segunda-feira, julho 14, 2025

«Estamos todos a ficar sem "travões". O normal é dizerem-se coisas cada vez mais parvas e ofensivas uns aos outros.»


O Carlos continua a "incendiar" a nossa mesa com frases, que, começam por se estranhar, para depois se entranharem, e serem aceites por todos nós, mesmo que isso aconteça duas ou três voltas depois.

Quando ele disse: «Estamos todos a ficar sem travões. O normal é dizerem-se coisas cada vez mais parvas e ofensivas uns aos outros», ficámos a olhar uns para os outros.

Houve alguém que falou de sermos menos hipócritas. Claro que é mentira. Esta sociedade onde o mérito fica vezes demais a porta, convive bem com a hipocrísia, o fingimento e o "lambe-botismo".

Foi a Carla que disse que era algo mais profundo, que tinha a ver com os valores que recebíamos em casa, onde se aprendia a respeitar e a tolerar o outro, mesmo quando nos apetecia mandá-lo para aquela parte.

Se em casa, na escola, no trabalho ou no café, quem fala mais alto é que acha que está certo, com a conivência de quem lhe devia chamar a atenção, e dizer que conversar é outra coisa, que o monólogo não faz parte da família do diálogo.

 «E nós, vamos começar a falar mais baixinho?», soltou em tom provocador, o Carlos.

A gargalhada geral respondeu pela mesa. Precisamos todos de colocar "pastilhas" nos travões...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, julho 13, 2025

A vida tal como ela é


Quando escrevemos sobre pessoas mais próximas de nós (se existirem ligações familiares ainda se torna mais estranho...), em parte, sentimos que a história está ser reescrita de novo.

Isso acontece com alguma naturalidade. Além de não termos vividos todos os acontecimentos (é impossível estarmos em todo o lado...), também descobrimos, através das conversas que vamos mantendo aqui e ali, que não conhecemos assim tão bem a vida de algumas pessoas, mesmo as que nos são queridas. 

O curioso, é que tenho ficado, quase sempre, surpreendido de uma forma positiva.

(Fotografia de Luís Eme - Caldas da Rainha)


sábado, julho 12, 2025

Há mudanças de ciclo que não têm de passar pela mudança de treinadores


A selecção feminina de futebol com alguma sorte (às vezes, muita...), foi ultrapassando metas, cedo demais, ao ponto de algumas pessoas já pensarem que estavam quase ao lado das melhores equipas do mundo, e que dentro de pouco tempo, até poderíamos disputar títulos.

Só que os "quase milagres", são sempre enganadores... 

Basta olhar para o panorama futebolístico nacional, onde o futebol feminino, ainda esta longe de ser uma realidade de Norte a Sul, com um campo de recrutamento demasiado escasso a nível clubístico e associativo. 

A aposta da Federação no futebol feminino, com um profissionalismo digno de destaque, próximo das melhores selecções, acabou por dar uma perspectiva errada do futebol feminino no nosso país.

E tudo isto graças a Mónica Jorge e à equipa técnica comandada por Francisco Neto.

Agora o normal é começar-se a falar do fim de ciclo (como já se fez com a selecção masculina de sub 21 de Rui Jorge). E já devem existir vários técnicos "gulosos" preparados para o "render da guarda" do Francisco...

Mas olhando para todo o percurso destas duas selecções, onde a imagem que ficou, foi da existência de equipas técnicas de grande qualidade, técnica e humana, o normal (isto, se fossemos um país normal....) seria que fossem Francisco Neto e Rui Jorge a decidir o seu futuro e não terceiros, como acontece no futebol. Futebol que faz gala em ser "traiçoeiro" e "ingrato" (tal como as dezenas de jornalistas e comentadores deste tempo, com lata para dizer uma coisa hoje e o seu contrário amanhã...).

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, julho 11, 2025

O Zé Povinho, as Caldas e o Grande Rafael


Não é habitual falar de duas exposições em dois dias, mas como passei pelas Caldas da Rainha, aproveitei para ver a mostra artística e histórica que está patente ao público no CCC, "Zé Povinho, uma História com 150 Anos", com curadoria de Jorge Silva.

Gostei muito do que vi. Já sabia que o Zé Povinho era a figura mais caricaturada no nosso país, ao longo do tempo, mas não imaginava que até tinha sido capa de revistas como a "Gaiola Aberta" ou o "Riso Mundial".

Tudo isto graças ao grande Rafael Bordalo Pinheiro, que, além de ser o pai de muitas coisas no nosso país, inclusive da Banda Desenhada, escolheu as Caldas para começar a trabalhar na indústria da cerâmica. O Artista acabou por oferecer um novo cunho artístico às faianças da ainda Vila, ao mesmo tempo que dava uma nova vida ao Zé, oferecendo-lhe a tridimensionalidade que não possuía.

(Fotografia de Luís Eme - Caldas da Rainha)


quinta-feira, julho 10, 2025

"Munngano (1975-2025)" na Sociedade Nacional de Belas Artes


Marcámos encontro na Sociedade Nacional de Belas Artes, para ver a exposição "Munngano (1975-2025), 50 anos de história, arte e cultura de Moçambique Independente".

Não foi só uma bela surpresa (tanta coisa bonita...), descobrir tantos artistas moçambicanos de grande talento, foi bom olhar e conversar sobre muitas das pinturas, desenhos e esculturas em exposição.


E claro, ir ainda mais longe, falar ligeiramente das polémicas sobre o colonialismo e a arte africana (não tivemos dúvidas que todos os trabalhos artísticos feitos por moçambicanos, com um matriz cultural local, deverão regressar ao país de origem, desde que este tenha condições para a acolher em museus).

Como normalmente visito exposições a solo, já não me lembrava do bom que é ter companhia para conversar, criticar e sorrir...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, julho 09, 2025

O tempo em que ninguém "cora de vergonha"


Achei no mínimo curiosa a afirmação de Hugo Soares, de que o PS devia "corar de vergonha" em relação ao INEM e aos problemas do SNS no país. Nunca percebi porque razão os socialistas não respondem a estas provocações rasteiras, históricas. Mesmo não sendo eleitor do PS, faz-me muita confusão esta maneira "soft" de fazer oposição. Gostaria era de ver esta ministra e este Governo a terem de enfrentar uma pandemia. De certeza que seria o caos em todos os hospitais e centros de saúde, de Norte a Sul...

Mas o mundo esta ainda mais confuso e estranho que o nosso país. Sei que a proposta de Benjamin Netanyahu para a atribuição do Prémio Nobel da Paz a Donald Trump, é quase uma piada de mau gosto, e que vale o que vale, ainda por cima feita por um genocida. Já todos percebemos, que tanto um como o outro, dificilmente coram de vergonha. O curioso é saber se esta proposta merece sequer a ponderação dos suecos. Estamos a falar do cúmplice de toda a tragédia de Gaza, do autor de um dos ataques ao Irão e do responsável pela perseguição a praticamente todos os emigrantes dos EUA. Tudo coisas pacifistas...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, julho 08, 2025

Saúde: demagogia e desperdício a mais e competência a menos


A saúde e a justiça retratam de uma forma, cada vez mais nítida, a acção demagógica e incompetente dos partidos de poder e dos políticos, nestas duas áreas fundamentais da nossa sociedade, pelo menos nos últimos trinta anos.

Embora possa ser injusto atribuir todas as culpas à ministra em exercício, se o seu mandato fosse exercido com demagogia a menos e competência a mais, talvez as coisas não tivessem piorado tanto no último ano (embora o PSD insista no seu contrário...). A sua primeira preocupação foi "provocar" a demissão do director geral, Fernando Araújo, com quem tinha tido problemas anteriores enquanto administradora hospitalar, e não dialogar com ele e tentar aproveitar o que se estava a fazer de positivo no sector.

É por isso que, quando se diz que o seu papel enquanto ministra é "destruir o Serviço Nacional de Saúde e entregar de mão beijada os serviços mais lucrativos ao sector privado", poderá ser exagerado, mas... 

Mas a realidade é o que é, e os hospitais e clínicas dos dois principais grupos privados da saúde, continuam a crescer, de Norte a Sul. Ao mesmo tempo que os meios do SNS continuam a ser escassos, com muitas das nossas urgências a fecharem aos fins de semana, com o argumento da falta de médicos.

É muito estranho que este problema se tenha agravado nos últimos anos e que a própria profissão de médico, tenha passado, aparentemente, a ser um serviço público normal, como se fosse um simples trabalho "das nove às cinco"...

E se é verdade que nunca se gastou tanto dinheiro na saúde como na actualidade (sem que se nota qualquer melhoria nos serviços...), é óbvio que terá de existir muita incompetência e desperdício de meios, tanto no Ministério da Saúde como nas administrações hospitalares. Graças aos nossos dois maiores partidos...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, julho 07, 2025

«Já não posso ter a minha opinião?»


O meu corte de cabelo hoje foi um pouco mais agitado que o costume.

Assim que o meu barbeiro começou com o já habitual "discurso anti-emigrantes", comecei a desmontar uma boa parte das suas teses populistas com a realidade, com as aldeias e os campos que quase só albergam gente idosa, pelo que a mão de obra tem de ser obrigatoriamente estrangeira. Acrescentei que esta também era a escolha preferida dos exploradores da agricultura intensiva, porque assim têm sempre a possibilidade de ter metade dos seus trabalhadores em situação ilegal, o que lhes poupa uns cobres no pagamento para a segurança social e para as finanças.

Claro que ele não gostou de ser contrariado. Ninguém gosta. Foi por isso que se escudou na frase: «Já não posso ter a minha opinião?»

Claro que pode. Em democracia pode-se quase tudo, até navegar no erro e mostrar a nossa "costela revolucionária", quase a par com a nossa "costela reaccionária"...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


domingo, julho 06, 2025

Os comboios que só passam uma vez na nossa estação...


Conheço a Sandra há quase trinta anos. Falamos menos do que devíamos, em parte porque a minha companheira nunca lhe achou muita piada. E a maior parte das vezes que nos encontramos no café, que partilhamos ao fim de semana, estou acompanhado.

Às vezes somos surpreendidos pelo meio da semana que nos marca lugar na esplanada do nosso café e colocamos a conversa em dia.

Foi o que aconteceu na última vez que nos encontrámos. Estávamos os dois sozinhos e para não sermos egoístas, ocupámos a mesma mesa. Foi bom, falámos de tudo e mais alguma coisa, menos dos papeis secundários que ela passa a vida a fazer, tanto no teatro como nas telenovelas. Não é por falta de talento ou de graça, é porque "nunca calhou" e porque "agora começa a ser tarde".  Sim, a Sandra já está a aproximar-se dos cinquenta, uma idade terrível para as actrizes...

Às vezes penso na quantidade de gente com talento que conheço, que não conseguiu chegar à parte do céu onde poisam as estrelas. Como o Gui diz, muitas vezes, há comboios que só passam uma única vez na nossa estação...

Mas não é apenas isso...

Por uma questão de educação, personalidade, e sobretudo dignidade, não conseguimos "fazer tudo", muito menos irmos na conversa das pessoas que estão quase a "cobrar bilhetes", à entrada da "carruagem dos nossos sonhos". 

E o tal lugar estrelar, vai ficando, cada vez mais longe para a Sandra, como ficou para a Luísa ou para o João e para tantas outras pessoas, que passam o tempo a "lamber as feridas"...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, julho 05, 2025

As "duas vidas" do cinema português, uma para o povo e outra para intelectuais...


Desde que me interesso por cinema, que assisto a discussões intermináveis sobre as fitas portuguesas e os nossos realizadores.

O Mestre Manoel de Oliveira foi sempre uma das figuras mais contestadas, até pelos seus pares, porque a inveja sempre foi, e será, aquela coisa pequenina e quase "terrorista". Embora lhe reconheça alguma lentidão e fixação exagerada nos planos (o que para os seus admiradores mais pacientes é poesia...), ele sempre teve uma ideia  do que é cinema. Ou seja, o seu passado e presente, mereceram todo o apoio que teve, e não apenas para que Oliveira ficasse no "guiness" como o realizador com mais idade e experiência da Sétima Arte. Quem tem um mínimo de conhecimento do que é Arte, sabe que o Mestre Manoel foi um dos nossos melhores artistas.

O que normalmente se discute é o "cinema de autor" e o "filme comercial", como se estes fossem inimigos e não pudessem conviver uns com os outros. E como em tudo na vida, as posições de quem faz estes filmes, em vez de se irem aproximando, vão ficando cada vez mais distantes. O ideal era que não se fizesse cinema apenas para o nosso imaginário (umbigo talvez ficasse melhor...), nem se explorasse tanto o que existe de mais popularucho (a graçola manhosa a querer imitar os senhores Santana e Silva, mas muito longe da sua qualidade...). Ou seja, que se pensasse a sério nos espectadores. Mas o mundo é o que é...

Estou a escrever sobre cinema, porque há dois filmes portugueses em exibição que têm sido olhados de forma diferente pelos críticos. Falo de Portugueses de Vicente do Ó e de A Vida Luminosa de João Rosas. Se o primeiro tem sido "deitado abaixo", o segundo tem sido apreciado pela maioria das pessoas que escrevem nos jornais sobre cinema.

Embora compreenda a "defesa" do filme feita por Vicente (também nos jornais), não acho que ele ganhe alguma coisa em se preocupar mais com terceiros que em explicar as coisas menos compreensíveis do seu filme. 

E pelo que tenho lido, se há fita que seja capaz de me levar de regresso às salas, será A Vida Luminosa do João, porque se aproxima mais do que gosto de ver e sentir no cinema.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, julho 04, 2025

Pode-se saber muito sem abandonar o "planeta terra"...


Eu sabia que podia ser uma chatice sabermos muito sobre um assunto qualquer, podíamo-nos tornar condescendentes com os outros, mesmo sem nos apercebermos. E se tivéssemos os hábitos de "professor universitário" de raramente "descermos as escadas" ou "apanhar o elevador", para voltar à terra e falar com os comuns, ainda pior.

Felizmente, há mais mundo nas ruas e nos transportes que nos levam, aqui e ali. Pode ser uma sensação de liberdade, quase indescritível, abandonar os gabinetes e as conversas chatas com os "sabões" e ir ao mercado, comprar cebolas, carapaus, sentir que é possível aprender com aquela gente despachada, e tantas vezes desbocada, que começa a sua "luta diária" ainda antes do sol nascer e mesmo assim consegue sorrir à vida.

 Claro que isto são palavras de "um não especialista", que cada vez mais, passa a vida a olhar os outros, a sentir o mundo a mexer-se, a uma velocidade que já não consegue, nem quer acompanhar. Mas está longe de ser um desistente, continua a caminhar e a olhar com nitidez para o que se passa à sua volta.

É por isso que fico feliz, por alguém, como o meu irmão, com uma carreira no ensino, de mais de quatro décadas, a maior parte dela passada na universidade, nunca ter perdido o nome próprio e passado a ser o "doutor"...

Claro que sei que isso também se deve aos meus queridos pais, e numa percentagem menor, aos meus avós maternos, que sabiam tanto, mesmo sem terem tido a possibilidade de conhecer as escolas por dentro, na sua infância.

(Fotografia de Luís Eme - Minho)


quinta-feira, julho 03, 2025

Um dia, no mínimo, estúpido...


O país acordou com duas notícias, que foram exploradas ao máximo pelas televisões, de manhã à noite: a morte de Diogo Jota e o começo do julgamento de José Sócrates.

É sempre estranho e tocante, quando alguém morre jovem. E se esse alguém é um conhecido de todos nós, como é o caso de Diogo Jota, um dos nossos melhores avançados, presença habitual na selecção e atleta do Liverpool, o campeão inglês na época que acabou, tudo piora... O seu irmão André, ainda mais novo que ele e menos conhecido, acompanhou-o neste infortúnio, que teve lugar numa autoestrada espanhola, quando tentavam regressar a Inglaterra.

Tantas questões que ficam no ar, sem respostas. É sempre assim...

Em relação a Sócrates, que mais uma vez contribuiu para o espectáculo, falando aos jornalistas (com a "cassete" do costume...), antes e depois deste primeiro dia, só tenho quatro palavras para o catalogar: é um excelente actor (podia andar a fazer telenovelas e estupidamente foi para a política)!

A única coisa que sei, é que, aconteça o que acontecer, tanto Sócrates como a justiça (e até as televisões "justicialistas" dos directos no aeroporto e afins...) nunca mais conseguirão ficar "bem na fotografia". 

Sim, é impossível alguém sair-se bem num caso como este (por vezes fico com a sensação de que a justiça fez quase tudo ao contrário, acabando por beneficiar Sócrates...), que promete arrastar-se por mais alguns anos...

(Fotografia de Luís Eme - Oeste)