A vida de Diego Maradona deu (e continuará a dar...) livros, filmes, músicas, porque ele foi realmente único, no universo futebolístico.
Se houve alguém que usou e abusou do talento como artista na arte de jogar à bola, foi Diego, a maior de todas as "metáforas" humanas. Sim, foi ele quem mais nos mostrou o quanto podemos ser falíveis, mesmo quando colocamos um pé no território dos deuses...
Fico mesmo com a sensação que nunca colocou bem os dois pés no chão, caminhou sempre alguns centímetros acima da linha do horizonte. Provavelmente foi por isso que nunca teve qualquer problema em vestir a pele de "deus". Talvez nunca tenha sido levado a sério. E foi também por isso que quase tudo lhe foi permitido, dentro e fora dos estádios.
Não há biografia que esqueça a sua famosa "mão de deus", que valeu um Campeonato do Mundo à Argentina e que explica muito do seu talento de expoente máximo do chamado "futebol de rua", onde se exige, além do talento natural, muita matreirice, pois normalmente joga-se sem árbitros, deixando-nos entregues a nós próprios. Maradona dentro de campo queria ser o melhor, mas também queria ganhar. Isso explica que ele executasse também com talento alguns números do "teatro do engano", algo que continua a fazer parte do futebol (pelo menos para a maior parte dos futebolistas...). Bastava apanhar o árbitro de costas e os fiscais de linha hipnotizados pela bola, para misturar a "arte de ludibriar" à "arte de bem jogar".
Também não será ignorada a "viagem ilusória", que só agora terá tido um final, e que lhe foi esburacando todos os sonhos... Será uma "viagem" com mais versões e personagens, que o jogo onde ele foi "Rei". Uns chamar-lhe-ão "inferno", outros "mundo paralelo". E é um pouco das duas coisas, é um "mundo" onde se vendem ilusões a troco de dólares, povoado com mulheres boas, drogas fortes, carros velozes, festas loucas, e sobretudo, muitos falsos amigos. "Mundo" que começa naquilo que se chama a extensão do futebol: as bancadas onde moram as claques com os adeptos mais furiosos e doentios e os parques de estacionamento, guardados por "belezas" que querem sempre mais que um autógrafo.
"Mundo" onde é tão fácil entrar (os convites são aos milhares e têm sempre "à porta" grandes decotes e saias quase sem tecido...). O difícil é depois encontrar a porta de saída... E a sensação que tenho, é que Maradona nunca quis descobrir onde ficava a tal passagem para o "mundo dos outros"...
Sei que Diego não partiu cedo demais. Partiu ainda a tempo de ser recordado, para todo o sempre, como um "Deus do Futebol", mesmo que seja um "deus" demasiado humano...
(Fotografia de Luís Eme - Sesimbra)