sexta-feira, abril 26, 2024

Com amigos destes...


Acho curioso que a maior parte dos comentários mais cínicos sobre a escolha do nosso novo Sebastião, sejam de comentadores de direita (pois é, são a maioria, pelo menos nas televisões...), que não se esquecem de referir: "eu sou amigo dele, mas... (há muito  por aí quem defenda que amigo não empata amigo, até na cobiça da namorada alheia...)."

Temos a mania de que a célebre "dor de cotovelo" é mais portuguesa que universal. Manias... O que não há dúvida é que alguns comentadores com mais uns anitos que Bugalho, a escrever e a falar, aqui e ali, acham que também já deviam ter a oportunidade para dar o "salto".

Mas a realidade é outra coisa. E posso dar um exemplo familiar: o único comentador de quem a minha mãe me falou nos últimos tempos é do "rapaz penteadinho e bem vestidinho", que é capaz de dizer as maiores barbaridades, com o ar mais sério do mundo (ela é socialista e continua a ter uma "adoração" pelo Costa...).

O mais curioso tem sido a atenção que tem sido dada à "agricultura", não se trata apenas do Marcelo ter chamado a Montenegro de "saloio" (mesmo que ele seja mais urbano e moderno do que o que o presidente pensa, esta escolha fala por si...), há também vários comentadores que foram buscar os "melões" (coitados, não tiveram um avô que lhes ensinasse a escolhê-los e devem comprar demasiados "pepinos" em forma oval...), para dizer que o jovem é uma "incógnita".

Sem cinismos, eu acho que se trata de uma boa escolha, pelo menos para quem quer ser segundo nas eleições...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quinta-feira, abril 25, 2024

Todos os caminhos foram dar à Avenida da Liberdade...


Hoje todos os caminhos foram dar à Avenida da Liberdade.

Foi bom cruzar-me com gente feliz de todas as idades e de todos os extratos sociais. É este o espírito do 25 de Abril, a paixão pela democracia e pela Liberdade.

Talvez esta tenha sido a primeira resposta dada pelos portugueses aos fascistas que estão no Parlamento. 

Espero que a segunda seja dada já nas próximas eleições, para o Parlamento Europeu...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, abril 24, 2024

Um medo generalizado, bem vivo no dia 24 de Abril de 1974...


Havia um medo comum, em quase todas as famílias, fossem elas muito, pouco ou nada politizadas, que se chamava Guerra Colonial. Guerra que se travava na Guiné, em Angola e Moçambique.

As mães eram quem mais sofria... porque raramente se escondiam atrás da honra ou do dever de todos (que nunca eram bem todos...) em defenderem a pátria. E quando viam os filhos aproximarem-se da idade maior, a dor aumentava, porque sabiam que existia uma forte possibilidade, deles terem de cumprir o serviço militar obrigatório no Portugal Ultramarino... que se estendia até Timor (foi para onde foi o Henrique, irmão do Fernando, um dos nossos melhores amigos de infância).

Nunca falei disto com a minha mãe. Mas nós éramos demasiado novos, para que ela começasse a antecipar o futuro. Eu tinha apenas onze anos e o meu irmão treze, em Abril de 1974.

Claro que este medo não desapareceu logo no dia 25 de Abril, porque até pelo menos, ao final de 1975, os nossos soldados continuaram a viajar para África (e a "morrer pela pátria")...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, abril 23, 2024

Cada vez ligo menos aos dias disto e daquilo...


Não devia dizer isto (é de livros que se trata), mas cada vez ligo menos aos dias disto e daquilo.

Não foi por isso, mas, consegui, sem esforço, não ler nenhuma página de um livro, e melhor ainda, não comprei também nenhum livro. Mas evitei passar em frente da "Bertrand", podia estar alguém por ali e chamar-me...

A única coisa que fiz de "condenável", foi pegar em vários livros, para os mudar de lugar (estava distraído e...).

O maia curioso, foi a meio da tarde, ter-me cruzado com uma jovem com a pele morena de África, de óculos e com uma máscara pandémica a esconder-lhe parte do rosto, a caminhar e a ler.

Quando nos cruzámos, olhou para mim, talvez espantada, por perceber que olhava para ela e para o livro. Parecia uma jovem presa ao telemóvel, sem sequer olhar para o passeio. Felizmente era um livro que tinha nas mãos (devia ser dos bons...). Não a fotografei, porque dava demasiado nas vistas.

Pensei que não devia ligar aquele pormenor, até porque me cruzo com mais leitoras nos outros dias, que não têm livro como apelido. 

E não devia mesmo, porque para mim todos os dias são dias do livro, menos o dia de hoje...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


segunda-feira, abril 22, 2024

As revoluções e os saneamentos costumeiros...


Uma das questões mais controversas em qualquer Revolução, são os saneamentos que se seguem, nos meses seguintes, envolvendo praticamente todos os sectores da sociedade.

Mesmo pessoas que eram olhadas como progressistas a 24 de Abril, que ocupavam cargos com alguma notoriedade, graças à sua competência, acabaram vítimas desta transformação social, a 26 de Abril...

Foi facílimo passar-se de "comunista" a "fascista", em apenas meia-dúzia de dias no nosso País.

Como de costume, quem tinha mais peso mediático, foi quem sofreu mais na pele estas mudanças. As grandes figuras da televisão, da rádio e do espectáculo, foram aquelas que mais sentiram a diferença no tratamento, ao ponto de muitos terem de "fugir" para Espanha ou para o Brasil.  Na música e no teatro, houve mesmo quem mudasse de país (para o Brasil...), para continuar a trabalhar...

O fado foi sem qualquer dúvida o género musical que mais foi perseguido durante o PREC, fazer parte da mítica trilogia dos três éfes, "Fátima, Fado e Futebol", não ajudou nada. A sua grande diva, Amália Rodrigues, também foi perseguida (e até "abandonada" e "desprezada" por amigos próximos, estupidamente...). Como se ela tivesse alguma culpa por ter sido usada como "símbolo" da pátria (tal como Eusébio, embora este não fosse vítima de qualquer acto de menorização, provavelmente a sua cor de pele ajudou...)...

Algumas injustiças foram repostas, outras nem por isso. Houve gente que nunca mais teve qualquer oportunidade profissional, para se "levantar", socialmente. Um desses casos foi o excelente fotógrafo, Artur Pastor, cuja obra tem sido popularizada nos últimos anos. Mas existem dezenas de casos, desde o ensino superior ao jornalismo televisivo. Neste último caso, Henrique Mendes foi a excepção que confirmou a regra, tendo sido "recuperado" profissionalmente, alguns anos depois, com o aparecimento das televisões privadas (na SIC)...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, abril 21, 2024

A gente que gosta muito de andar com a palavra liberdade (só) na boca...


Este mundo está cheio de gente que gosta muito de andar com a palavra liberdade na boca, mas que passa a vida a tentar condicionar a liberdade dos outros.

Isto passa-se um pouco por todo o lado. Podia começar pelo interior dos partidos políticos (todos...), passando depois pela mesa dos café e acabando nos campos de futebol.

Os únicos lugares onde normalmente não somos "condicionados" (pelo menos descaradamente), são os espaços onde gastamos as moedas que temos no bolso, desde a mercearia de bairro ao nosso barbeiro (os taxistas não contam, gostam de comer "reis" ao pequeno almoço...).

Talvez seja um problema de interpretação da palavra. 

Talvez pensem que a liberdade é um direito individual (e que seja mais de uns que de outros...) e não colectivo.

Somos um mundo cheio de talvez...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sábado, abril 20, 2024

"As donas de casa não são donas de nada"


Gostei de ler (como de costume...) o artigo de opinião de Susana Peralta, no Público" de ontem, intitulado, "As donas de casa não são donas de nada", em que historiou a vida familiar das avós e tias, que acaba por ser comum a muitos de nós, que descendemos de habitantes das aldeias portugueses, onde por exemplo, a electricidade só chegou depois de Abril...

À mulher estava destinado um papel secundário na sociedade. E isso fazia-se sentir logo no acesso ao ensino primário, que se não era para todos os meninos, menos seria para todas as meninas... E nem vale a pena falarmos do ensino secundário ou da universidade...

É muito importante termos memória (mesmo que exista tanta gente a querer fugir dela, por representar uma vida de pobreza...). Foi por isso que gostei de ler a Susana. Sim, as minhas avós, materna e paterna, também não foram à escola. Mas o mesmo se passou com os meus avôs. Claro que eu sou da geração anterior da economista (devo levar-lhe uns vinte anos de avanço...), os seus avós já são da geração dos meus país, que embora fossem confrontados com os mesmos problemas, puderam lutar mais pela aprendizagem, nem que fosse já "fora de horas" (como ela refere em relação a uma tia...).

Não posso deixar de transcrever a parte final do seu texto, que diz muito do que se avançou e também dos defensores do "estatuto da dona de casa": 

«O enorme contraste entre a minha vida e a das mulheres da geração que me precede na família é revolucionário, no sentido Goldiano e no sentido de Abril. Neste lugar de fala que granjeei, penso muito na voz que elas não tiveram: apesar da inteligência e fino espírito analítico de algumas delas, o país decidiu encerrá-las numa vida de donas de casa na qual, na verdade, não foram donas de nada.
A revolução silenciosa de Claudia Goldin demonstra que a participação de pleno direito das mulheres no mercado de trabalho. é a conquista de um lugar na sociedade, o domínio da fertilidade e a libertação da tarefa de cuidar, que não é paga, nem valorizada. Uma história de poder. As mulheres poderosas metem medo aos machos fracos que as querem mandar para casa.»

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, abril 19, 2024

A simpática Vila Franca de Xira


Hoje dei um "pulo" a Vila Franca de Xira, uma terra que me é simpática e onde me sinto bem. Penso que isso acontece por manter uma arquitectura tradicional, não se deixando "desfigurar" pelas partes novas da Cidade.

Claro que isto não tem nada a ver com o facto de ser uma "terra de touros e toureiros", embora José Júlio e Vitor Mendes (tive o grato prazer de conhecer ambos...), fossem óptimos anfitriões e mestres desta arte e tradição local.

Acho que é também por isso que gosto do Seixal. Tem uma personalidade muito própria, esforça-se por não se desligar da sua própria história.

Visitei o sempre  agradável "Museu do Neo-realismo", onde além das fotografias de Alfredo Cunha, vi uma bonita exposição de pintura de Amândio Silva, um pintor portuense que fez cem anos em 2023 (e claro, os quadros bonitos da sua colecção, em exposição permanente).

(Fotografias de Luís Eme - Vila Franca de Xira)


A Resistência Almadense e as Bibliotecas Humanas


Voltei a aparecer na sessão da tarde de hoje das "Bibliotecas Humanas" (foi a quarta, é mensal...), cujo tema era a "Resistência Antifascista em Almada", muito graças ao entusiasmo do Luís e do David, os bibliotecários que festejam Abril desta forma, de Janeiro a Dezembro.

Como de costume dizem-se coisas interessantes e pertinentes. Até se questiona o regime actual, que se percebe à légua que se finge mais democrático do que o que é realmente, com novas formas de censura, sem lápis azul, mas com outras subtilezas, próprias deste tempo, cada vez mais estranho.

Já percebi há algum tempo que Almada é um Concelho, que diverge de muitos outros, porque se antecipou vezes demais à história. Foi por isso que falei da sua vocação de resistente, que se mantém bem viva, quase desde a fundação da Nacionalidade, com D. Afonso Henriques. E continuou presente na Crise de 1383, na Restauração de 1640, antecipou o 24 de Julho para 23, na Revolução Liberal, o 5 de Outubro, para 4. E no dia 25 de Abril não antecipou nada, mas saiu descaradamente para a rua, para dar vivas à liberdade, enquanto uma boa parte do país passou este dia agarrado à rádio, fechado em casa...

Ainda bem que somos uma comunidade que, sempre sentiu que tinha mais a ganhar que a perder com as várias Revoluções, que foram mudando o rumo da nossa história.

Nota: Esqueci-me de escrever que no final da sessão cantámos todos a "Grândola Vila Morena" do nosso Zeca e de Abril, em homenagem ao António Policarpo, escritor de Almada, que nos deixara ontem.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quarta-feira, abril 17, 2024

Crimes (quase) perfeitos e polícias demasiado humanos...


A televisão alimenta muitas conversas, penso mesmo que falo mais de séries policiais que de "livros pretos". Entre outras coisas, porque se vê mais televisão e se lêem menos livros. Mas há trinta anos já era assim, não fale a pena falarmos da mudança de hábitos provocada pelos ventos da modernidade.

Por causa de uma série, a conversa avançou e fixou-se em quase uma dúzia de crimes que nunca foram resolvidos (andámos desde o padre Max até à jovem grávida da Murtosa, sem esquecer a menina inglesa que estava de férias no Algarve...).

Claro que as causas da não resolução dos crimes nem sempre tinham pontos comuns (a excepção era a falta do corpo da vítima em vários casos...). Foi por isso que acabámos por focar a conversa nos "crimes perfeitos" e nos "polícias incompetentes", por fazerem mais parte da ficção que da realidade, ou seja, serem normalmente mais explorados nos livros, nos filmes e nas séries. 

Nos livros então, há quase sempre um detective particular (que funciona em paralelo com as polícias...), que é mais aberto e mais claro na exploração das pistas, descobrindo a maior parte dos assassinos, antes das autoridades policiais, que também têm como papel fazer "figura de parvo" nas histórias. 

As conversas são mesmo como as cerejas. Continuámos de viagem, ao lado de autores, que tal como nós, dispensavam a arrogância e as "certezas" das polícias, tão fáceis de caricaturar na ficção...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


terça-feira, abril 16, 2024

A aposta na diferença (mesmo que seja absurda)


Primar pela diferença não está ao alcance de todos.

Até porque há coisas que são difíceis de colocar em prática, por muito que nos apeteça andar por aí de pernas para o ar. 

É por isso que normalmente muitos dos amantes das diferenças preferem fazer coisas mais cómodas, mantendo bem vivo o "espírito inventivo da coisa".

É o caso do Manuel, que tem em casa um relógio que anda ao contrário e também têm os números colocados em sentido contrário, para que possa dar as horas certas (é quase como ver um "tic-tac" ao espelho...).

Claro que é mais uma maluquice que uma "descoberta da pólvora", como disse o Fernando. E há também a possibilidade de ser um problema de "quedas" e "trambolhões" na infância...

Lembrou-me o Jorge, que adorava ser o único com o "passo certo" nas paradas militares...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, abril 15, 2024

Eu sei que a palavra "incomoda-me" é forte de mais...


A palavra "incomoda-me" é forte de mais. Mas acho estranho que de um momento para o outro, tenham crescido tantos comentadores e comentadoras de guerra, em todos os canais televisivos. São mais que os cogumelos...

E agora vem a parte sexista... Acho ainda mais estranho ver tantas mulheres a comentarem guerra, a falarem de armas e de tácticas militares, como se fossem autênticas peritas.

E até podem ser, mas...

Imagino que toda esta "sapiência" tem mais a ver com o "negócio", que com outra coisa. 

É provável que tenham pensado: "esta guerra é capaz de ser uma boa oportunidade para ganhar uns cobres." E depois devem ter ido ainda mais longe: "dizer o que o Milhazes e o Rogeiro dizem, é mais fácil que comentar futebol".

Eu sei que com as guerras não se deve brincar, mas de certa forma, é o que se passa nas nossas televisões, com o "desfile" diário de gente que adora dizer banalidades e falar de "marcianos"...

(Fotografia de Luís Eme - Sobreda)


domingo, abril 14, 2024

«Não foi para isto que fiz o 25 de Abril!»


O meu único amigo, que foi "Capitão de Abril", era especial. Conversámos sobre muitos episódios que continuavam mal explicadas e outros que não nos deixavam qualquer dúvida, sobre todo o processo revolucionário.

Uma das coisas que mais o irritava, era ouvir, um ou outro camarada de armas, em momentos mais polémicos do nosso país, dizerem: «Não foi para isto que fiz o 25 de Abril!» 

Irritava-o por duas razões, pela exploração do "eu", quando a Revolução foi um Movimento Colectivo, mas sobretudo por saber que as questões mais importante tinham sido resolvidas com o 25 de Abril de 1974.

Ele dizia com um sorriso, que o MFA, além da democracia (que nem sempre é muito palpável), devolveu-nos a Liberdade e a Paz. E só por isso, a tarefa dos Capitães ficou cumprida. 

50 anos depois não tenho dúvidas, de que o Carlos, estava mais que certo...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, abril 13, 2024

Como dizia o Poeta Eduardo: isto está tudo ligado (e está mesmo...)


Não deixa de ser curioso, que sejam muitos destes liberais, empresários e gestores, que se dizem defensores da "família tradicional" (há a possibilidade de as suas teorias serem só para os condomínios de luxo onde vivem, desgostosos por oferecerem às esposas todas as condições para lhes darem "um magote" de filhos, e elas não estarem para aí viradas...), quem mais tem contribuído para o empobrecimento da maior parte das famílias portuguesas, pagando ordenados miseráveis aos seus "colaboradores", ao mesmo tempo que lucram milhões.

São eles, os defensores e grandes beneficiados deste capitalismo selvagem (com a tal capa do "liberalismo"), que tem desregulado todos os sectores da nossa sociedade, com a teoria de que o "mercado tudo conserta" (mesmo que cada vez existam mais pobres e miséria à sua volta...), quem mais têm contribuído para que cada vez seja mais complicado constituir famílias (tradicionais ou das outras) e deixar descendentes. Com ordenados baixos, casas caríssimas no mercado, o mais sensato continua a ser dar ouvidos ao "apresentador da obra" em causa, que há uns anitos aconselhou os jovens a emigrarem...

Podem escrever os livros que quiserem, mas se continuarem a pensar apenas nos cinco por cento, que têm rendimentos que lhes permitem alimentar o sonho de ter, no mínimo, um número de filhos que lhes dê o prazer de formar uma equipa de "futebol de cinco", continuam a reduzir o mundo aos seus condomínios fechados, ao mesmo tempo que "expulsam" os nossos jovens para fora do país...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, abril 12, 2024

O "silêncio ensurdecedor" das mulheres portuguesas (as "esquerdistas" do costume não contam...)


Estava à espera de assistir a reacções mais contundentes das mulheres portuguesas sobre o que alguns homens escreveram (num livro) e disseram (na apresentação e depois). Sim, alguns não se sentiram completamente realizados na sua tarefa da defesa da "família tradicional" e já vieram com propostas ainda mais "interessantes", como a do "estatuto da dona de casa".

Não frequento as redes sociais, pelo que não sei se estou completamente certo, sobre este "silêncio ensurdecedor" das mulheres portuguesas (tanto as antigas como as modernas).

E há ainda outra questão: até podem haver por aí muitas mulheres que querem que se volte ao tempo em que elas se limitavam a ser mães e donas de casa... Só que isso só poderá ser garantido a uma minoria de mulheres (as esposas dos "empresários" e dos "políticos"  bem sucedidos do nosso país...), pelo menos com um nível de vida economicamente aceitável.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, abril 11, 2024

A nossa irracionalidade (tão mal disfarçada)...


Pois é, também pertencemos ao grupo de animais (racionais é apenas um apelido...), num mundo onde continua a imperar a lei do mais forte.

Embora eu soubesse, o Carlos fez questão de quase "me esfregar na cara" a nossa animalidade, com os exemplos de Gaza e Ucrânia, onde se mata, tortura e faz sofrer o semelhante, por razões que a própria razão e a nossa humanidade começa a desconhecer (ou nunca conheceu...).

Isto claro, se esquecermos o negócio das armas, que vai de vento em popa, para a América dos loucos (sim loucos, que malucos somos nós, que fingimos não conseguir viver sem eles...) ou para a China, que fingiu ser uma "loja dos trezentos" para nos comer a todos por parvos, aqui nas europas... e até para a Coreia dos nortes e o Irão.

Como o Carlos disse, somos mesmo uns "gatinhos" (até me sugeriu uma fotografia...)...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quarta-feira, abril 10, 2024

As Gaivotas na apropriação do espaço público e no fingimento de que são "animais domésticos"...


Ontem fui surpreendido por uma gaivota na minha varanda, que dava bicadas nos vidros (vá-se lá saber porquê...). Quando fui ver do que se tratava, dei com a descontração e ligeireza, como ela passeava na varanda aberta.

A minha primeira reacção foi buscar a máquina fotográfica. Normalmente elas quando vêm uma máquina fogem (penso que  se deverão assustar com o reflexo da lente...), esta não. Mesmo quando abri uma das portadas, ela limitou-se a subir para o parapeito e por ali ficou, quase em desafio. Tirei três fotografias e depois aproximei-me um pouco mais, para a fazer voar e tirar uma fotografia com o seu voo (algo que não consegui). Mas ela não foi para longe, poisou no parapeito da varanda do vizinho de lado, antes de decidir partir para os céus.

Estava a espera que regressasse hoje, mas ainda não aconteceu. E ainda bem.

Não acho muita piada a este "fingimento" de que são aves à procura de espaço na lista dos "animais domésticos", com a sua aproximação. É dessa forma que se aproximam, cada vez com mais lata, das esplanadas, em busca de restos de torradas ou de bolos, dando um "chega para lá" aos pombos. Pombos esses, que não lhes devem achar nenhuma piada (e com toda a razão, mesmo que no mundo animal ainda prevaleça a lei do mais forte...).

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


terça-feira, abril 09, 2024

Abril lembra-nos que a Liberdade é outra coisa...


Ontem visitei um amigo, que quase que não sai de casa, que é das pessoas mais honestas e autênticas que conheço. Tem um defeito e uma qualidade (depende sempre do ponto de vista...), que é ser comunista.

Mas antes de ser comunista, é um Amigo, e dos melhores...

Apesar da sua "ortodoxia" (é daqueles que será Comunista até ao fim dos seus dias), nunca achou piada às "cassetes" e ao quase "coro das velhas", ditados pelo Partido, como se todos fossem obrigados a dizer e a pensar as mesmas coisas.

Uma das melhores provas de amizade que me deu foi a minha defesa que fez numa reunião partidária (nunca falámos sobre isso, foi uma terceira pessoa que me contou o que aconteceu...), quando numa homenagem pública a um grande almadense (o professor Alberto de Araújo), as pessoas que estavam na mesa, quiseram trasnformá-la um comício político do PCP. E no final, levantaram-se todas e ergueram o punho fechado e começaram a gritar: "PCP, PCP, PCP" (a excepção fui eu e uma jovem jornalista que estava a meu lado, ficámos ambos sentados, em silêncio, a olhar um para o outro...).

Nem se pode falar de um acto de coragem (embora nunca fosse uma "maria vai com as outras"). Fui de tal forma surpreendido por aquela reacção colectiva, que me senti a mais naquele filme... e fiquei sentado. E ainda bem que o fiz (algumas pessoas podem ter começado a olhar-me de lado na rua, mas sai dali sem qualquer problema de consciência).

Como devem calcular, houve até quem quase me chamasse "fascista" nessa reunião. Foi por me conhecer bem, que este Amigo fez a minha defesa. O seu argumento mais contundente foi: "Se ele não pertence ao Partido, por que razão é que se deveria ter levantado?" E conseguiu silenciar alguns dos meus "inimigos de estimação"...

Mas onde eu queria chegar, é ao ponto que mais me afasta do PCP. Curiosamente, é o mesmo que me afasta da Igreja Católica: o seu tom de superioridade em relação ao resto da sociedade, agirem como se eles fosse os "bons" e os outros fossem "os maus" (em quase tudo...). 

Quem ama a Liberdade e conhece o Mundo, sabe que isso não existe, sabe que há gente boa e má por todo o lado, e ainda bem.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, abril 08, 2024

«Sei que se tivesse estudado, estudado a sério, fazia filmes...»


Quase do nada, o velho que estava ancorado no banco ao pé da minha casa, disse: «Sei que se tivesse estudado, estudado a sério, fazia filmes...»

Ele não me disse aquilo como se estivesse no "muro das lamentações", mesmo que não escondesse que gostava de ter tido as possibilidades que outros tiveram... E antes que lhe fizesse alguma pergunta acrescentou: «Gostava de ter nascido em Lisboa, a Terra das salas de cinema.»

E depois assisti, em poucos minutos, à "história da sua vida"...

Foi a tropa que o trouxe do distrito da Guarda para a Capital. Assim que se apanhou em Lisboa, soube que nunca mais ia regressar para a aldeia onde nasceu. A família? Se tivessem saudades que viessem vê-lo a Lisboa... Foi deixando o tempo passar e esteve quase quatro anos sem pôr os pés na Terra onde nasceu. Casou e só quando foi pai pela primeira vez, é que decidiu que já era tempo de voltar, para mostrar a filha aos pais. A partir daí voltou mais vezes, mas fingia que vivia na América e só aparecia de dois em dois anos, e eram visitas quase mais curtas que as de médico.

Deixou a família e a aldeia para trás, porque o que queria era voltar ao cinema...

Não sabe quantos filmes viu. Sabe apenas que foram muitos, muitos... Ainda hoje, a única coisa que o prende à televisão, são os filmes, até mesmo aqueles que se adivinha o fim logo no princípio...

Quando lhe perguntei se alguma vez teve uma câmara de filmar, disse-me que não. Sorriu e disse, que não foi esse pequeno pormenor que o impediu de fazer "filmes", dentro da sua cabeça, de olhar para as coisas e deliciar-se com o movimento, com a possibilidade de inventar um mundo diferente...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, abril 07, 2024

Não, Obrigado (regresso do Serviço Militar Obrigatório)


Não encontro explicações racionais para o facto de a nossa democracia, aliás, o bloco central (os Socialistas e os Sociais Democratas) sempre terem tratado as Forças Armadas sem a dignidade que mereciam, desvalorizando a sua importância na sociedade.

Não sei se foram "traumas" por a Revolução de Abril de 1974 e a transição democrática ter sido feita por Militares, por serem eles os nossos "Heróis da Liberdade", e não os políticos e os partidos.  A única coisa que sei, é que tanto o PS como o PSD, foram-se servindo dos Militares, quando lhes dava jeito, ao mesmo tempo que adiavam as reformas tão necessárias (e que nunca foram realizadas por inteiro...).

É importante dizer que isto aconteceu, quase sempre, com a cumplicidade dos generais e almirantes, que nunca foram capazes de abordar os problemas criados com o fim do Serviço Militar Obrigatório (SMO), que foi encurtando cada vez mais o número de homens e mulheres que queriam seguir a vida militar, dificultando o cumprimento das missões em terra, no ar e no mar. 

Se pensarmos que o SMO acabou há mais de 20 anos. E que os Governos e as chefias militares nunca se uniram para tornar a vida militar atraente para os jovens (além de oferecerem poucas perspetivas de futuro e de formação, os ordenados  foram sempre baixos...), não será com o regresso desta obrigatoriedade, que as coisas irão melhorar.

Aliás, só se começou a falar do regresso do SMO, com alguma insistência, porque começa a não haver gente para cumprir os "serviços mínimos", uma vez que cada vez é mais difícil recrutar jovens voluntários para a vida militar. O problema é que os defensores  desta proposta não estão a pensar em melhorar condições para quem quiser ser militar. Estão sim, a pensar que com a "obrigatoriedade" deste serviço, pode acabar-se com o défice humano existente, ao mesmo tempo que se consegue de volta a antiga "mão de obra barata".

É demasiado óbvio que esta tentativa de trazer de volta o SMO, não tem nada de reformista, nem pretende melhorar as condições oferecidas aos militares. É por isso que estou completamente contra este regresso ao passado. 

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, abril 06, 2024

Um Outro País, a 6 de Abril de 1974...

Vou regressar ao Portugal de antes de 25 de Abril de 1974, demasiado pobre e atrasado, em todos os sectores da sociedade. 

Hoje vou falar da educação. Posso começar por falar da separação que existia de sexos, das aulas só para meninas e das aulas só para meninos, assim como os respectivos recreios... mais ao jeito de curiosidade, que de outra coisa.

A taxa de analfabetização em 1974 ainda ultrapassava os 25%, um quarto da população (há quem fale numa taxa maior, porque nestas estatísticas era contabilizada a frequência escolar, mesmo que este fosse irregular e os alunos não tivessem os conhecimentos mínimos, na arte de ler e escrever...), com maior incidência no sexo feminino (superior a 30%). Mas esse nem era o problema mais grave. Até se tinha vindo a reduzir, ainda que lentamente, ao longo dos anos...

Só que quanto mais se subia, mais o número de alunos encolhia...

O número de estudantes formava uma verdadeira pirâmide, desde o primeiro ano (primeira classe) até ao ensino superior, que só estava acessível às classes mais privilegiadas, economicamente.

A maior parte das crianças ficavam-se pela quarta classe, especialmente no interior, onde escasseavam os liceus e as escolas técnicas nas Vilas e Cidades da maior parte dos distritos. Apesar da obrigatoriedade de todas as crianças frequentarem o ensino primário, imposta nos anos 1960, não se conhecem exemplos de qualquer tipo de penalização, para os pais que colocavam os filhos a trabalhar desde tenra idade, em vez de estudarem...

Se em algumas aldeias, as crianças para puderem ir à escola tinham de percorrer distâncias, por vezes superiores a dez quilómetros (só existiam escolas nas sedes de freguesia...), em relação ao ensino secundário, tudo piorava. Quem morava em Aldeias e Vilas mais afastadas, chegava a ter de percorrer distâncias entre os 20 e os 50 quilómetros, o que era um convite ao abandono escolar...

(Fotografia de Luís Eme - Foz do Arelho)


sexta-feira, abril 05, 2024

«Aposto que nunca se sente nua...»


Quando o homem disse para a jovem, que estava no palco. «aposto que nunca se sente nua...», todos os que os rodeavam interromperam o ensaio e ficaram a olhar, surpreendidos. 

Por breves instantes ficaram suspensos pelas palavras do encenador, depois sorriram. Aquilo podia parecer uma provocação, mas não era. Era mesmo uma constatação pelo que observava enquanto a jovem se expressava, pelas cores e imagens que faziam com que os braços e as pernas parecessem telas.

Há pessoas que acham que lhes é permitido dizer tudo o que lhes apetece, quase sempre pelos cargos que ocupam. Outras parece que gostam de "abusar da sorte". Fernando era uma dessas pessoas. Não falava muito, mas dizia sempre o que lhe apetecia, fazendo-se notar pelas coisas que dizia. Era por isso que era levado a sério.

Quando pararam para descansar, ele justificou as suas palavras, com a simplicidade que o caracterizava. «Olho para a Sara e sinto que ela tem uma segunda pele, mesmo sem nunca a ter visto sem qualquer peça de roupa. Imagino que o seu corpo seja igual aos braços e às pernas, esteja todo decorado.»

Todos ficaram a olhar, sem dizer uma palavra, provavelmente nunca tinham pensado no assunto, muito menos com  esta perspectiva. E depois ele continuou.

«Eu que não tenho nenhuma tatuagem, não tenho a sorte da Sara. Não consigo disfarçar nenhuma parte do corpo, nem tão pouco esconder a minha brancura, de quem não vai à praia há anos.»

Ficámos todos a sorrir. A Sara também sorriu e piscou o olho ao Fernando, com um aceno, como se concordasse com ele, na parte da nudez.

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quinta-feira, abril 04, 2024

O cheiro destes dias de nevoeiro...


Quando me levantei e espreitei a janela, descobri uma manhã quase de nevoeiro cerrado. Apenas via a fachada do prédio de frente.

Depois abri a varanda e não foi difícil de descobrir o cheiro esquisito da atmosfera, que normalmente vem "colado" a estes episódios, em que parece que o "mundo desapareceu"...

Enquanto bebia café lembrei-me dos dias de nevoeiro do  Barreiro, no começo dos anos oitenta do século passado, em que o ar se tornava quase irrespirável, especialmente nas noites mais fechadas e húmidas. Sabíamos que as fábricas da Quimigal aproveitavam estas "quase barreiras" para misturarem os gases tóxicos das suas torres enormes com o ar que respirávamos, deixando à nossa volta um cheiro muito pouco saudável, povoado de enxofre, amoníaco e outras pestilências, que quase nos arranhava a garganta.

Nessa altura as fábricas ainda funcionavam a todo o vapor e falava-se pouco do ambiente. Mesmo que todos soubéssemos que a única coisa que aquelas coisas deviam fazer era aumentar o crescimento dos pelos no nariz, nas orelhas e nas costas... 

Claro que estou a brincar. Faziam pior que isso, de certeza.

Mesmo sendo das artes e não das ciências, continua a fazer-me muita confusão, que estes cheiros esquisitos só apareçam no ar nos dias de nevoeiro...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quarta-feira, abril 03, 2024

Um Outro País, a 3 de Abril de 1974...


Nem sei por onde começar.

O País que existia a 3 de Abril de 1974, não tem nada a ver com este, em que vivemos, em 2024.

Onde se notavam mais diferenças era nas Aldeias, especialmente as das regiões do interior. Era um mundo vivido "à luz do candeeiro e à água do chafariz". Do saneamento básico nem vale a pena falar, porque só chegou a algumas aldeias, e já no século XXI...

Mesmo na aldeia dos meus avós maternos, que ficava a apenas a cinco quilómetros das Caldas da Rainha, já existia electricidade antes da Revolução, mas não em todos os lares. Como o meu tio Zé, estudava electricidade, na escola técnica, assim que esta apareceu em Salir de Matos, ele fez logo a instalação e passámos a ter "luz" (deve ter sido alguns anos antes do 25 de Abril, porque eu não me lembro da casa dos avós sem lâmpadas...), Mas recordo-me de visitar algumas casas de outros familiares (afastadas do centro da Aldeia) e de não existir luz eléctrica. Adorava o espectáculo proporcionado pelos candeiros a petróleo, com verdadeiros jogos de sombras  refletidos nas paredes, graças aos nossos movimentos. Sei que andava sempre de um lado para o outro com o meu irmão a ver a nossa sombra a crescer e a diminuir nas paredes (quando somos crianças brincamos com tudo...).

A água canalizada só deverá ter chegado a todas as casas, já nos anos noventa do século passado. Isso até se percebe, por o Oeste ser uma zona muito rica em água e quase toda a gente ter um poço. 

É curioso, que o chafariz onde se ia buscar a água para beber, da bica, com cântaros, hoje tenha um aviso, de que aquela água não e tratada e recomenda-se que não seja bebida,,,

Em relação ao saneamento, também deverá ter chegado nos anos noventa à aldeia, mas uma boa parte das casas, ainda mantêm o velho sistema da "fossa" (uma espécie de poço...).

Mas se falar da aldeia dos meus avós paternos, na Beira Baixa (Zebras), as coisas mudam de figura, para pior. Lembro-me, já depois do 25 de Abril, de a electricidade ainda não ter chegado. Havia uma única televisão na aldeia,  no também único café existente, que tinha um gerador para lhe fornecer energia... 

(Fotografia de Luís Eme - Salir de Matos)


terça-feira, abril 02, 2024

A Gente Boa de Abril e de Almada


Cresci numa cidade conservadora, que nunca se livrou (por vontade da maioria das pessoas que votavam...) do domínio da chamada direita democrática (PSD). Mesmo hoje é governada por um movimento independente, cujo presidente é um "dissidente" dos sociais democratas. Embora tenha sido uma "lufada de ar fresco" não se podem esperar rasgos demasiado revolucionários na sua governação.

Falo de Caldas da Rainha. A minha ligação à prática desportiva desde cedo fez com que passasse ao lado de muitas coisas. Mas aquela mania de querer "mostrar aos outros", o que se tinha e não tinha, sempre me fez confusão à cabeça. Sim, ter vontade de fazer uma casa com mais um divisão ou comprar um carro mais caro, que o familiar, vizinho ou até amigo (é uma maneira estranha de se ser amigo, mas acontece...), só para mostrar que tinha subido mais um degrau da tal "escadaria social", como se isso fosse a coisa mais importante do mundo.

Felizmente foi possível partir aos dezoito anos para a Cidade Grande, viver os meus primeiros tempos com um casal solidário e amigo, cuja formação superior não os desviou das preocupações sociais, de olhar os outros, nem de sentir que o País se começava a desviar de uma forma significativa do sonho de Abril...

O Zé e a Elisete foram muito importantes para uma ainda maior consciencialização política, e para o bom uso que se devia fazer da liberdade individual. Embora os meus pais fossem de esquerda (tal como eu perdiam as eleições todas nas Caldas...), não tinham a cultura social e política dos primos.

Mas a grande mudança deu-se quando eu tinha 24 anos e escolhi Almada como o meu porto de abrigo. Em pouco tempo, senti logo que pertencia aquela gente, sem preconceitos e manias de grandeza. Por ser governada pela CDU, a cidade tentava resistir (e conseguiu por alguns anos...) ao cavaquismo e ao mundo dos "novos-ricos", que essa figura tão bem caricaturada como "múmia", trouxe para o poder.

Apesar das muitas transformações do País, a gente de Almada que tive o prazer de conhecer, era a minha gente. As pessoas que trato orgulhosamente pela "Gente Boa de Abril".

Não as vou enumerar, até porque são bastantes as pessoas que me ajudaram a ser um melhor ser humano e cidadão. Gentes que valorizavam sobretudo os valores colectivos e que continuavam (e continuam...) a sonhar com o "País de Abril"...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


segunda-feira, abril 01, 2024

Bom dia Abril!


Há meses que achamos que são melhores que os outros, por razões várias. A escolha prende-se quase sempre com o clima. Depois há um ou outro caso, que se prende com acontecimentos, com memórias, e até mesmo com o mês em que nascemos.

É por isso que se eu dizer que Abril e Maio são os meus meses preferidos, é quase um lugar comum. Quem gosta de vida, de cor, de cheiros, dos campos, tem de gostar destes dois meses únicos (nem as alterações climáticas ainda lhe conseguiram roubaram algumas características muito próprias).

Abril tem ainda o atractivo de ser o mês da nossa Revolução mais recente, que comemora 50 anos daqui a pouco mais de vinte dias. É por essa razão que lhe irei dar uma atenção especial, com regressos ao passado, comparações que poderão ser uteis para quem "tem pouca memória" e passa o tempo a dizer mal de tudo (sem se preocupar muito em dar a sua pequena contribuição para que sejamos um País melhor...).

E é por isso que digo: bom dia Abril!

(Fotografia de Luís Eme - Sobreda)


sábado, março 30, 2024

Duas boas notícias dentro de uma (se as coisas correrem bem...)


Ainda a pensar nos Museus, a primeira boa notícia na constituição do novo Governo é a manutenção do Ministério da Cultura, algo a que o PSD costumava torcer o nariz (nunca percebi porquê).

A outra boa notícia, que acaba por estar dentro da primeira, é a escolha do ministro, aliás ministra, Dalila Rodrigues, que por onde passou deixou um rasto de competência e de vontade de mudar as coisas para melhor (foi ela que "revolucionou" e deu a importância que o Museu de Arte Antiga sempre teve, mas que se fingia não perceber...). Acabou por sair, aparentemente em conflito com os responsáveis políticos pela Cultura, por defender algo que deveria ser normal em todas as instituições, haver uma gestão própria, inclusive do orçamento.

Nos últimos anos foi a responsável pelo Mosteiro dos Jerónimos e pela Torre de Belém, onde também se verificaram algumas mudanças positivas (até por serem dos espaços culturais mais visitados de Lisboa...).

Provavelmente, não é uma pessoa fácil e maleável, para lidar com o mundo da política, onde existem sempre demasiados jogos de bastidores e hipocrisias. Mas a sua experiência (já deve ter engolido um número considerável de "sapos"...), competência e saber, são um sinal de esperança, para todas as pessoas que, de alguma forma, estão ligadas à Cultura no nosso País.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, março 29, 2024

Pois é, as "mordomias" do funcionalismo público continuam a fechar museus...


Ontem não fui apanhado pelo "dilúvio", embora tenha andado pelas ruas de Vila Franca de Xira, que ameaçavam transformar-se em pequenos rios.

Tudo isto porque, "à última hora", apeteceu-me ir ao Museu do Neo-Realismo ver a exposição de fotografia de Alfredo Cunha.

Esqueci-me foi que estávamos em véspera de feriado e que a função pública tem particularidades muito próprias, como fazer "tolerância de ponto" (sempre que podem), fechando as suas instalações ao público.

Por poucos minutos (cinco), ou talvez não, é provável que fechassem as portas antes... embora o papel afixado na entrada do museu dissesse que a partir das 13 horas as instalações estavam fechadas e só voltariam a abrir depois da Páscoa.

Embora o tempo continue apenas bom para a agricultura durante esta quadra religiosa, não consigo perceber que instituições como o Museu do Neo-Realismo, não sejam mais importantes que o "funcionalismo público", que não pensem nos turistas que costumam aproveitar os feriados para passear  e podiam querer  conhecer esta "casa de história e de histórias", que venha a Vila Franca de Xira e descubra que "está de férias"...

Vou mais longe, não percebo (nem acho que faça muito sentido...) que um Museu que queira ser visitado por pessoas, funcione no modelo "das nove às cinco" e esteja fechado aos sábados, domingos e feriados (acontece em muitos museus municipais de Norte a Sul...), que é quando as pessoas que trabalham, têm mais disponibilidade para os visitar...

(Fotografia de Luís Eme - Vila Franca de Xira)


quinta-feira, março 28, 2024

«Desconfia sempre dos homens que se preocupam demasiado com o teu aspecto físico.»


«Desconfia sempre dos homens que se preocupam demasiado com o teu aspecto físico.» A frase vinha acompanhada de uma piscadela de olho. 

A conversa não era comigo, mas fiquei a sorrir por dentro. Mesmo sabendo que aquelas palavras se referiam a qualquer jogo de sedução sexual - aliás homo -, e não a uma simples singularidade corporal.

Completamente fora do contexto, pensei em dois jeitosos. Cruzara-me com um deles há meia-dúzia de dias, sem conseguir escapar de um cumprimento breve. Não nos encontrávamos há mais de quinze anos. E para mim até podiam ser cinquenta, pois passava bem sem aquele reencontro. Foi um dos tipos mais "ranhosos" que conheci nas culturas em Almada. A única coisa que ele disse, assim que me viu, foi: «Estás velho! Estás cheio de cabelos brancos.» limitei-me a responder ao cumprimento, sem dizer qualquer palavra, mas com vontade de sorrir.

Era verdade. Estava mais velho. O meu cabelo agora era cinzento (não estava nos meus planos pintar o cabelo), mas continuava a olhar para o mundo de frente.

O mais curioso do episódio era o aspecto do fulano. Embora pintasse a meia-dúzia de pelos que tinha na cabeça, estava quase marreco e usava óculos com lentes de copo de três. Para piorar o cenário, tudo isto vinha embrulhado em apenas metro e meio de gente.

Muitos anos antes, um outro jeitoso (também das culturas...), sempre que me via, tentava insultar a minha inteligência usando o meu corpo, mais concretamente a minha barriga (quase inexistente na época...). Dizia sempre a mesma coisa. «Estas mais gordo.» Depois de ele repetir a graçola umas dez vezes, perguntei-lhe se a minha barriga o excitava muito, olhando-o nos olhos. Desviou o olhar e respondeu-me apenas com um sorriso amarelo. Foi remédio santo, nunca mais se preocupou com os meus "tecidos adiposos", na barriga ou em qualquer outro lugar.

Nunca tinha pensado a sério nisso. Mas olhando para estes dois exemplos pessoais, é verdade. É mesmo de desconfiar...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quarta-feira, março 27, 2024

João Lagarto, ou a importância de um actor ( e da música, claro) dentro de "Tudo Isto é Jazz!"


Hoje festeja-se o teatro, por esse mundo fora. 

Lembrei-me do poema da AnyAna, das peças que escrevo directamente para a gaveta - sem lhes arranjar um final -, e sobretudo das salas que não visito e das peças que não vejo.

É por isso que vou falar de um acaso feliz, desta manhã. Enquanto trabalho, tenho muitas vezes a televisão ligada. Normalmente vejo coisas "atrasadas", que me passaram ao lado ou que não tive tempo de ver. Foi desta forma que "descobri" que na noite de domingo para segunda a RTP2 transmitiu o espectáculo, "Tudo Isto é Jazz!", de homenagem a Luís Villas-Boas, que fez cem anos este mês.

Comecei a ver o espectáculo que misturava jazz com teatro e a ficar deliciado com João Lagarto, que fazia (muito bem) o papel do "pai do jazz" no nosso País, e claro, com a música.

Não conheci muito bem Luís Villas-Boas (acho que o cheguei a entrevistar...), devo ter falado com ele duas ou três vezes. Mas mesmo assim penso que a personagem está muito bem caracterizada, até fisicamente (os óculos, o bigode, o penteado e os trejeitos pareceram-me excelentes...).

Felizmente houve pessoas como o Luís, irreverente, teimoso e desalinhado. Só desta forma é que é possível contrariar a "mediocridade" que se arma em sentinela nas ruas das artes e letras do nosso país (e se pensarmos nas coisas que fez durante as ditaduras salazaristas e marcelistas...) e virar algumas coisas, quase de pernas para o ar.

Felizmente escolheram o João Lagarto, para ser um Villas-Boas, quase autêntico, a falar com a normalidade possível, sem usar dotes declamatórios, passando em quase duas horas pela vida de um grande amante dessa música que hoje é de todo o mundo e de todas as cores (foi muito bem metida a frase, de que o jazz se dá muito bem com os climas frios, por ser também bastante amada e tocada no Norte da Europa...).

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


terça-feira, março 26, 2024

O bem e o mal (dentro e fora dos filmes), com e sem triunfos...


Se a vida cada vez é mais estranha, não se deve esperar que os filmes ou as peças de teatro, sejam muito diferentes. Mas nem é sobre isso que vou escrever.

Estou a deitar jornais fora e fixo a frase do realizador Victor Erice: «Reivindico o cinema da minha infância, que acabava com o triunfo do bem e do castigo do mal.» 

Fico a pensar na realidade e sinto que nunca foi bem assim. O mundo foi quase sempre dominado pelo "mal", mesmo que este se gostasse de disfarçar de "bom rapaz", durante séculos.

Quando leio a separação das coisas, entre o bem e o mal, a primeira coisa em que penso é nas religiões. Não consigo fugir dos homens das "igrejas", que faziam exactamente o contrário do que pregavam, sem se darem ao trabalho de dizerem para "olharmos" para o que eles diziam e não para o que faziam... 

Mesmo sem entrar nas suas práticas mais pecaminosas e reprováveis, ficando-me apenas pela sua postura em relação aos poderes (especialmente o político), que abraçavam com deleite, por defenderem ambos a sua opulência, a ignorância do povo e a existência de um "mundo com milagres", fico sempre de "pé atrás". 

Desconfio sempre de coisas que falam do triunfo do bem e do castigo do mal, especialmente das da minha infância...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, março 25, 2024

Ontem falei de títulos, hoje falo dos nomes das personagens dos livros...


Não conheci António Tabucchi. Mas li dois ou três livros da sua autoria. Entre os quais "Afirma Pereira", que despertou alguma confusão com o nome de personagens, à hora do café. O Jorge falou da existência de um senhor Ventura nesta sua história sobre Lisboa e sobre Pessoa. Quem lera o livro não se lembrava da existência da dita personagem (eu por ser péssimo em nomes, não entrei na discussão). Foi quando o Mário trouxe outro livro para a mesa, "O Senhor Ventura" de Miguel Torga, que tinha mesmo esta personagem. 

Se li o livro, não me lembro dele nem do senhor Ventura. O Mário disse que se tratava da história de um emigrante, um português mais perto do nosso Fernão Mendes Pinto que do comum emigrante dos arrabaldes de Paris, pois era bastante curioso e não tinha medo do mundo.

A existência deste livro fez com que o Jorge mantivesse a sua vontade de nos provocar, por causa desse grande mentiroso, que lidera a extrema-direita, que até foi capaz de inventar uma história de resistência e de fuga à guerra colonial de um nosso emigrante que partiu a salto para França, em 1976, eleito agora deputado pelo círculo da Europa.

E lá cometemos o erro mais comum dos jornalistas e comentadores: começámos a falar deste pequeno caso, de mais uma mentirinha do outro senhor Ventura. O Jorge queria saber se as pessoas tinham noção de que aquele sujeito tinha dificuldade em dizer uma frase sem mentir. A maior parte de nós, achámos que essa característica era secundária na vida política, só passaria a importante se ele alguma vez fosse primeiro-ministro, defraudando as espectativas dos seus seguidores como está a acontecer na Argentina, por exemplo.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)