sexta-feira, março 24, 2023

Dois "Pedregulhos" no Charco...


Não deixa de ser curioso, que as duas instituições mais conservadoras e menos democráticas da sociedade portuguesa estejam, de alguma forma, a ser colocadas em causa pela forma como funcionam e como interpretam os acontecimentos.

Falo da Igreja Católica e das Forças Armadas (em particular a Armada, que até tem fama de ser o seu ramo "mais democrático"...) e da reacção aos casos de abusos sexuais e à recusa de 13 marinheiros em embarcaram num navio longe de estar operacional.

O advogado Garcia Pereira, na entrevista que deu hoje ao "DN", foi bastante pertinente na forma como abordou este último caso, assim como o funcionamento da justiça, em geral, no nosso país.

Embora saiba que é necessária a disciplina nas Forças Armadas, as coisas têm mesmo de mudar. De uma forma simplista, a mentira de um oficial continua a valer mais que a verdade de um sargento ou de uma praça. E isso não pode continuar, num Estado de direito.

E quando se fala em obediência, apesar do nosso hino nos convidar a "contra os canhões marchar", não se pode, nem deve, entender esta frase de uma forma literal. Não se pode obedecer "cegamente" a uma ordem. Se um comandante mandar que nos atiremos para um poço, profundo sem água, é evidente que temos todo o direito de a recusar, mesmo que depois possamos ser acusados de insubordinação...

É por isso que espero que estes "dois pedregulhos" atirados ao charco, ajudem estas duas instituições a aproximarem-se da sociedade e a funcionarem de uma forma mais democrática e respeitadora dos direitos humanos.

(Fotografia de Luís Eme - Fonte da Pipa)


quinta-feira, março 23, 2023

A Verdade que está Dentro do Olhar...


Passei por Lisboa e encontrei-me com um amigo das fotografias, com quem aprendo sempre qualquer coisa, nas nossas conversas animadas.

Desta vez até andámos pelo futuro. Como se tem inventado tanta coisa, ele falou-me de um daqueles inventos, que acabava com a dificuldade cada vez maior que existe em "roubar fotografias" aos rostos das pessoas com quem nos cruzamos.

Quando  ele me disse, «Sabes, gostava de ainda cá estar, quando alguém resolver inventar algo que torne possível que, apenas com o nosso olhar, sem o uso de qualquer máquina fotográfica, seja possível retratar uma pessoa ou um objecto, tornando-a muito mais próxima daquilo que realmente queremos transferir para o mundo das imagens», eu limitei-me a sorrir.

E depois contei-lhe que tinha encontrado no cacilheiro uma jovem extremamente bonita, muçulmana, que trazia a cabeça coberta, com uma espécie de lenço azul. Tive uma grande vontade de a fotografar, mas era impossível fazê-lo, sem que ela desse por isso. Mesmo que os meus olhos a tivessem "fotografado", mais que uma vez...

Voltámos a sorrir, até por sabermos que o futuro estava sempre pronto a surpreender-nos...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, março 22, 2023

Um Mundo Cheio de Pessoas Mal Agradecidas...


Se há coisa que evito, é ser mal agradecido. Não quer dizer que o consiga, sempre, mas pelo menos tento ter sempre a memória bem viva.

Faço-o porque uma das coisas que mais detesto são as pessoas que têm a memória muito curta e que se esquecem daqueles que os ajudam e lhe fazem bem.

Ouvir hoje o Cristiano Ronaldo, sempre que lhe foi possível, puxar este novo seleccionador para cima, ao mesmo tempo que tentava "beliscar" o trabalho de Fernando Santos, sem nunca se referir ao seu nome (na conferência de imprensa da selecção), mostra o seu carácter. 

Fico à espera da sua reacção, quando for para o banco. Porque, mesmo que jogue amanhã a titular, já quase toda a gente percebeu que ele não é o melhor avançado português. Pelo que, mais tarde ou mais cedo, sairá do onze da Selecção.

(Fotografia de Luís Eme - Algarve)


terça-feira, março 21, 2023

"Éramos uma Invenção tão Boa"


Éramos uma Invenção tão Boa
 
 
Eles amputaram
As tuas coxas das minhas ancas.
Tanto quanto sei
São todos cirurgiões. Todos eles.
 
Eles desmantelaram-nos
Um ao outro
Tanto quanto sei
São todos engenheiros. Todos eles.
 
Que pena. Éramos uma invenção
Tão boa e tão amável.
Um aeroplano feito de um homem e de uma mulher.
Com asas e tudo.
Pairávamos ligeiramente por cima da terra.
 
Até voávamos um pouco.
 
 
Yehuda Amichai

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, março 20, 2023

A "Prima Vera" Acabou de Chegar...


Durante anos e anos, o dia 21 de Março festejava o começo da Primavera, e também os dias da Árvore e da Poesia por esse Mundo fora.

Até que a ciência disse que afinal a Primavera chegava ligeiramente mais cedo, ainda a 20 de Março...

Felizmente a Primavera não floresce apenas os campos, que ficam mais bonitos e cheirosos. As ruas também ficam mais coloridas porque com o aumento da temperatura, as mulheres começam a tirar os vestidos dos armários e saem de casa, mais leves e floridas...

(Fotografia de Luís Eme - Constância)


domingo, março 19, 2023

Rui Nabeiro: o "Patrão com Memória"...


O empresário Rui Nabeiro deixou-nos hoje. Teve todos os motivos para partir, com um sorriso no rosto, pelo legado empresarial e humanista que deixa atrás de si.

Li no "Cais do Olhar" do Sammy, que tinha dito um dia: «Hei-de ser um rico diferente dos que há por aí.» 

E foi mesmo muito diferente. 

Foi um rico, um patrão, um empresário com memória. Nunca se esqueceu de onde veio, nem nunca foi ganancioso, ao ponto de querer "tudo para si", como é comum no mundo empresarial português.

É uma pena para todos nós que o seu exemplo humanista, não seja regra, em vez de excepção, neste mundo capitalista cada vez mais "selvagem". 

Portugal seria um país muito melhor para todos.


sábado, março 18, 2023

Não sei se foi o neo-realismo ou surrealismo, quem esteve de visita ao café...


Tenho alguns amigos que podiam ter escrito argumentos para filmes de realizadores como o Manoel de Oliveira, que fazem aquelas fitas que gostamos de chamar de "europeias".

Estarmos dentro ou perto dos sessenta também não deve ajudar nada, diga-se de passagem...

Se numa conversa começares a ouvir coisas mais ou menos estranhas, o melhor que tens a fazer é mudar de mesa, mudar de café e até fazer uma rifa com os teus amigos.

Não sei quem começou, nem porquê. Mas isso é o menos importante. Só sei que comecei a ouvir coisas como:

«A partir de certa altura, começamos a olhar mais para trás e a querer fazer o percurso inverso, é como se fugíssemos de alguma coisa...»

«Talvez saibamos que temos um "abismo" à nossa espera.»

«Sim. Talvez queiramos fugir do fim.» 

«É isso... Somos demasiado realistas e bem informados. Estamos fartos de saber que este país não é para ninguém, nem para velhos, nem para novos.»

«Tira daí o "ninguém". Se fores um velho inglês ou francês, este país assenta-te que nem uma luva. Até a velhota da mercearia aprende a falar estrangeiro, só para ter servir na palma da mão.»

Depois do diálogo entre o "Velho um" e o "Velho dois", entrou em cena o "Velho três":

«Quem diria, afinal não são só as clientes das cirurgias plásticas e dos "botoxes" desta vida, que não querem ser velhas...»

(esqueci-me de apontar a noss gargalhada geral, a pensar nas "lilis" deste mundo...)

(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


sexta-feira, março 17, 2023

«O mundo muda sempre mais depressa que nós.»


Não sei se é bem assim, como o Jorge disse, que «o mundo muda sempre mais depressa que nós.»

Depende sempre do "mundo" onde nós estamos, da nossa latitude e longitude...

De certeza que na maior parte dos países de África (e até em vários da América Latina...), as coisas mudam quase em câmara lenta, que as pessoas quando acordam para um novo dia, têm de enfrentar os mesmos problemas de sempre, pois a miséria, a repressão e a guerra continuam a ser as únicas coisas que costumam ter em abundância...

(Fotografia de Luís Eme - Vila Velha de Rodão)


quinta-feira, março 16, 2023

Uma Conversa com Cinema no meio da Vidinha...


Já há muito tempo que não falava de cinema. Do cinema a sério, das salas escuras e silenciosas (as memórias do Chico sobre o Cine-Incrível não contam...), com um ecrã gigante.

Além da andarmos à volta de algumas salas e de alguns filmes, também olhámos para dentro de nós como as nossas vidas mudam quando aparecem os filhos... Mudam mesmo, se não fingirmos que continuamos "pássaros livres", assim que anoitece, deixando-os entregues às mães e sogras, desejosas de viverem segundas maternidades...

Voltando ao cinema, nem foi precisar inventar justificações para as nossas faltas de comparência nas salas. Bastou focarmo-nos nas mudanças nos últimos vinte anos. Hoje parece que a acção é a única coisa que importa, usa-se e abusa-se das fitas "sobrenaturais", quase banda desenhada feita com seres humanos em vez de bonecos. Para tornar tudo ainda mais maluco, aumentaram o som das salas dos centros comerciais (praticamente as únicas existentes...), quase até ao ensurdecedor.

Estivemos os dois de acordo, não foi apenas uma coisa, que nos afastou do cinema. Nem mesmo as famosas pipocas. Até porque as últimas vezes que fui ao cinema, foi com os meus filhos e com pipocas.

Ambos sabemos que vida é feita de mudanças. E a partir de certa altura, parece que o que passou é melhor do que o que ainda está para vir. 

Foi mais ou menos esta a conclusão a que chegamos, pelo menos em relação ao cinema...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, março 15, 2023

Mais de Vinte Anos a "Mascarar a Realidade"...


O que aconteceu na Madeira, com uma embarcação da Marinha e com 13 marinheiros, que se recusaram a participar numa acção de vigilância, tem muito a ver com estes tempos, em que toda a gente parece ter vontade de "explodir".

Provavelmente os marinheiros irão ser castigados por insubordinação. Mas a partir de agora, vai ser muito mais difícil aos governos e ao almirantado continuarem a "mascarar a realidade". 

Porque, pior que o mau estado de uma boa parte dos navios de guerra da Marinha, é a falta de marinheiros. Cada vez se sente mais a falta de homens e mulheres nas unidades navais, colocando em risco as missões normais de defesa e fiscalização, num país com uma costa atlântica como a nossa...

E se a Saúde e a Educação podem  ver parte dos seus problemas resolvidos através das parcerias público-privadas (tão desejadas pela direita...), às Forças Armadas só resta o Estado. Esse mesmo, que se tornou perito em varrer os "problemas para debaixo do tapete"...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, março 14, 2023

«Por que é que estamos todos cada vez mais parvos?»


Dois homens começaram a discutir, por causa de um cão que em vez de falar como nós, ladrava... 

O homem de mais idade e dono do cão, acabou por virar as costas ao outro, que só parou de gritar, quando o senhor com mais juízo e vergonha já estava bem longe.

Foi por isso quase natural a pergunta do Carlos: «por que é que estamos todos cada vez mais parvos?»

Olhámos uns para os outros, surpreendidos pela velocidade de raciocínio do nosso  companheiro. Acabámos por sorrir, mesmo sabendo que o assunto era para tudo, menos para graças.

O Jorge foi o único que esboçou uma resposta, com outra pergunta: «querem ver que o "bicho", além de nos ter afectado as vias respiratórias, também nos afectou o cérebro?»

Quase que parecia uma conversa de malucos. Quase...

(Fotografia de Luís Eme - Cova da Piedade)


segunda-feira, março 13, 2023

"Dizer o que se quer", para depois se ouvir, o que "não se quer"...


É já antiga a má relação entre Nelson Évora e Pedro Pichardo.

Nelson nunca viu com bons olhos a chegada de Pedro a Portugal e ao Benfica (que ele abandonara, a troco de um melhor contrato por parte do Sporting...). Em pouco tempo passou de "número um" a "número dois" do triplo salto. Pedro além de ganhar mais títulos, ainda bateu os seus recordes com as cores do nosso País.

Com Nelson a caminho da "reforma", pensava que tudo isto já estava sanado. Mas não, passado todo este tempo, o atleta  voltou a colocar em causa a vinda do atleta cubano para o nosso país, assim como o processo da sua nacionalização e a própria Federação de Atletismo. 

E quando se "diz o que se quer", com o objectivo de colocar em causa o outro, pode acabar por se ouvir "o que não se quer"...

Foi o aconteceu ontem. Pedro finalmente respondeu à letra a Nelson (talvez tenha ido longe demais, mas limitou-se a responder a mais uma provocação).

O passado de Nelson Évora distancia-o daquilo que até se poderia chamar, "um português "bacteriologicamente puro" (este expressão é horrível, é quase "nazi"...), pois nasceu na Costa do Marfim e é de cor, e ainda bem. E por isso mesmo, torna ainda mais estranha, esta sua "não aceitação" de Pedro Pichardo como atleta português...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)