[...] Noé e o resto dos animais assistiam mudos àquele duelo entre Vicente e Deus [...]. A significação da vida ligara-se indissoluvelmente ao acto de insubordinação. Porque ninguém mais dentro da Arca se sentia vivo. Sangue, respiração, seiva da seiva, era aquele corvo negro, molhado da cabeça aos pés, que, calma e obstinadamente, pousado na derradeira possibilidade de sobrevivência natural, desafiava a omnipotência.
Três vezes uma onda alta num arranco de fim, lambeu as garras do corvo, mas três vezes recuou. A cada vaga, o coração frágil da Arca, dependente do coração resoluto de Vicente, estremeceu de terror. A morte temia a morte.
Mas em breve se tornou evidente que o senhor ia ceder. Que nada podia contra àquela vontade inabalável de ser livre.
Que, para salvar a sua própria obra, fechava, melancolicamente as comportas do céu.
Final do último conto do livro, “Bichos”, uma obra fascinante, pela sua simplicidade e pelas várias mensagens que nos são oferecidas, pela sapiência dos animais de Miguel Torga, ao longo dos catorze contos...
Três vezes uma onda alta num arranco de fim, lambeu as garras do corvo, mas três vezes recuou. A cada vaga, o coração frágil da Arca, dependente do coração resoluto de Vicente, estremeceu de terror. A morte temia a morte.
Mas em breve se tornou evidente que o senhor ia ceder. Que nada podia contra àquela vontade inabalável de ser livre.
Que, para salvar a sua própria obra, fechava, melancolicamente as comportas do céu.
Final do último conto do livro, “Bichos”, uma obra fascinante, pela sua simplicidade e pelas várias mensagens que nos são oferecidas, pela sapiência dos animais de Miguel Torga, ao longo dos catorze contos...
E Ladino, o pardal?
ResponderEliminarE Miura, o touro?
E todos os outros?...
Tão humanos...
Um contista como poucos, Miguel Torga!
Nem vale a penas acrescentar mais nada, as palavras hoje e amanhão são todas de Miguel Torga...
ResponderEliminarBeijinhos
Os Bichos são dos melhores contos que eu já li.
ResponderEliminarTenho uma 2ª edição!
É um livro único.
ResponderEliminarO corvo Vicente. Como não cederia o criador perante tamanho sentido de liberdade? Os Bichos são uma pequena obra-prima de Torga. Um abraço Luis.
ResponderEliminarSão todos muito humanos e têm tantas coisas para nos contar, Rosa...
ResponderEliminarMesmo correndo o risco da "repetição", só se comemora o centenário uma vez, Maria...
ResponderEliminarE Torga merece todas as homenagens, porque além de toda a sua qualidade literária, nunca andou por aqui em bicos de pés...
São muito bons, Vieira Calado.
ResponderEliminarÉ único, de facto, Maria.
ResponderEliminarO Corvo Vicente, é de facto único, Graça...
ResponderEliminarSinto-me tão Vicente, às vezes...
ResponderEliminarTambém eu...
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