quarta-feira, junho 24, 2015

Morar no Alentejo


«Morar no Alentejo é uma descoberta diária. Os silêncios são quase um disfarce, de um povo que gosta da tranquilidade e parece usar e abusar do bom senso, sem precisar de empurrões ou de cabeças emprestadas para fazer as suas escolhas no dia a dia.

Acho que já tenho um pouco de prenuncia. Quase sem me aperceber, tento falar como eles, com mais musicalidade e graça, porque quero ser um deles.

Sei que a miséria está a voltar, lentamente. As pessoas com mais idade, que cresceram com a companhia do pão amassado pelos primos do diabo, duro e escuro, apesar de já estarem meio dobradas pelo peso da idade, levantam a cabeça e dizem-se preparadas para voltar a dar o peito às balas, para o que der e vier.

Na agora minha casa, erguida pelo avô, há muitas marcas, quase todas familiares. Na rua nem por isso. Mas há algo que me junta, mesmo a desconhecidos.

Entro na taberna e apetece-me pagar copos de vinho tinto a todos aqueles homens com cara de velho e fazer um brinde à fraternidade. Nunca os vi, mais gordos ou mais magros, mas reconheço-os do mundo e também de alguns livros do Manuel da Fonseca.»

A fotografia é de Artur Pastor.

6 comentários:

  1. Luís faço consigo um brinde à fraternidade...
    Um abraço.

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    1. Que seja, Graça.

      A fraternidade é um dos gestos mais nobres dos seres humanos.

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  2. A fraternidade independe do conhecimento de cada ser. "Cabeças emprestadas" !
    Como têm feito mal aos povos!

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