quinta-feira, setembro 20, 2007

O Meu Livro da Primeira Classe


No início do ano lectivo fico atento à algazarra que se ouve na proximidade das escolas para conferir se ainda é o mesmo que se ouvia na minha aldeia, quando havia crianças e a escola abria, pontualmente, todos os anos.
Os livros e o material escolar eram então mais escassos, o que me leva a cobiçar as volumosas mochilas, recheadas de livros, de cadernos e de auxiliares pedagógicos que também dei às minhas filhas e que agora vou espreitando nas prateleiras das lojas, com enorme vontade de comprar.
No meu tempo, havia o livro único para cada uma das classes obrigatórias e, para além do livro, tínhamos uma lousa, um ponteiro, um giz, uma pena, um lápis, às vezes meia dúzia de cores, um caderno de linhas, que na primeira classe era de duas, para que as letras saíssem alinhadas e da mesma altura. E uma sacola modesta de serapilheira que transportávamos a tiracolo para ficarmos com as duas mãos livres para correr, para brincar, para lutar. Tudo com parcimónia como era norma, nesse tempo do livro único!
Desde então, guardei na memória o meu Livro da Primeira Classe e procurei-o durante anos, para lhe voltar a encontrar o cheiro, as cores, o tamanho e o toque.
Encontrei-o, finalmente, não uma reprodução qualquer, mas o próprio, o verdadeiro, ele mesmo, já usado, com algumas folhas soltas, mas completo. Nunca mais o vou perder!
Tinham passado mais de cinquenta anos, mas o cheiro ainda lá estava, as figuras de cada página eram-me familiares e ainda sabia de cor grande parte das lições.
Desde então guardo-o com usura e desfolho-o de longe em longe com todo o cuidado, não vá ele desfazer-se, e quem quiser tê-lo nas mãos tem que me dar garantias de que sabe manusear livros preciosos, ou que está disposto a aprender.
Por estes dias voltarei a abrir o meu livro da primeira classe, com a algazarra de crianças em fundo, e não deixarei de conferir se alguma das primeiras letras se apagou ou se alguma figura se escondeu, sem me dizerem nada.

Joaquim Nascimento

12 comentários:

  1. O meu também foi este, só que tive de comprar uma reprodução porque o verdadeiro perdeu-se em sótãos que desapareceram!
    Um abraço pela lembrança...

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  2. Senti-me novamente na escola a aprender o abc e a tabuada. Também usei este livro, claro. Mas o meu desapareceu para sempre. Ele e a menina que eu era...
    Um abraço.

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  3. Ai as recordações...

    Beijitos

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  4. A capa do meu livro era diferente e já tinha remetido para o seu interior a saudação fascista dos meninos da mocidade.
    A edição que tenho e que me avivou a memória é a 8.ª, de 1954.
    Obrigado
    Joaquim Nascimento

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  5. Agora que li o comentário do Joaquim é que me lembrei que o meu não era bem assim...era como o dele - com a tal saudação no seu interior!

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  6. Eu adorava esta época, do recomeço das aulas, com os livros novos, reencontro com colegas e tantas novidades :)

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  7. Talvez acima de tudo, tenhamos saudades do que não sabíamos. Os momentos em que percebemos que depois de uma letra há outra, e a outra se segue outra, e se for outra ainda, tudo muda. E os silêncios de descanso entre palavras, e o dedo que as acompanha uma a uma... Todo um novo mundo se revelava, e revela ainda. Descobrir que, com palavras que se escrevem, podemos chegar aos outros e mais próximo de nós.

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  8. A capa do meu livro ainda era mais diferente... não me recordo de qualquer saudação nazista...

    Entrei para a primária em 1969...

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  9. Na verdade, o meu primeiro livro, pelo qual aprendi a ler, foi a Cartilha Maternal de João de Deus, por onde o meu pai me ensinou a juntar as primeiras letras, tinha eu 5 anos.
    Quando entrei na primeira classe já as coisas estavam muito facilitadas...
    Talvez por isso, não fiquei com uma recordação especial por este que, se não estou errada, foi mesmo o meu primeiro livro "oficial"...

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  10. Que bom recordar as relíquias do passado,dos tempos saudáveis da escola,hoje a inovação perdura.
    Bok início de semana
    Bjs Zita

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  11. No meu blogue, Santa Nostalgia, falo desse e de outros livros escolares antigos.
    Quanto a este livro em particular, que também possuo, ele existe numa outra edição, em tudo igual mas com uma capa diferente, daí a confusão entre alguns visitantes que comentaram.

    Bom trabalho!

    www.santa-nostalgia.blogspot.com

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  12. Tenho saudades de ler minhas licoes temporanias da epoca como:A bochechuda de barro,Clarinda e as pombas,etc se pude-se as ler eu, o faria .meus livros escolares talvez tive-sem capas diferentes porque entrei para a escola em Outubro 1947,realmente tenho saudades dos nossos tempos de mocidade.

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