terça-feira, fevereiro 28, 2023

Uma Oportunidade que me pareceu rara...


Há coisas que fotógrafo sempre que posso.

Uma delas são os leitores, provavelmente por começarem a rarear, um pouco por todo o lado. Encontrar um cacilheiro cheio de gente, umas com jornais outras com livros, é coisa do "século passado". 

O smartphone está a vencer em toda a linha...

Foi por isso que antes de me cruzar com esta menina, com a capacidade invulgar de ler e andar ao mesmo tempo, não resisti e tentei fazer o seu retrato.

Continuei a caminhar do Ginjal até Cacilhas e lembrei-me da Catarina, que lê de muitas maneiras. Será que também consegue ler enquanto passeia?

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


segunda-feira, fevereiro 27, 2023

Selecções (quase naturais) do olhar...


Dizer que não olhamos para as mesmas coisas, da mesma maneira, é quase uma banalidade. Mesmo assim, há sempre quem queira espreitar para dentro da nossa cabeça, para ver se é mesmo verdade, que pensamos e olhamos o mundo de formas diferentes... 

Pensei nisto quando estava em silêncio no meio de uma conversa. Enquanto tentavam decifrar a razão de se gostar de usar calças amarelas, eu mantinha-me de fora, incapaz de entrar naquele jogo. Provavelmente, por ser do contra, comecei a imaginar razões pelas quais alguém era quase forçado a vestir aquelas calças vistosas. Podia muito bem só ter aquelas calças para vestir... as outras podiam estar sujas ou outra coisa qualquer, mais absurda. Mas melhor mesmo, era não existir qualquer explicação. A mulher tanto podia usar calças amarelas, como azuis, encarnadas ou verdes. O mais importante para ela era serem cómodas, "vestirem bem", mesmo que cor escolhida pudesse bater de frente com alguns olhos mais susceptíveis.

Quando passou um eléctrico, disse que quem lhe tinha escolhido a cor, tinha muito bom gosto.

De repente ficou tudo em silêncio. Foi como se a mulher das calças amarelas tivesse, entretanto, ido a casa mudar a toilette...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, fevereiro 25, 2023

«Somos uns felizardos. Felizmente, o problema das literaturas nunca foi, nem será, o já se ter dito e escrito quase tudo...»


Quando me encontro com um amigo escritor, é como se me visse ao espelho, mesmo que seja um daqueles "vidrinhos" de "feira popular", de aumentar...

Talvez até finja que tenho os mesmos problemas que ele, só para ser solidário... Talvez.

Mas nós somos o que somos. Mesmo fora dos livros, não consigo fazer da vida um drama diário. Consigo olhar quase sempre para o outro lado da coisa e evitar martirizar-me. Se por qualquer acaso, chover a semana inteira, sei que os rios vão voltar a fazer corridas até à foz e deixa de ser um problema...

São as vantagens de se ser optimista e ligeiramente distraído.

Nunca sei se me está a desafiar a experimentar a separação, quando diz que são os meus filhos e a minha mulher que me toldam a cabeça e afastam dos livros com histórias mais compridas. 

Sorrio. Não digo, mas penso... Talvez os romances não sejam assim tão importantes nas nossas vidas...

Quando disse que o problema maior que a literatura vai enfrentar, é a falta de leitores, sorriu-me e disse um palavrão, daqueles de que nos socorremos diariamente. Sim, ele estava se lixando para as pessoas que liam livros, há muito tempo que sabia que não escrevia para elas, mas sim para si...

Depois disse-me que estávamos a voltar atrás no tempo, no século XIX também era assim, pouca gente sabia ler e contavam-se pelos dedos os leitores...

E eu acrescentei que nessa altura quem escrevia eram pessoas privilegiadas, que não precisavam dos leitores para sobreviverem. Voltou a sorrir e ficou em silêncio alguns segundos, antes de responder.

E depois disse, quase a despropósito: «Somos uns felizardos. Felizmente o problema da literatura nunca foi, nem será, o já se ter dito e escrito quase tudo...»

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, fevereiro 24, 2023

A sabedoria popular explica quase tudo...


Bruno Nogueira escreveu uma crónica na "Sábado", quase venenosa, dedicada aos seus pares, com menos talento, com mais idade e claro, com um futuro menos risonho. Mas vai mais longe e diz que o seu "desporto" preferido, é dizerem mal dos outros, ao mesmo tempo que se acham "os melhores do mundo".

Provavelmente nem estou a sintetizar o artigo da melhor maneira, por ser repetitivo e ligeiramente confuso. Mas nem é disso que quero falar.

O actor não fala em nomes. E foi esta generalização que gerou alguma polémica, na conversa que decorreu no intervalo para o café.

Fui quase o único a dizer que não eram precisos nomes, porque aquela "sintomatologia" devia ter muitos seguidores na profissão. Nós é que andamos mal informados sobre as muitas tricas que rodeiam os bastidores dos palcos e das telenovelas. 

Quem vive nesse mundo, sabe com toda a certeza, para quem é que esta crónica é dirigida. E também explica um modo de ser muito português, onde o que menos faltam são os "apontadores de dedos", que fingem que é mais fácil olhar para os outros que para o espelho...

Houve alguém que recorreu à sabedoria popular e nos deixou a sorrir, ao mesmo tempo que disse que ela explica quase tudo. E explica mesmo...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quinta-feira, fevereiro 23, 2023

«Não é só Portugal que estragam. É sobretudo a esperança de ver um Portugal melhor.»


Um dos meus trabalhos, é a busca das palavras dos outros. De vez enquanto encontro coisas que não se conseguem deixar engolir pelo tempo, por nossa culpa (eu sei que há exagero neste sentido colectivo, quando os culpados são sobretudo todos aqueles que nos governaram nas últimas quatro décadas).

Quando Pedro Norton, uma voz insuspeita nos meandros sociopolíticos, escreve: «Se a ideia é só mudar as moscas, tenham um mínimo de decoro e poupem-nos aos discursos messiânicos. Não é só Portugal que estragam. É sobretudo a esperança de ver um Portugal melhor.» O mais curioso é que esta transcrição é de Março de 2012, da "Visão"...

O problema é que andamos nisto há quase quarenta anos. Desde a entrada na União Europeia, que não conseguimos utilizar os fundos europeus para melhorar o país, enquanto Estado democrático. Nunca se fizeram as reformas cada vez mais necessárias, na justiça, na educação, na saúde, na administração pública ou na defesa. Fingimos que as coisas funcionam, remendando aqui e ali, quase sempre com mais custos, e sem que se faça a coisa certa, a pensar no futuro de todos nós.

Desde Cavaco Silva (que gosta muito de se pôr em bicos de pés, mesmo sendo quase o rei dos "rabos de palha"...), passando por António Guterres, Durão Barroso, Santana Lopes, José Sócrates, Pedro Passos Coelho e António Costa, nunca foram feitas reformas de fundo que contribuíssem para a modernização e sustentação do país.

É caso para dizer: tanto tempo e tanto dinheiro perdido...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quarta-feira, fevereiro 22, 2023

Quem diria, a especialidade deste Costa maioritário, são os "tiros no sapato"...


Durante anos e anos fingiu-se que não existia um problema na habitação em Portugal (falta de casas com rendas acessíveis), especialmente nos dois grandes centros urbanos, Lisboa e Porto.

Com o crescimento do turismo os políticos vangloriavam-se com a recuperação de edifícios e fingiam  não ver que uma boa parte dos habitantes de bairros tradicionais estavam a ser empurrados paras as periferias das duas cidades grandes.  Até tiravam o chapéu aos muitos empreendedores do alojamento local, sem se preocuparem que uma cidade sem vida própria, torna-se numa outra coisa, a fingir, que acaba por se parecer com uma "cidade de bonecas e bonecos".

Os estrangeiros encantados com a nossa "simpatia" (até falamos inglês com eles, mesmo sem saber a língua...), com o Tejo e com o precário das casas, desataram a comprar tudo o que lhes era possível, mesmo que só passassem por Lisboa, um ou dois meses por ano... E outros mais espertalhaços compravam para recuperar e vender (grande galinha de ovos de ouro...).

Até que o governo do Costa fingiu que acordou para o problema e quer fazer uma lei cheia de teorias, que como tantas outras, poucos efeitos práticos terá...

Há já uns bons anos que quando soube que o prédio da imagem (na chamada rotunda dos bancos de Almada), estava à venda, até se falava de se transformar em hotel, depois chegou a andar em leilão - mas segundo parece continua abandonado e sem comprador -, achei que podia ser uma oportunidade para o Município de Almada reduzir o problema, pois ao adquiri-lo poderia acolher cerca de três dezenas de famílias jovens à procura de habitação...

Existem pela certa centenas de prédios como este, de Norte a Sul, devolutos, e que ainda não estão em ruínas, que poderiam alojar milhares de famílias, com as tais rendas acessíveis para quem procura e precisa de casa.

Mas tanto este governo central como os locais, preocupam-se mais em fazer leis que em resolver os problemas reais que afectam as pessoas...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


terça-feira, fevereiro 21, 2023

Mudar o nome às coisas, apenas porque sim...


Este título é enganador, porque ninguém muda o nome às coisas apenas porque sim. Pelo menos aqueles de quem quero falar: os presidentes de qualquer coisa, que até pode ser apenas da junta de freguesia ou do clube de chinquilho com cerveja e vinhos de várias cores.

Muitos políticos poderiam mesmo dizer, no dia das inaugurações ou da mudança de placas, "eu te baptizo, em nome da minha vaidade e fingimento" (sim, finge-se muito que se muda, quando apenas se altera o nome disto ou daquilo...). O desconhecimento da história e da identidade local  faz com que em muitas dessas mudanças se "roube" alguma coisa ao passado, sem que se dê ou acrescente algo ao presente e ao futuro.

Claro que nem sempre esta ânsia de protagonismo e de querer ficar na história, é bem sucedida. O melhor exemplo são os largos e ruas que já tiveram quatro ou cinco donos e mesmo assim, nenhum se consegue agarrar ao espaço. A maior parte das vezes a simplicidade vence... 

É por isso que o Largo de Cacilhas, será sempre o Largo de Cacilhas, mesmo que se goste da história de resistência do Alex Dinis ou se pense que o Costa Pinto nunca de lá devia ter saído...

Já quase no final do texto, lembrei-me de um certo político (ainda bem que não sou bom em nomes e não faço ideia se o sujeito era josé ou manuel...), que foi presidente de câmara em Elvas e "baptizou" quase tudo que tinha alguma relevância local com o seu nome. 

Será que a sua "vaidade" tem resistido ao tempo? Gostaria muito que não, mas todos sabemos que no nosso país não é muito difícil o impossível ser possível...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


segunda-feira, fevereiro 20, 2023

Ser "Amador" ou "Profissional" no Mundo das Artes e Letras...


No sábado escrevi sobre arte, a propósito de uma conversa com um amigo.

Curiosamente, no domingo, ao ler a crónica de João Lopes no "Diário de Notícias", onde recordava o seu encontro no nosso país com o cineasta Glauber Rocha, não consegui deixar de concordar com a visão do realizador brasileiro, que nos deixou cedo demais.

Eis a transcrição da parte final do texto, em que Glauber fala sobre a sua visão e relação com a arte. Explica muito bem a tal diferença entre o "amador" e o "profissional". 

«Glauber chama-nos a atenção para a possível redução da obra de arte a um "comentário" daquilo que faz manchete no espaço jornalístico. Não que essa obra seja estranha ou exterior a tal contexto (bem pelo contrário!), antes porque o labor do artista não existe para duplicar as linhas de força da atualidade mediática, muito menos para confirmar a suposta intocabilidade dos "temas" com que essa atualidade se afadiga a mobilizar a consciência de cada um de nós.

Daí o seu distanciamento de qualquer visão "sagrada" do espectador: "O problema do espectador na obra de arte é um problema que eu não considero, digo-lhe isto com a maior sinceridade. Porque eu acredito que a obra de arte é um produto da loucura, no sentido em que fala o Fernando Pessoa, que fala o Erasmo, quer dizer, a loucura como a lucidez, a libertação do inconsciente."

Daí também a recusa de qualquer estatuto corporativo: "É por isso que eu não me considero um cineasta profissional, porque se o fosse teria que atuar segundo o ritual da indústria cinematográfica. Considero-me um amador, como o Buñuel, alguém que ama o cinema...".»

Eu também penso como ele, também me sinto um amador. Provavelmente isso acontece por ter medo de ser engolido pelo "trabalho artístico das nove às cinco"... 

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


domingo, fevereiro 19, 2023

A Perda de Poder e de Influência da Religião Católica na nossa Sociedade


Não tenho grandes dúvidas de que a escolha de uma Comissão Independente para investigar os casos de abusos sexuais perpetuados por elementos do igreja durante séculos, perante os seus seguidores, só foi possível, porque nos últimos anos tem sido notória a perda de poder e de influência da religião católica na nossa sociedade.

Apesar desta perda de poder e de influência, continuamos a ser mais condescendentes do que devíamos para com o catolicismo. Provavelmente isso acontece por uma boa maior parte de nós ter sido ser baptizada e educada segundo as tradições católicas... 

O mais curioso é esta condescendência se estender aos próprios governos, que ao longo dos anos têm contrariado a própria constituição, que não só nos define como um Estado laico como defende a igualdade religiosa.

Com tudo o que aconteceu nos últimos dois meses, é normal que surjam mudanças significativas nos próximos anos. Embora alguns dos seus elementos mais influentes ainda não tenham percebido que as coisas mudaram... É a única explicação que encontro para que o bispo que encomendou um altar de milhões, tenha depois vindo a dizer que o  dito Altar também o tinha "magoado"... Um exemplo pior foi o dado por outro bispo (com muito pouca coisa de lindo...), que depois de tentar menorizar e desvalorizar a investigação aos abusos pela igreja, vem agora dizer que "sofre e chora" pelas vítimas...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sábado, fevereiro 18, 2023

«Estou farto dos pantomineiros que dizem que são artistas»


A arte continua a ser alvo de todo o género de especulações. Parece que basta acordar com uma ideia qualquer maluca e torná-la real. Onde se nota mais isso é nas "instalações", muitas delas sem ponta para pegar.

Foi também sobre isso que conversei com um amigo pintor que não visitava há mais de três anos, na sua garagem-ateliê. 

Está completamente desiludido com os caminhos que têm seguido por esse mundo fora. Ainda hoje não percebe como é que é possível a manutenção de uma guerra, que não passa de uma tentativa de invasão e ocupação de um país, no continente europeu, onde se dizia que não habitavam bárbaros... 

Mas também está descontente (já estava...) com os descaminhos da arte. Não aceita a ideia deste "vale tudo", que se espalha por todo o lado, até nos domínios artísticos, onde os gajos que não sabem sequer desenhar, espalham a ideia de que "tudo é arte".

Embora nos anos setenta e oitenta vendesse bastante, nunca fez parte do chamado "circuito", nem mesmo em Almada. E sente-se bem assim, fora de "sindicatos", de "partidos" e do que quer que seja, que nos suje as mãos.

Continua a pensar que cada obra de arte é única. Vai contra todo o género de repetição (muitas vezes quase imposto pelas galerias), que leva à mecanização e só tem como objectivo satisfazer o "negócio".

Concordei com quase tudo o que me disse, até quando se meteu com a pantomina: «Estou farto dos pantomineiros que dizem que são artistas.»

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sexta-feira, fevereiro 17, 2023

Podia ser Teatro, mas é a Nossa Vida (política e social)...


De repente parece que todos acordaram para o problema da habitação nos dois maiores centros urbanos do país,  com pelo menos uma década, que se foi agravando, com invenções como as dos "vistos de ouro", que serviu mais os interesses dos próprios que os do Estado.

Quem está no Governo finge-se revolucionário, até quase que ameaça "nacionalizar" as casas devolutas, decreta o fins dos ditos "vistos", assim como as licenças de alojamento local, que têm empurrado os habitantes para fora das cidades, como se tudo funcionasse às mil maravilhas  em Lisboa e no Porto, apenas com turistas e com emigrantes (quase obrigados a viverem 50 por barracão...).

O "mayor" da cidade de Lisboa fingiu-se muito indignado (até cresceu uns centímetros e engrossou ligeiramente a voz...), por todas estas novas regras terem sido aprovadas sem o ouvirem. Logo a ele que "manda na cidade grande"...

Os restantes partidos pegam nas "aberrações" que mais lhes convém neste problema, demasiado sério, até para eu estar aqui quase a brincar. Mas a esquerda e a direita são assim, tudo lhes serve para deitar abaixo o Governo maioritário, que ainda por cima gosta de se por a jeito.

Não restam grandes dúvidas, que são demasiados anos em que se finge que se governa. Ao ponto de se ter chegado a esta situação-limite, em que temos praticamente as casas mais caras  (para venda ou aluguer) e os ordenados mais baixos da Europa...

Mesmo que esses senhores que vêm em cada casa vazia uma oportunidade de negócio, de preferência para alojamento local, pensem que podemos ir todos viver para "debaixo da ponte", o Tejo além de ser demasiado largo, só têm duas pontes. Ainda por cima são demasiado altas para que seja possível esconder "tantas misérias" e desgovernos...

(Fotografia de Luís Eme - Tejo) 


quinta-feira, fevereiro 16, 2023

"Uma Sereia Chamada Ermelinda"


Nos anos em que ando mais envolvido com projectos literários, leio menos.

O mais curioso, é esta quase pausa, começar logo em Janeiro, mesmo que no começo do ano ainda tenha bastante disponibilidade para ler.

Este mês pensei que talvez seja possível "fintar" esta quase paragem com a escolha de livros mais pequenos e interessantes... A minha primeira escolha foi a peça de teatro "Uma Sereia Chamada Ermelinda", da autoria de Alexandre Castanheira (lida em dois "actos"...). O mais curioso, foi ter assistido à peça em 2011 (ano da edição do livrinho que me foi oferecido pelo autor...), que se baseava no romance autobiográfico, "Cais do Ginjal", de Romeu Correia, encenada pela Associação Manuel da Fonseca, e nunca a ter lido.

Gostei de ler a peça, porque Alexandre Castanheira não se cinge ao "Cais do Ginjal" (pelo menos foi o que senti...), há por ali pequenas coisas dos "Tanoeiros", do "Tritão" e até de obras biográficas, como a história de vida de Armando Arrobas, que Romeu quase imortalizou.

E tem também uma forte componente de resistência e consciencialização política, através da Ermelinda, que é muito mais que uma "sereia"...

Foi bom reviver lugares e personagens (dentro e fora dos livros), numa obra que tem uma dedicatória muito singular e pessoal...


quarta-feira, fevereiro 15, 2023

«Perdi o hábito de ir ao café e de estar ali sentado a ver o mundo a passar»


O telefonema soava-me a "urgência". 

Embora soubesse que do outro lado estava uma pessoa complicada, que gostava mais de desenhar e pintar do que falar.

Mas o café era uma fonte de inspiração. Da mesma forma que eu às vezes escrevia em guardanapos de papel bíblia, ele desenhava, projectava... Foi por isso que estranhei.

Foi então que ele me disse que muitos dos amigos deixaram de ir aos dois ou três cafés que ele frequentava durante a pandemia e que nunca mais voltaram...

E foi ainda mais longe, quando disse que não se sentia bem sentado sozinho na esplanada. Viúvo há meia dúzia de anos, só agora é que sente o vazio que ficou em todo o lado.

Isso fez com que insistisse para bebermos um café depois do almoço. Ele disse que sim, mas lamentou-se: «Perdi o hábito de ir ao café e estar ali sentado a ver o mundo a passar.»

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


segunda-feira, fevereiro 13, 2023

Igualdade não é Sermos Iguais...


Continuamos a ter dificuldade em perceber alguns conceitos, por mais simples que sejam.

E é por isso que disciplinas como a "polémica" Cidadania (polémica apenas por sermos um país de burros que se julgam muito espertos e inteligentes...), podem e devem ser essenciais para ajudar os jovens a "ler" e a "entender" a sociedade onde estão inseridos. E depois até poderão ajudar em casa, para que a própria família viva em sociedade de uma forma mais saudável.

Digo isto porque tive alguma dificuldade em explicar a um sujeito com mais de quarenta anos, que igualdade não é a mesma coisa que sermos iguais. Aliás, se nascemos todos diferentes nunca poderemos ser iguais. Podemos e devemos, sim, lutar para que tenhamos os mesmos direitos, as mesmas oportunidades na sociedade...

(Fotografia de Luís Eme - Cova da Piedade)


domingo, fevereiro 12, 2023

"Uma boa conversa continua a ser a melhor maneira de dar e receber conhecimento" (será?)


Estávamos sentados, a conversar sobre a actualidade, quando fomos interrompidos, por uma daquelas mulheres que finge não perceber quando é inconveniente, e cuja única linguagem que conhece é a chamada conversa de circunstância (ou da treta...), que normalmente se fixa na nossa família, na saúde e se tiver espaço, acaba no boletim meteorológico...

Depois daquele interrogatório banal, ficámos a olhar um para o outro, com cara de caso. Para não voltarmos a ser interrompidos naquela casa que já foi de cultura, fomos até ao bar da Salete, que a meio da tarde está sempre calmo.

Entre muitas outras coisas, falámos da história e da identidade almadense, que está a ser empurrada para as traseiras de qualquer coisa, que ainda não se percebeu muito bem o que é. Percorremos o final das indústrias naval, corticeira e vinícola. E até o fim do "operariado", sim, parece que já não existem operários... os trabalhadores ganharam outros nomes nos últimos anos. E talvez eles próprios não querem ser conhecidos por operários... 

E depois fomos até ao associativismo, que também é outra coisa neste século XXI. E para o fim ficou o jornalismo, o nosso e o dos outros.

Depois de nos despedirmos, caminhei até ao centro de Almada, reconfortado pela partilha, por este dar e receber dentro de uma conversa de amigos. Sim, por sermos pessoas quase antigas, sabíamos que "uma boa conversa continua a ser a melhor maneira de dar e receber conhecimento"...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


sexta-feira, fevereiro 10, 2023

A Ilusão de Encontrar algo de Novo, Através da Fotografia...


Hoje à hora de almoço encontrei um amigo no restaurante que mais frequento em Almada.

Acabámos por falar de várias coisas, inclusive de fotografia. Elogiou as imagens que publico aqui no "Largo" e  meu olho para o pormenor.

Disse-lhe que à medida que vamos ficando reféns, desta coisa que é fotografar, temos sempre a ilusão de ir ao encontro de algo de novo, aqui e ali. Escolhemos novos ângulos, como se eles fossem a resposta para o que procuramos. E muitas vezes não é... 

Contei-lhe que na véspera o meu filho descobrira a minha velha "AE 1" e mostrou-se interessado em dar umas voltas com a máquina, depois de dizer que as analógicas estavam de novo da moda. Sorri-lhe e disse que podiam estar na moda, mas que era mais complicado tirar uma boa fotografia com elas, que não havia nada como o digital para se tirarem belas imagens, graças à possibilidade da repetição e da escolha. No mundo dos rolos fotográficos é tudo mais lento e complicado...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quarta-feira, fevereiro 08, 2023

"Milagres" no Meio dos Escombros...


O terramoto que ceifou milhares de vidas na Turquia e na Síria, deixa muitas questões no ar. 

Mas o mais curioso, é que, mesmo nas notícias televisivas que nos últimos anos têm apostado mais no "sangue" e na "morte" que na "vida" (não sei se por influência local, imagino que as primeiras imagens difundidas foram das televisões locais...), têm sido bem mais positivas do que estamos habituados. E ainda bem.

Até agora o maior destaque tem sido a vida humana, os quase "milagres" que têm acontecido, todos os dias, com o salvamento de dezenas de crianças (as imagens de um recém-nascido, que sobreviveu à própria mãe, deixam-nos sem palavras...), que têm sido o foco das notícias, deixando a esperança a pairar no meio dos escombros, muitas horas depois da terra tremer...

(Fotografia de Luís Eme - Arealva)


terça-feira, fevereiro 07, 2023

Doenças, Liberdades e a "Músicas das Mentiras"


Gostamos de tentar explicar as coisas de uma forma simples. Deve ser por isso que se usa e abusa da frase, "a sociedade está doente".

E tanto se diz isto a nível social como a nível político. Tudo o que fuja à norma, pode ser empurrado com a maior das facilidades, para o lado das "doenças".

Nos últimos anos usou-se a palavra "liberdade" para se ir aumentando a distância entre os extremos da sociedade, transformando-a numa estrada cada vez mais larga e diversa, onde se fica com a sensação de que se pode ser tudo e pode-se fazer tudo...

Posso dar dois exemplos: no nosso parlamento nunca fizeram e disseram coisas, como desde que por lá anda sentada a extrema-direita (esta semana até se ergueram cartazes com a fotografia de uma deputada e baterem os pés no soalho, como fazem alguns manifestantes nas galerias, que são prontamente convidados a sair pelas autoridades...). Na sociedade também se tem tentado fintar a dita "normalidade", ao ponto de se terem inventado nos últimos anos vários géneros sexuais, que não se limitam à nossa condição de homens ou mulheres, querem ir muito mais longe, é só escolher.

Continuo a pensar que isto não tem nada que ver com "doenças", tem mais a ver com a desregulação social, que está refém do mau uso da palavra "liberdade". 

Enquanto muitos de nós baixamos os olhos, fingimos virar as costas, metemos as mãos nos bolsos, o volume da "música das mentiras" vai aumentando à nossa volta, tal como o número de dançarinos, que quer é diversão, deixando-se se levar por uma falsa anarquia que os levará à repressão (a história diz-nos que é sempre o que se segue aos períodos onde se usa e abusa da liberdade...).

(Fotografia de Luís Eme - Alcochete)


segunda-feira, fevereiro 06, 2023

Ainda hoje tenta "descodificar a frase: "ser diferente e fazer a diferença"...


Passaram-se uns trinta anos, desde que ele era um promissor actor e houve alguém que lhe disse que só valia a pena continuar ali, se estivesse mesmo apostado "em ser diferente e fazer a diferença".

Foi a pior crítica e conselho que podiam fazer a um jovem, Ainda por cima veio de um encenador. Porque dizia tudo e não dizia nada. Ficou intrigado e ao mesmo tempo desgostoso. Na época pensou que o que o encenador lhe quis dizer, foi que estava na profissão errada, que nunca iria ser ninguém nos palcos.

A frase acabou por ser determinante para que seguisse o conselho (e a vontade...) dos pais e acabar o cursinho e ter uma vida igual a tantas outras, deixando para trás o sonho da representação. 

Finge que não se arrepende da opção tomada, quando vê que muitos dos companheiros com quem se iniciou no teatro também não conseguiram "ser diferentes nem fazer a diferença"...

Mas nos últimos tempos começou a pensar que aquela frase não se referia apenas ao talento, também queria entrar na sexualidade, no que somos e no que desejamos. Recordava-se dos avanços tímidos do encenador, com pequenos toques e olhares quase profundos. Mas ele não era isso. Sabia que era de raparigas que gostava...

O que ele estranhou foi só pensar nisso agora. Nunca antes pensar que o "ser diferente" pudesse estar ligado à sua opção sexual. E até podia não estar. Mas a dúvida estava ali, bem viva...

Quando me contou este episódio, não fui capaz de o ajudar, porque a frase era de facto bastante enigmática. Adiantei que aquelas palavras só deviam ter a ver com o teatro, sem certezas.

Mas mesmo que ele quisesse esclarecer o assunto, já era tarde demais, pois o encenador já não está entre nós...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, fevereiro 05, 2023

A Influência do "Populismo" na Forma como Pensamos e como nos Expressamos...


Penso que o que o populismo tem de mais perigoso, é a sua influência, quase massiva, nos pequenos e grandes problemas com que nos debatemos do nosso dia a dia. Consegue agarrar em qualquer ponta solta (cada vez existem mais...)  e fazer logo um juízo de valor letal. Não só deturpa os factos, como usa as meias mentiras e as meias verdades como melhor lhe convém.

Numa época em que quase todos somos vítimas de uma inflacção que parece imparável, e que tanto mexe com as nossas vidas, é fácil deixarmo-nos enredar pelos discursos populistas, na forma como pensamos e até como nos expressamos.

Mas o pior de tudo isto, é a sensação de que uma boa parte das pessoas, começa a ter preguiça de pensar. É muito importante termos um sentido crítico em relação ao mundo que nos cerca, tentarmos perceber o porquê das coisas. 

Por vezes. basta pensarmos um pouco, para perceber que este "bota abaixo" sobre tudo o que nos rodeia, não nos leva a lado nenhum. Não é por acaso que o que demora a construir em anos, pode ser destruído em segundos e minutos...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sábado, fevereiro 04, 2023

Tem Tudo para Dar Errado...


Li a notícia no site do "Record" e pensei logo que tinha tudo para dar errado...

Estou a falar da decisão tomada na assembleia geral do Clube Desportivo Cova da Piedade (aliás, tomada pelo presidente da Mesa da Assembleia Geral do Clube, através do seu voto de qualidade, após um empate entre 33 sins e de 33 nãos...), de acolher o clube "sem abrigo", cujo nome passou a designar-se por apenas uma letra a B, após ter sido "corrido" do Clube de Futebol "Os Belenenses", que apesar de ser um clube de primeira, não teve qualquer problema em voltar aos distritais.

Felizmente foi subindo todos os anos de divisão e hoje já está na Liga 3, que parece um campeonato de históricos, principalmente na sua zona, onde tem como adversários o Vitória de Setúbal, a Académica, o Caldas, o Alverca, o União de Leiria e o Amora, que já estiveram na Primeira Divisão.

Voltando ao Cova da Piedade, depois de ter tido uma SAD com capital chinês de triste memória, que depois de deixar um rasto de dívidas, decretou falência, volta a "navegar" no erro, ao juntar-se a outra sociedade que pelo exemplo que deixou em Belém, também não honra os seus compromissos. 

Percebe-se à légua que a lei sobre as sociedades desportivas devia ser mais transparente e também mais exigente. Contam-se os exemplos de mais de uma dúzia de clubes, que tiveram de mudar de nome para poderem continuar disputar os campeonatos de futebol. E outros, tiveram de fazer como o Belenenses, começar de novo nos distritais... 

Talvez o exemplo mais recente e mediático, seja o do Desportivo das Aves, que até teve a Taça de Portugal, que conquistou no jogo com o Sporting de triste memória (depois da invasão de Alcochete...), em leilão...

E é por tudo isto que digo, que esta união, tem tudo para dar errado.

E ainda há um aspecto não menos interessante: onde irá jogar esta SAD? Será que vai voltar ao Estádio Municipal da Cova da Piedade, apesar do rasto de incumprimentos que deixou atrás de si?

(Fotografia de Luís Eme - Cova da Piedade)


sexta-feira, fevereiro 03, 2023

«Isto está a ficar bonito está...»


Ela está tomar o pequeno-almoço a ver as notícias que lhe seleccionaram dentro do telemóvel.

Quando disse, «isto está ficar bonito está...», não falou apenas para mim, mas para todos os que a quiseram ouvir.

Depois descobriu que afinal aquele caso de violência era antigo, já tinha sido noticiado algum tempo antes. Não percebia porque estavam a voltar a dar aquela notícia...

Eu percebi mas fiquei ali no meu canto, em silêncio, a pensar até que ponto era real o aumento de violência no nosso país. Na minha experiência prática de andar por aqui e ali, notava mais a falta de respeito e a indiferença pelo próximo, que da violência em si. Mas eu não costumava caminhar por sítios problemáticos.

Mas claro que tinha aumentado, um pouco por todo o lado. Quanto mais não fosse pelo sentimento de impunidade que se sente ao ver e ler as notícias sobre os juízes e tribunais, onde se fica com a sensação de quase toda a gente sai em liberdade, com termo de identidade e residência. O pior é sentirmos que não é uma "justiça cega", tem alvos preferidos dentro de algumas minorias. Mas o mais grave é uma coisa que ainda não percebi muito bem o que é, que tem laivos de marialvismo e até de machismo: o deixar em liberdade, vezes de mais, os cobardes que perseguem, agridem as mulheres que fingem ser das suas vidas. Mulheres, que em alguns casos acabam mesmo por matar, devido à complacência desta justiça, que não deixa atrás das grades estes potenciais assassinos.

A minha dúvida era se o facto de termos uma televisão que se alimenta de "sangue", que transforma qualquer crime, pequeno ou grande numa telenovela, tinha, ou não, alguma influência no aumento da criminalidade no nosso país...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, fevereiro 02, 2023

Pode ser Feliz a "Boa Noite"...


Fico feliz por ter caído em desuso a mania de tornar femininos alguns nomes, notoriamente masculinos. Coitadas das Antónias. das Armindas, das Diamantinas, das Silvinas e das Serafinas, que só não morreram de tristeza com  estas preciosidades, porque preferiram ser "mindas", "vinas" ou "finas"...

Embora continue a haver alguma falta de imaginação na escolha de nomes de estabelecimentos comerciais, as coisas estão bem melhores, hoje que ontem.

Curiosamente o nome da casa de hóspedes que ilustra este texto, não é novo e é extremamente simples e feliz (para mim claro).

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, fevereiro 01, 2023

Voltar, ou Não, aos Lugares onde Fomos Felizes...


Há sítios que gostamos que não nos cansam, somos mesmo capazes de passar por lá quase todos os dias.

Depois há outros, que nos marcaram de tal forma, que temos medo de lá voltar... É como se tivéssemos medo de não encontrar as coisas que por lá deixámos, nos mesmos sítios.

Hoje voltei a um sítio onde fui feliz e não visitava há mais de quinze anos. De repente estava ali, mas era como se não estivesse. Parecia que estava a ver um filme onde só encontrava o agora, porque já havia poucos sinais do ontem...

Acabei por ficar a pensar que tal como há sítios que ficam quase intactos, se fingirmos não ver a sua decadência... Há outros que são completamente  virados de pernas para o ar, por aquela coisa que chamamos progresso...

(Fotografia de Luís Eme - Mar-Tejo)