" da estreia da nossa CNN.

Embora não ache muita piada à "publicidade" extra que se dá a esta gente rasteira, acabei por perceber que foi importante ouvir as "piadas" que ele tinha para nos dizer, com o ar mais sério do mundo.

Explicou que só volta ao nosso país se for ilibado dos crimes que cometeu ou com um indulto presidencial. Marcelo como de costume não deixou para amanhã o que podia dizer hoje e respondeu muito bem, sem fugir do registo telenovelesco, dizendo-lhe que "já era tarde para amar", pois já tinham sido ultrapassados todos os prazos para fazer o pedido...

Mas faltava a parte melhor: o pulha está a ponderar pedir de um indeminização ao Estado (já tem um valor e tudo, 40 milhões...), pelo anos que o seu caso se arrastou nos tribunais, como se não fosse ele a utilizar todos os recursos possíveis para adiar a sentença. E o rombo de 700 milhões do seu BPP?

E ainda conseguiu dizer que não há lesados do seu antigo banco e lançar as suspeitas sobre o advogado me relação à fuga. E esta?

Tenho de dar razão ao Vitinha, quando diz: «Ele só é bandido porque o deixaram ser. Toda a gente sabe que a maneira mais fácil de roubar um banco é ser o dono.  Qual fuga? Assim também eu. Sem qualquer polícia à perna e com o dinheiro que o gajo deve ter escondido dentro das meias, até conseguia ir para um lugar mais fixe que Belize.»

E sim, isto não tem nada de surrealismo. Parece tudo mais brincadeira de carnaval. O surrealismo é outra coisa, muito mais séria...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, novembro 22, 2021

«Tudo se compra e vende, menos a dignidade. Ponto final.»


Encontrei hoje um amigo que já não encontrava há meses. Entre outras coisas, acabámos por falar dos livros que foram de um nosso amigo comum, que agora estão à venda num alfarrabista. Pelo meio contou-me duas ou três histórias, ainda mais sinistras, com a cara destes tempos modernos.

Falou-me com preocupação desta gente que só vê dinheiro à frente dos olhos e para quem tudo tem preço. Para eles tudo se compra e vende. Coisas tão simples como o amor ao próximo, a generosidade ou a honestidade, parecem pertencer ao século passado e só são praticadas por "otários"...

Contou-me mais dois ou três exemplos de espólios artísticos de pessoas conhecidas, que desapareceram mal os seus donos fecharam os olhos. Os livros, os discos, as peças de cerâmica e os quadros, coleccionados uma vida inteira com amor, foram imediatamente colocados à venda. Nem as obras de arte, que normalmente valorizam com o tempo, escaparam a esta "corrida ao ouro"...

Num destes casos, a viúva, mãe e sogra, ainda com alguma autonomia e lucidez, foi "depositada" num lar, como se já estivesse incapaz de decidir o que era melhor para si própria. Ao mesmo tempo que os dois filhos colocavam tudo o que estava dentro de casa em "leilão"...

Quando se despediu, este meu amigo, sem esconder a desilusão, disse-me: «Tudo se compra e vende, menos a dignidade. Ponto final.»

Quando vinha para casa, tentei desvalorizar a colagem destes casos a este tempo, dizendo para os meus botões, que sempre existiram pessoas capazes de vender tudo, até a alma. 

Talvez sim, mas eram muito menos...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


domingo, novembro 21, 2021

A Polónia e a Bielorrússia tão Longe...


Quase que parece que a Polónia e a Bieolorrússia ficam num outro continente, algures no Oriente, em África ou na América Latina, onde ainda existem mais que um tipo de seres humanos.

Mas não, ficam mesmo na Europa...

Com o passar do tempo, fomos perdendo a noção do que realmente devia contar nas nossas vidas. Talvez tudo comece na dificuldade cada vez maior em distinguir ética de moral, alimentando um egoísmo que faz com que se privilegie cada vez mais o "eu", ignorando o "nós". 

Talvez estejamos já num ponto sem retorno e não nos seja possível voltar a reencontrar a nossa condição humana.

Isso ajuda a explicar a nossa passividade em relação aos passos que temos de dar para tentarmos salvar a Terra, que nos acolhe com cada vez menos serenidade.

Pensei nisto enquanto chovia e fazia sol em simultâneo, a meio da tarde... e eu esperava que este vencesse a chuva, debaixo dum varandim...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


sábado, novembro 20, 2021

Os Bairros, as Pessoas e o Homem do Cachimbo


Não estou a escrever sobre o Homem do Cachimbo por ser sábado, o dia em que nos encontrávamos no café e dávamos vida à nossa Tertúlia das culturas (só faltava mesmo a da "batata"...). Foi na quarta-feira quando nos cruzámos mais uma vez, enquanto eu descia e ele subia a Rua Emília Pomar (essa mesma a tia do Pintor de Lisboa e do Mundo), que pensei em escrever sobre as andanças humanas. 

Trocámos um cumprimento e um sorriso, coisa recente, apesar de termos um historial de encontros e cruzamentos  com provavelmente mais de trinta anos, contando com o tempo em que éramos completamente invisíveis um para o outro. Sim, falámos pela primeira vez já nos tempos estranhos da pandemia, quando numa manhã lhe perguntei pelo cachimbo.

Olhou-me com surpresa e com um sorriso enquanto parava e pousava no chão o saco de compras. Depois pôs a mão no bolso e tirou o seu companheiro de tantas aventuras e mostrou-mo com orgulho. A partir daqui sempre que passamos um pelo outro, cumprimentamo-nos e trocamos um sorriso.

Reparei que envelheceu muito durante a pandemia. Perdeu peso e passou a andar com o apoio de uma bengala. Até eu ganhei cabelos brancos, rugas (e até algumas nuvens dentro de mim...), quanto mais as pessoas de idade, que eram apontadas como o principal alvo da covid 19.

Comecei a reparar nele na nossa esplanada. Sentava-se numa mesa da ponta e ficava por ali sozinho. Fingia que não nos via e ouvia, embora sorri-se de vez em quando (talvez devido às nossas "certezas" e ao nosso  gosto de falarmos "à italiana"), enquanto perfumava as nossas mesas com o seu cachimbo.

Pois é, como diria o bom do poeta Gomes Ferreira, isto da vizinhança tem muito que se lhe diga. Somos de tal forma estranhos, que até somos capazes de passar quase rente a algumas pessoas, durante trinta ou quarenta anos, sem nunca trocarmos sequer um bom dia ou boa tarde, mesmo que sejamos do mesmo bairro (uma denominação que já não se usa nas cidades, vá-se lá saber porquê)...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quinta-feira, novembro 18, 2021

As "Mulheres-Sombra" da nossa Cultura...


Vou aproveitar a comemoração do centenário do nascimento de Natália Nunes, companheira desse "homem-duplo", que foi Rómulo de Carvalho e António Gedeão, para falar das "mulheres-sombras" na nossa cultura, cujo talento foi relevado para segundo plano, quase sempre por vontade própria.

Quando escrevo "vontade própria", refiro-me à forma voluntária como se deixavam secundar, dando todo o espaço do mundo aos seus companheiros. Provavelmente não queriam ficar conhecidas como a "esposa de" e como no seu tempo não havia muito espaço para escritores anónimos (a PIDE e a Censura não gostavam dessas aventuras, antes de Abril...), escreveram muito menos do que podiam e deviam.

Talvez Maria Judite de Carvalho (companheira de Urbano Tavares Rodrigues), tenha conseguido ser ela própria, por ter uma escrita muito singular e por fazer jornalismo. Mas nunca quis "voar" muito alto, por ser avessa à exposição e porque o "escritor da casa" era o Urbano...

E se caminhasse na direcção de outras artes, cruzava-me logo com a Sarah Afonso, esposa de Almada Negreiros, que nunca teve dúvidas de quem era o "pintor da casa". 

Haverá com toda a certeza dezenas de casos, de mulheres extraordinárias que abdicaram do que mais gostavam de fazer por amor.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, novembro 17, 2021

«São apenas gestos de boa vontade masculina»


Nós fartamo-nos de nos repetirmos, e não falo apenas dos pequenos gestos do quotidiano. Passa-se o mesmo com os "jogos de palavras" que fazemos, seja nas páginas de um jornal, num site ou num blogue.

Mas continua a não me entrar na cabeça que a mulher queira ser igual ao homem, mas depois não dispense os "cavalheirismos" do costume, que a tentam colocar no pedestal. Muito menos os seus jogos de sedução, para obter o que quer (e que normalmente consegue)...

Foi por isso desta vez enfrentei a "fera" indo directo ao assunto, perguntando-lhe - com alguma lata, diga-se de passagem - se não ficava incomodada com tanto cavalheirismo à sua volta. Disse-me que não. E quando lhe falei do seu feminismo, disse-me que isso era outra coisa. 

Acabou a piscar-me o olho e a dizer: «São apenas gestos de boa vontade masculina.» 

Nenhuma fadista se conseguia sair tão bem deste "fado" como ela...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, novembro 16, 2021

A Viagem dos 99 a caminho dos 100


Começa hoje, aos 99 anos, as comemorações do centenário do nascimento de José Saramago, o nosso único Nobel da Literatura.

Apesar de ter crescido no seio de uma sociedade completamente estratificada, onde dificilmente se escapava do destino traçado ainda no berço, José nunca se acomodou. Frequentou a escola industrial, que à partida só lhe franqueava a entrada no mundo dos operários especializados... Embora ele quissesse outras coisas, pois já tinha a sua cabeça povoada de histórias... e sabia que não ia ficar por ali...

E não ficou. Acabou por conseguir emprego no mundo dos livros e andou durante algum tempo a editar os romances dos outros. Depois passou para o mundo dos jornais. A liberdade puxou-o mais para cima, para perto da "boca do lobo", onde se sentiu como "peixe na água", ao serviço da Revolução e do Partido. 

É costume dizer-se que tudo o que é bom se acaba depressa... e foi o que aconteceu com o seu "bem-bom", que acabou no fim de Novembro...

Ele estava era longe de imaginar que iria acabar por ganhar com esta derrota, ao conseguir aproveitar da melhor maneira os seus "azares da vida", transformando-os em "sorte". 

Foi desta forma que o jornalista desempregado se transformou num dos nossos grandes nomes da literatura e é um dos nossos melhores exemplos de resiliência, de que tudo é possível, se não baixarmos os braços.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, novembro 14, 2021

Uma Triste Evidência


Sei que o nosso não apuramento directo da nossa Selecção para o Mundial, não vai alterar nada no seio da Federação, mas pelo menos posso desabar no meu "Largo".

É uma evidência que a Selecção Nacional nunca jogou um futebol, bonito e agradável com Fernando Santos. Nem mesmo quando foi Campeã da Europa. Mas nesta qualificação para o Mundial, apesar de ter melhores jogadores, conseguiu jogar ainda pior. 

Tal como aconteceu na maior parte dos jogos, senti que havia vários jogadores "perdidos" dentro de campo. E a culpa só pode ser do treinador ou dos ditos jogadores.

Por muitas desculpas que sejam dadas, com a sorte e o azar, os factos dizem-nos que nunca tivemos jogadores tão bons (muitos...) e uma selecção tão mediana. Há aqui qualquer coisa que não bate certo. 

É caso para perguntar: como é que é possível alguém conseguir desperdiçar tanto talento?

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sábado, novembro 13, 2021

Anjos da Literatura (que também falam com Demónios)


De vez em quanto falo de literatura com amigos. Fico com a sensação de que é uma coisa cada vez mais rara, por não ter assim tantos amigos do meio. Claro que também conheço quem escreva, que gosta de falar de tudo menos de livros e de escritores. Fala-se de música, cinema, futebol e até política, mas sem bandeiras. Faz de conta que somos todos do Belenenses e do Livre.

Mas não era sobre isso que tinha pensado escrever. Como estive a folhear "O Ano da Morte de Ricardo Reis", lembrei-me das palavras que escutei na Casa dos Bicos, sede da Fundação José Saramago de Pilar Del Rio (em 2018), a sua última companheira e grande protectora de tudo o que tenha a ver com o nosso Nobel da Literatura.

Já me tinha cruzado com Pilar em duas ou três ocasiões e a imagem com que ficara da senhora era pouco agradável. Mas ali, sentado, a ouvi-la falar com tanto carinho, alegria, saber e até devoção, pensei que Saramago não podia ter ninguém melhor para divulgar e defender a sua obra e vida literária.

Nesse dia também fiz a visita guiada pela Lisboa do Ricardo Reis e de Saramago, que também foi bastante luminosa, graças à nossa guia e também a Fernando Pessoa e ao José.

Começo a escrever e vou para outras ruas, quando o que eu queria dizer era bastante simples. Não sei se os casamentos de Mécia com Jorge de Sena nem de Pilar com José Saramago foram felizes (mas tudo indica que sim...). Sei que tanto Mécia como Pilar são tidas como pessoas arrogantes (entre  outros adjectivos mais feios...), mas foram as melhores companheiras que eles podiam ter, para continuarem a sua caminhada literária. Se é extraordinária a obra publicada postumamente por Mécia de Sena, toda a actividade "saramaguiana"  de Pilar não lhe fica atrás.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, novembro 12, 2021

Os Mais de 300 anos de "Tradição" (aliás, de exploração)...


Para algumas pessoas até pode parecer uma coisa romanesca, a existência de gente que se julga superior aos outros e que se pudesse inventava mesmo o famoso "sangue azul". Quando podem fazem a conjugação dos apelidos que têm no nome com o seu historial familiar, que em tempos que já lá vão os tornara donos de quase "metade do mundo".

Alguns ainda andam por aí e de longe a longe esquecem-se que vivemos numa república democrática e... ouvem coisas que não gostam de ouvir. 

Foi o que aconteceu ao "conde", quando se colocou em bicos de pés para exaltar os mais de 300 anos de tradição familiar. Quem não esteve pelos ajustes com os seus devaneios foi o tio Zé David, que lhe respondeu à letra, substituindo a palavra "tradição" por exploração.

O "conde" ainda lhe chamou mal agradecido, mas como o tio Zé David estava com a "corda toda", disse-lhe que se havia alguém mal agradecido era ele e a sua família, que viveram durante séculos à custa do povo da aldeia, que tratara quase como escravos. E eles sim, nunca tiveram uma palavra de agradecimento para todos aqueles que privaram de ter uma vida digna.

Depois desta é que o "conde" pegou nos seus mais de "300 anos de tradição" e com uma passada rápida, caminhou na direcção da velha casa senhorial, cujo portão se fechou com estrondo.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, novembro 11, 2021

A Revolta Já não Cabe Dentro dos Hospitais


Provavelmente as várias demissões e manifestações de descontentamento de médicos, enfermeiros e restantes funcionários dos hospitais, não estão a acontecer neste período, que se pode considerar pré-eleitoral, por acaso.

Até porque os bastonários das respectivas ordens pertencem ao lado direito da política.

Mas não são eles os culpados do "reboliço" que está a virar quase todos os hospitais de pernas para o ar. Os grandes culpados são os ministros das finanças socialistas dos últimos anos e as suas celebres cativações, que foram depauperando o SNS, ao ponto de ele estar quase a "dar o estoiro". 

E claro que tudo isto só pode ter acontecido com a conivência do primeiro-ministro...

É caso para dizer que a sorte do espertalhaço do Costa é a "guerra" de poder no PSD. Mesmo assim não dou a sua vitória por garantida, muito menos a maioria sonhada, à custa dos seus dois bodes espiatórios preferidos (PCP e BE)...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quarta-feira, novembro 10, 2021

Comportamentos & Manias (com e sem dedos)


Ainda ontem ao almoço falámos do comportamento das pessoas, durante e pós-pandemia, muito menos tolerantes e pacientes para com os outros. Isso nota-se até mesmo nos pequenos gestos, como um simples sorriso ou aceno, como forma de agradecer qualquer acto generoso.

Todos aqueles que achavam que a pandemia ia melhorar o comportamento humano, tornando-nos mais solidários e menos egoístas, devem estar extremamente desiludidos. 

Mas os "tempos de guerra" são assim mesmo, tanto podem mostrar o melhor como o pior de nós...

E se a sociedade onde estamos inseridos primar pela ausência de valores humanistas, o cenário torna-se ainda mais negro...

Mas há outro aspecto social ainda mais sinistro, a crescer, é a mania que algumas pessoas têm de querer mandar na liberdade individual de cada um de nós. Mostram que poderiam dar agentes de qualquer PIDE, pois parecem estar sempre prontos a apontarem o dedo a alguém (esquecidos dos três que se viram contra eles...), apenas por algumas pessoas primarem pela diferença e pela liberdade.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, novembro 08, 2021

As Greves contra o Povo...


Eu sei que se as greves não incomodarem as pessoas não fazem grande sentido. Mas há incomodar e incomodar...

É por isso que também sei que estas greves quase cirúrgicas, marcadas para as horas que "fazem mais doer" a quem não tem outra escolha, que deslocar-se para o trabalho de transportes públicos... só conseguem colocar mais pessoas contra as greves e os grevistas.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


domingo, novembro 07, 2021

As Voltas que os Livros Dão...


Sei que se um livro tiver a sorte de pertencer a viageiros que gostem de ler (como o casal que ficou nesta minha fotografia, tirada na sexta-feira, a meio da tarde, no Ginjal), pode "escutar vozes" diferentes das que está habituado, ganhando também ele mais mundo, mesmo que viaje dentro de uma mochila ou mala.

Mas não é dessas "voltas" que quero falar. Na quarta-feira ainda caíram alguns pingos de água e eu como de costume, estava sem chapéu de chuva e tive de me abrigar por alguns minutos no exterior da entrada de um prédio. 

Fiquei à espera que o "São Pedro desligasse o chuveiro", quase à porta de um antiquário, que também vende livros. Fui olhando para a montra, mas como não era "a mesma coisa", acabei por entrar, porque sabia era melhor esperar a ver lombadas de livros, que estar cá fora a ver a chuva a cair. No meio de centenas de livros descobri dois de poesia, da autoria de almadenses. Sabia que um deles estava lá para casa, em alguma estante, o outro fiquei na dúvida. Mas o que despertou a atenção foram as suas dedicatórias. Estavam dedicados a um amigo que também escrevia livros e que nos deixara no final de 2020.

Acabei por meter conversa com o antiquário, para satisfazer a minha curiosidade e descobrir como é que os livros ali tinham chegado. Ele tinha milhares de livros em casa e como acontece nestes casos, a família acaba por vender quase todos os livros, por uma questão de espaço e também para ganhar alguns cobres. Foi quando me disse que um colega de Lisboa tinha comprado milhares de livros e ao descobrir vários sobre Almada, entrou em contacto com ele, para saber do seu interesse. E foi assim que alguns livros do escritor almadense voltaram a atravessar o rio, à procura de novos leitores...

O mais curioso nesta troca de palavras, foi ele ter ficado a saber mais sobre o escritor e sobre os livros que tinha de Almada, que eu sobre o "apeadeiro" lisboeta dos livros...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


sábado, novembro 06, 2021

«O Inverno ainda não veio. Foi só o frio que chegou.»


As pessoas dizem coisas que parecem não ter muito nexo, pela forma descontraída como se usam as palavras.

Quando ouvi a senhora da tabacaria a dizer que «o Inverno ainda não veio. Foi só o frio que chegou.» Percebi perfeitamente o que ela quis dizer. 

Estava frio sim, mas os dias continuavam a ser de Sol, até se podia passear na praia e tudo.  

Claro que mesmo com Sol, o homem dos sorvetes agora vende castanhas. Ele não é parvo nenhum e sabe que agora o que apetece mesmo são as "quentes e boas"...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sexta-feira, novembro 05, 2021

O "Outro Lado das Imagens"...


Quem gosta mesmo de fotografar, à medida que se vai emaranhando no mundo das imagens, começa a fazer alguns desvios e percorrer um caminho diferente, em busca do que normalmente não preenche o olhar dos outros. 

Claro que esta caminhada não está isenta de riscos. O maior de todos talvez seja a fixação do nosso olhar num "outro lado das imagens", quase sempre estranhas e cuja classificação deixa de ser óbvia.

Até porque o que é diferente e único, raramente é o mais bonito...

Para muitos este é o caminho que nos leva à arte. Arte que nem sempre quer coincidir com o belo, que com o tempo começa a parecer uma banalidade...

Talvez alguns mestres da fotografia tenham razão, talvez o belo seja mesmo o mais fácil de retratar...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quinta-feira, novembro 04, 2021

As Estórias que Ficam a Meio (e as outras)...


Estive a "limpar" alguma da (demasiada) palha que vai enchendo o meu portátil, diariamente.

Apaguei várias duplicações, organizei pastas, e claro, descobri muitas histórias que ficaram a meio...

Encontrei também coisas quase acabadas, como um conjunto de microcontos escritos durante as férias do último Verão, no Sul. A receita foi simples, encontrava alguém, cuja única característica (pelo menos no início...) era a cor do biquini ou dos calções de banho... E fazia-lhe um desenho com palavras. Acabei por fazer algumas variantes, como escolher uns óculos ou um balde de praia, também com cores distintas.

Ao contrário de outros escritores, costumo-me reler. E como achei piada a estes microcontos, talvez tenham direito a uma edição artesanal, para oferecer aos amigos no Natal...

(Fotografia de Luís Eme - Algarve)


quarta-feira, novembro 03, 2021

Nunca Existiram Tantas "Realidades Paralelas"


Nunca existiram tantas "realidades paralelas", nunca houve tantas interpretações dispares para o mesmo facto, devido às novas "caixas de ressonância" da sociedade, mas também à opção cada vez mais "novelesca", de transmitir notícias pela televisão. 

A pouco e pouco, tudo se foi transformando em entretenimento, especialmente a política. E com a crise do "maior espectáculo do mundo", foram surgindo, tanto à esquerda como à direita, "palhaços", "malabaristas", "trapezistas", "ilusionistas" e até "domadores de feras".

 Apesar de toda esta "diversão",  gostava mais do mundo quando não era "um circo"...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, novembro 01, 2021

Céu Azul num Dia Cinzento


Apesar da procissão se ter realizado este ano numa versão mais "softe" (só com dois andores...), as ruas esburacadas de Cacilhas (a chuva não perdoou as muitas obras incompletas...) encheram-se de gente neste primeiro dia de Novembro. 

Gente que tanto pode vir acompanhar a Nossa Senhora do Bom Sucesso, padroeira da localidade ribeirinha, no cortejo religioso, como participar apenas no ambiente festivo que cresce junto ao Largo de Cacilhas e à Rua Cândido dos Reis.

Hoje voltou a estar um dia cinzento (ameaçou mesmo chover em vários momentos...), mas, curiosamente, quando a procissão passou pelas ruas o céu ficou azul. Embora não "empurre" este fenómeno natural, para a "rua dos milagres", não deixa de ser digno de registo.

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)