Continuo a pensar que a leitura é fundamental para a compreensão do mundo que nos rodeia.
Não vou ser "fundamentalista" e dizer que o facto de se lerem coisas menos profundas na actualidade leva a que se esteja menos aberto ao conhecimento. Até porque os números não enganam, anda-se mais tempo na escola e por muito que se passeiam os livros, alguma coisa fica dentro de nós...
Os problemas da nossa sociedade estão longe de ser dos jovens (não é por acaso que são quase os únicos que protestam contra o que não se faz para combater as alterações climáticas ou contra o genocídio de Gaza).
Num contacto familiar recente (com a parte mais afastada, a paterna...), achei curioso o facto de quase todos os meus tios e parentes mais afastados, com idades entre os 70 e os 80 anos, terem nas suas mãos um smartphone, que agora os ligava ao mundo, a todas as horas e minutos.
Sabia que a maior parte deles estudou apenas até à quarta-classe e nunca lera um único livro sem imagens (nem mesmo um dos meus...). E os únicos jornais que liam eram os desportivos, às segundas-feiras... Ou seja, nunca tiveram acesso a tanta informação como nos nossos dias. Informação que raramente questionam. Subentendi que uma boa parte deles - pelas conversas que circularam sobre o nosso país e os políticos -, eram potenciais votantes no Chega. Limitei-me a ouvi-los, sem ter a tentação de os "levar à razão" (as patetices eram quase uma banalidade...). Preferi ouvir e fazer as minhas constatações sociológicas.
Quando tive oportunidade falei com a minha mãe sobre este encontro (continua leitora, apesar dos seus oitenta e muitos...) e estivemos de acordo sobre as "lacunas culturais" destes familiares. Acabámos por ir mais longe, até por sabermos que este era um "mal geral" da população portuguesa, com mais de sessenta anos. Algo que ainda se nota mais nas pessoas que sempre viveram em meios pequenos.
Como nunca aprenderam a "ler com olhos de ver" a realidade, muito menos a fazer as suas próprias análises críticas (sem auxiliares de memória), hoje ao lerem as notícias (bem "mastigadinhas"...) que fazem o favor de lhes enviar para os seus smartphones, sentem-se "homens novos", capazes de discutir, sobre tudo e mais alguma coisa.
Noto que existe alguma inocência, misturada com "chica-espertice", na sua quase "fé", de que todas as notícias que lhes enviam "são verdadeiras"...
(Fotografia de Luís Eme - Barreiro)