sexta-feira, março 22, 2024

Confusões (cada vez mais evidentes) sobre que é da esfera privada e da esfera pública...


Reparo que temos cada vez menos pudor a falar de alguns actos, que até aqui eram pessoais (e até privados), ao mesmo tempo que apontamos o dedo aos outros com mais facilidade, por coisas que ninguém tem nada com isso, por fazerem parte da nossa liberdade individual.

É desta forma que entendo o que o meu vizinho do rés de chão me disse (sem que eu lhe perguntasse...) que tinha votado no Chega. Disse-o com um sorriso provocatório. Apenas exclamei quase em jeito de interrogação: "Sério?!"

Continuou a sorrir. Percebi que sim. Dissemos mais duas ou três palavras de circunstância e depois cada um de nós foi à sua vidinha.

Fiquei a pensar no episódio. Ele disse-me algo que nunca me dissera. Algo que eu nunca lhe perguntaria. E somos vizinhos há mais de trinta anos. Embora eu também possa dizer em que partido votei, mas nunca o farei com um sorriso provocatório, nem sem que me perguntem. Mas, claro que nunca o direi a toda a gente.

O que para mim é claro, é que hoje se respeita menos a individualidade de cada um de nós (também por culpa própria, parece que não conseguimos, ou não queremos perceber, o que é da esfera privada e o que é da esfera pública...). 

Ou seja, temos menos de liberdade de sermos, falarmos e até de pensarmos o que queremos, muitas vezes por vontade própria.

E isto é agravado por uma vontade de querer "castrar" os outros - mesmo sem se recorrer a químicos -, quando sabem que pensam de forma diferente. 

E isso é cada vez mais perigoso para a democracia.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


2 comentários:

  1. Parafraseando José Régio, há coisas que tenho pudor de contar seja a quem for!
    Dizer em quem votei não faz parte dessa lista!

    Abraço

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    1. O "votar" foi o pretexto para falar desta coisa que mina a vida em sociedade, roubando-nos a liberdade e a intimidade, Rosa...

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