segunda-feira, maio 30, 2016

A Memória Sempre que Pode Escolhe as Nossas Melhores Histórias

Ontem, quando a Rita perguntou se me lembrava da primeira vez que nos vimos, disse-lhe que sim. Claro que não sabia exactamente o dia, mas lembrava-me mais ou menos do mês e do momento em que aconteceu. 

Conhecemos-nos na apresentação dos concertos do Rui Veloso no Coliseu à comunicação social, do tempo dos "Mingus e Samurais", em 1990, ou seja há mais de vinte cinco anos.

Até lhe consegui dizer que tinha sido numa das salas do  Hotel Sheraton. Ela estava lá ao serviço da televisão e ao ver-me chegar meio perdido, levou-me até à sala. Como o Rui nunca mais aparecia (estas coisas são sempre assim...), acabámos por ficar por ali a falar e a conhecermos-nos melhor. Porque felizmente sempre houve mulheres bonitas, simples e simpáticas.

E depois os anos foram passando, sem nunca perdermos o rasto um do outro. Casámos, tivemos filhos, mudámos de trabalho. Mas houve qualquer coisa que ficou... Talvez sejamos mesmo diferentes, como tu gostas de dizer.

Falámos do outro jornalismo, que tem pouco que ver com a meia dúzia de pomposos deste tempo, que se acham quase actores de cinema. A rivalidade que existia na época acabava por servir de piada nas conversas. Era comum apanharmos boleias uns com os outros, de táxi ou em carros próprios, mesmo sem nos conhecermos bem. E depois quando a malta era porreira acabava por ficar uma simpatia e uma camaradagem, alimentada com os dedos de conversa que se trocavam entre um prego, uma bifana (ainda não era moda...), uma imperial ou um simples café.

Trocávamos cartões (ou apenas um papel com o nome e o número de telefone, os telemóveis ainda só deviam existir no Japão...) e quando era preciso fazíamos ou recebíamos o telefonema da ordem, para dar ou pedir qualquer informação. Nesses tempos ainda não existiam as televisões privadas nem o jornalismo do "salve-se quem puder" e do "vale tudo, até tirar olhos".

Acabámos por concordar que foram elas que alteraram completamente o nosso pequeno mundo do jornalismo. Fabricaram demasiadas vedetas com palmo e meio da cara, ao mesmo tempo que iam destruindo a parte "romântica" da profissão... 

Talvez as coisas não fossem assim tão boas como as pintámos ontem, mas a nossa memória além de ser bastante selectiva, também gosta de escolher as melhores histórias...

(Óleo de Vittório Matteo Corcos)

8 comentários:

  1. ~~~
    Uma maneira muito interessante de avaliar a atividade
    jornalística, no último quarto de século.

    Estou completamente de acordo consigo no que concerne
    à degradação dos valores éticos, não só no jornalismo,
    como em toda a comunicação social.

    Uma semana agradável e muito feliz.
    ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

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    1. É verdade, Majo.

      Parece que é normal valer tudo...

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  2. Luís, de facto é como dizes no título.
    Esta minha afirmação é baseada na explicação que há uns tempos um psiquiatra me deu acerca dos mecanismos de funcionamento da memória. Mesmo nos casos dos embates mais duros da vida, passado o estado de choque, o regular é que o bom se sobreponha ao adverso.
    A lei da sobrevivência não passa só pela barriga.
    E esta é uma das facetas extraordinárias do ser humano, ao ponto de ser capaz de erguer flores das cinzas.

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    1. Faz-nos sempre melhor ao ego, Isabel.

      Gostamos mais de sorrir que de chorar (as excepções existentes só servem para confirmar).

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  3. e como é bom ter essa memória.
    belo texto!
    boa semana.
    beijo
    :)

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    1. Não me queixo da memória, Piedade, que é bastante exercitada. :)

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  4. É, Luís, a nossa memória não gosta de recordar coisas más. Talvez por isso anda por aí tanta gente que já não se lembra do 24 de Abril.
    Abraço

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