sábado, dezembro 30, 2023

Há coisas que fazemos, que não têm volta, são levadas, irremediavelmente, para o "mar"...


Recebi um telefonema há minutos, com os desejos de bom ano e com queixas da minha ausência, ao ponto de dizer que agora tudo é diferente para pior.

Não sou grande dançarino, ainda menos ao toque de violino. Fico sempre, parado, a ouvir...

A minha companheira que estava por perto e ouviu parte da conversa, falou de hipocrisia e de cinismo. Eu não consegui ver a questão dessa forma. Provavelmente isso acontece  por continuar a gostar desta amiga, e por perceber que somos todos diferentes e todos iguais. 

Não foi preciso dizer. Ela sabe que não vou voltar.

Sei que nem todos nascemos para fazer o papel de "heróis", em determinados lugares e momentos. Há sempre gente que tem dificuldade em dar o passo, que às vezes é preciso dar em frente, por feitio, por cobardia ou até por conveniência. O mundo é isso. Nós somos isso...

Deve ser por isso que sinto que há algum sentimento de culpa nas palavras que vêm do outro lado, por não ter tomado a posição mais justa e correcta, no momento certo. Mas o que passou passou, e mesmo que tenhamos a capacidade de perdoar, não esquecemos...

A vida é quase como um rio. Há coisas que fazemos, que não têm volta, são levadas, irremediavelmente, para o "mar"...

(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


quinta-feira, dezembro 28, 2023

"da suavidade dos dias de sal"



um quase poema, para um livro bonito de poesia...

tanto amor,
tantos amores!
Tudo isto dentro de um livro
que nem as páginas a preto e branco
conseguem esconder a beleza  única das cores...


(só mesmo tu, Isabel, é que consegues aproveitar de uma forma tão feliz, (d) a suavidade dos dias de sal...)


(Fotografia de Luís Eme - Almada)

quarta-feira, dezembro 27, 2023

Ainda não me considero um desistente...


Alguns anos passam por nós, de uma forma estranha, sem que seja possível concretizar alguns projectos que considerávamos importantes. Isto acontece por várias razões, que tanto podem depender de nós como de terceiros.

Posso dizer que o meu 2023 foi assim. Foi um ano demasiado "insonso", com muitas coisas adiadas e outras até abandonadas. Não foi nenhuma novidade descobrir que uma boa parte das pessoas que estão à frente das instituições, não percebem que as coisas não se fazem de um dia para o outro, que há projectos que precisam de maturação, precisam de respirar... e até de "falarem" connosco, para serem melhorados.

Sei que mudaram várias coisas, em relação a outros tempos. Encontram-se mais portas fechadas por essas culturas fora. Mas eu também sou diferente. Já não tenho a "vontade de fazer coisas", que tinha com trinta e quarenta anos. Às vezes penso que me faz falta a "teimosia" que tinha, que me levava a saltar, um a um, os obstáculos que me iam colocando à frente (obrigava alguns fulanos a desistirem de "boicotar" o nosso trabalho por cansaço...). Outras nem por isso. Até por saber que é um desperdício dar "pérolas a porcos".

Mas ainda não me considero um desistente. É também por isso que espero que o 2024 seja diferente. Acredito que será, até por algumas coisas já terem sido iniciadas e vão transitar de um ano para o outro.

 (Fotografia de Luís Eme - Caldas da Rainha)


domingo, dezembro 24, 2023

«E se for uma gaivota?»


«Vê lá se hoje não falas dos sem-abrigo. Sabes tão bem como eu, que eles nesta época, estão um bocadinho melhor que no ano inteiro, fazem parte das ceias de Natal que dão na televisão. São um bocado o presépio vivo daqueles que estão acima dos remediados.»

Antes que eu dissesse alguma coisa, insistiu em continuar a ser bom "conselheiro": «Coloca a fotografia de um gatinho, com um laçarote, com umas palavras bonitas. Tem mais a ver com o Natal.»

Quando nos servem ironia em doses capazes de alimentar um urso, não nos restam muitas palavras. Foi por isso que eu respondi: «E se for uma gaivota?»

Um pouco fora de propósito, deixo-vos votos de Boas Festas, com mais esperança que ironia para o ano, que já está ali mesmo à porta.

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


sexta-feira, dezembro 22, 2023

"Fingir" que não se vê o que está à frente dos nossos olhos, não nos vai levar a sítio nenhum...


Uma das situações que me faz mais confusão na nossa sociedade actual, não é  o aumento de gente a viver na rua em si, é perceber que é uma situação sem estudo e aparentemente sem solução, pelo menos no nosso País.

Digo isto porque uma boa parte dos novos sem-abrigo, são pessoas de outras nacionalidades. Uns vieram em busca de trabalho e têm dificuldade em consegui-lo. Outros são nómadas - chamar-lhes turistas é capaz de ser ofensivo -, andam de terra em terra, de país em país, com mochila e tenda às costas (é graças a eles que se vêm tantas tendas montadas um pouco por todo o lado na Capital...) e vivem ao "deus-dará". Nem todos tocam guitarra e cantam, ou seja, têm capacidade para fazer da rua um palco e deixar no chão uma boina para as moedas. Mas o instinto de sobrevivência faz com que depressa percebam quem são as instituições que fornecem refeições e onde passam.

Devemos ser o Pais mais aberto e mais acolhedor para esta gente marginal, porque o nosso habitual "deixa andar",  sem que se tome qualquer medida, nem se tenha bem a dimensão dos problemas, faz com que eles se sintam completamente à vontade.

Isso reflecte-se em outras situações. Não sabemos ao certo quando imigrantes temos em Portugal, sejam eles oriundos do Oriente ou da América do Sul. Quando de fala em meio milhão, deve-se multiplicar este número por três (foi uma fórmula que um amigo inspector do desaparecido SEF me ofereceu, e que por norma está certa...). Muito menos sabemos quem são estes novos "nómadas" (que não têm nada de digital...).

Não sou apoiante das medidas que foram tomadas pelos franceses, muito menos das ideias do Chega sobre quem vem de fora, mas sinto que temos de fazer alguma coisa. Até porque o número de portugueses que vivem com dificuldades já é bastante significativo.

A única certeza que tenho, é que "fingir" que não se vê o que está mesmo à frente dos nossos olhos, não nos vai levar a sítio nenhum...

(Fotografia de Luís Eme - a arte da Rosarlette na Cova da Piedade)


quarta-feira, dezembro 20, 2023

Quando ser bom não é suficiente...


É giro como a palavra "bom", pode ter significados, completamente diferentes. Sim, podes ser "bom" e não ser "boa pessoa" (é quase normal, porque quando és "bom" em qualquer coisa, não gostas muito de dar confiança ao "mundo", deve vir nos manuais de "ser vedeta"...).

Tudo isto porque fiz quase o papel de "psicanalista", com um pai que pensava que o filho ia ser o "novo ronaldo". Ficou muito desiludido por estar ligeiramente enganado. Não era daquelas pessoas que estava a pensar tornar-se milionário à custa do talento do filho, era apenas vítima da "cegueira de pai", que nos faz olhar para os nossos e ver os "melhores do mundo".  Quando desceu à terra, percebeu que estava a fazer mal ao filho e a ele próprio, por estar a obrigá-lo a ser uma coisa que não era...

Não falei muito, limitei-me quase a ouvir. Cada vez dou menos palpites em relação às vidas que nos rodeiam.

Acabámos por falar também da "sorte", da que cai do céu, mas também daquela que dá muito trabalho, que temos de correr atrás dela, porque às vezes só passa uma vez na nossa rua.

Também esta, nos diz que ser bom, não é suficiente...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, dezembro 19, 2023

Milhares de anos de história servem para muito pouco...


Milhares de anos de história, servem para muito pouco, quando procuramos diferenciar  as pessoas, os tempos e os lugares, pelo menos quando falamos de violência.

Encontramos em praticamente todos os continentes governantes que não aprenderam nada com a história. Continuam a fingir que não percebem que o fanatismo não se combate com fanatismo, e que o ódio por si só, a única coisa que consegue, é gerar ainda mais ódio.

Nem precisava que judeus como Hannah Arendt, Primo Levi ou Amos Oz, passassem por cá e dissessem o que pensam do homem que governa hoje Israel. 

É demasiado óbvio que se parece cada vez mais com Hitler e menos com o povo judeu...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


domingo, dezembro 17, 2023

Um Natal mais estranho que todos os outros...


Não me lembro de sentir o Natal tão estranho como neste nosso tempo.

Os miúdos cresceram e já não ligam muito a estas coisas...

Mas sei que não é isso. 

Cada vez suporto menos este mundo que nos rodeia, que é para tudo, menos para natais.

Incomoda-me cada vez mais a normalização do egoísmo, da mentira e do roubo da vida...

Deve ser também por isso, que não me apetece, quase nada, receber ou dar presentes. Prefiro ficar mais fora que dentro desta "febre consumista"...

Mas o que preferia mesmo, era que toda a hipocrisia deste tempo passasse depressa, mesmo percebendo que um dia não são dias, pelo menos para quem vive na rua, que tem a possibilidade de ter roupa lavada e comida quente, durante a época festiva. 

E até pode ser que um ou outro seja "sorteado", para passar a consoada com uma daquelas famílias ricas, que gostam de manter as tradições...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sábado, dezembro 16, 2023

Notícias e personagens do meu bairro...


Nunca sei bem o que se passa, ao certo, no meu bairro. Normalmente apanho as notícias a meio, já quase em deferido e também com os "aumentos do costume" (quem conta um conto acrescenta mesmo um ponto...).

O curioso é que há homens com alma de mulheres (e ainda bem, senão mais de metade das coisas que se passam, passavam-me ao lado...). Um deles é meu vizinho.

Uma tarde vi um carro de bombeiros parado numa das ruas que percorro diariamente. Estranhei aquilo, até por não ver qualquer sinal de incêndio ou de outro acidente qualquer. Só dois dias depois é que soube que estavam a pintar o prédio e que um dos moradores do rés de chão não deixou que entrassem no seu quintal para pintarem as paredes. Aquilo acabou por meter senhorio, polícia e bombeiros. Acabaram por arrombar a casa e descobriram que o homem era uma "acumulador" e que as divisões estavam cheias de "lixo".

Entretanto o senhor (com quem costumava trocar bom dia e boa tarde, quando ele estava à janela a fumar...) desapareceu dali e a casa ficou devoluta... Falta-me saber o que lhe aconteceu. Estou em falta, porque ainda não perguntei a nenhuma das pessoas bem informadas da minha rua, para onde o levaram.

Outra das "novas" passou-me completamente ao lado. Estava a falar no meio da rua com o meu vizinho, quando passou uma senhora por nós. Foi quando fiquei a saber que ela tinha corrido com o amante lá de casa, e que aquilo tinha metido polícia e tudo. Como ele não queria sair a bem, saiu a mal. A mulher chamou a polícia e ele teve mesmo de fazer as malas e pôr-se a milhas.

Perguntei-lhe como é que ele sabia todas aquelas coisas. Começou a sorrir e passou a "bola" a outra personagem cá do bairro, que diga-se de passagem, além de boa "fonte de informação" é um excelente contador de anedotas.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sexta-feira, dezembro 15, 2023

Nem tudo é mau na "nova" televisão...


Embora a programação televisiva deixe cada vez mais a desejar, especialmente nos canais generalistas, a possibilidade que o cabo nos dá de podermos andar para trás foi uma excelente invenção. Oferece-nos a "liberdade" de vermos o que nos apetecer.

Foi desta forma que me foi possível ver o documentário biográfico sobre Nuno Teotónio Pereira (que até é possível que tenha visto pela segunda vez...), transmitido na RTP2. Foi bom rever histórias, pessoas e lugares, que conheço ou conheci.

O curioso é que estes programas dão sempre a altas horas da madrugada. Talvez já estejam programados para serem vistos nos dias seguintes...

Mas são muito mais agradáveis de ver (para mim, claro...) que ter se seguir as "novelas" criadas semana sim, semana não - agora são sobre as duas gémeas brasileiras e cada canal oferece a sua versão... -, ou ver cenas de guerra, que ultrapassam tudo o que já se viu por esse mundo fora, com os assassínios diários protagonizados pelos israelitas.

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quinta-feira, dezembro 14, 2023

Pois é, somos mesmo um país do caraças...


Sei que não devia ser demasiado pessimista a falar deste nosso país, depois do que escrevi ontem (há sempre a possibilidade de ser eu a usar as lentes erradas...). Mas este nosso Portugal é cá uma coisa... 

Como dizia o Rui, somos um país do caraças (esta frase dá para tudo, para o bom e para o mau).

Sei que o meu olhar (e de uma boa parte dos meus amigos da Margem Sul), não é o olhar da maior parte dos portugueses, mesmo que as sondagens que surgem nas televisões e nos jornais se aproximem dele, em relação às próximas eleições legislativas. Sim, todos nós estamos cansados de um PS que fingia que fazia coisas, embora deixasse tudo na mesma. Mas temos ainda mais receio de um PSD, que assim que se apanha no poder, começa logo a privatizar o que resta das empresas públicas lucrativas. Mas o maior medo é que ele aproveite toda esta "balbúrdia na saúde", para entregar os hospitais aos amigos e "matar de morte matada" o SNS, uma das melhores coisas que nos trouxe Abril.

O mais estranho (ou talvez não...), é que de repente, até parece que António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa, não têm nada a ver com os últimos acontecimentos do país, tão poderosas são as "máquinas de lavar", mais branco, deste portugalinho...

Para terminar volto a transcrever alguém cuja lucidez chega a fazer doer: «A todas as horas e de todos os lados, só nos chegam motivos de desânimo e náusea. Mais roubalheiras, mais traficâncias, mais cobardias, mais degradações, na administração pública, nas profissões liberais, no comércio, na indústria, nas ciências, nas artes e na religião. De tal maneira, que, mesmo contra a vontade, é-se levado a concluir, tristemente, de que em vez de uma comunidade de esforços nobilantes, somos uma lamentável associação de indignidades.» 

Estas palavras foram escritas em Junho de 1970, por Miguel Torga, num dos seus diários, há mais de 53 anos...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, dezembro 13, 2023

O olhar de quem nos vê do lado de fora (que nem sempre usa as "lentes" certas)


De vez em quando aparecem por cá uns estrangeiros, que pensam que o seu olhar vê melhor, e mais longe, que o olhar dos portugueses.

Alguns até acertam, por terem o distanciamento que nós não temos.

Mas não é esse o caso do designer francês, Philippe Starck, que retrata o nosso País como "o único lugar do mundo onde ainda se partilham os valores humanos".

Percebe-se que este senhor não anda nas ruas, diariamente, e anonimamente. Deve viver num lugar paradisíaco, rodeado de aldeias, onde ainda existe essa tal autenticidade de que ele fala, e onde deve ser "venerado".

Eu gostava que ele estivesse certo, mas onde já vai, esse Portugal... 

Claro que temos essa coisa boa de "vivermos e deixarmos viver", sem andarmos a chatear o próximo. Mas daí a termos todas aquelas qualidades, em extinção... é muito abuso.

As suas palavras foram escolhidas para terminar o "É ou não é" (da RTP1) sobre a Cultura, que acabou há minutos, e se disseram coisas importantes, embora, como de costume, amanhã continue tudo igual...

(Fotografia de Luís Eme - Arealva)


segunda-feira, dezembro 11, 2023

Os Diários de Torga e a Blogosfera (sem esquecer o Mar da Nazaré)...


De longe a longe pego num dos diários do Miguel Torga, e é sempre uma delícia ler as palavras deste grande escritor, um dos melhores século XX.

Há poucos livros que nos possam oferecer um retrato tão fidedigno do nosso país, como estes diários que percorrem os anos do salazarismo e marcelismo e estão escritos sem ter qualquer parcimónia, com os ditadores e esse tempo com tantas tonalidades de cinzento.

Quem como eu escreve diariamente nos blogues, no fundo alimenta um "diário digital", onde também quase tudo nos é permitido (tal como acontecia com Torga, embora as suas palavras sejam mais espaçadas, pois cada diário percorre  no mínimo cinco, seis anos). Felizmente não temos censores nem polícias de estado em volta (os "polícias do gosto" de agora valem e incomodam muito pouco...).

E Torga é muito assertivo nas suas palavras. Muito antes do norte-americano Mcnamara ter descoberto as ondas gigantes da Nazaré, já ele escrevia no Sítio (em Agosto de 1969): «Quando quero ver o mar, venho aqui. Não é grandeza que se olhe do rés-de-chão.»

(Fotografia de Luís Eme - Costa de Caparica)


domingo, dezembro 10, 2023

Os governantes da "escola do facilitismo"...


O "caso das gémeas" fez com que se passasse ao lado do relatório PISA, que nos ofereceu um retrato do nosso ensino preocupanterealçando a forma como estamos a andar para trás, na matemática, no português e na maior parte das disciplinas.

As justificações para estes resultados baseiam-se numa "escola de facilitismo", realçando professores que não cumprem os programas e alunos que chegam aos últimos anos do secundário mal preparados (sem os conhecimentos necessários para passarem de ano...).

Embora não façam parte do relatório, devia-se falar também de outras coisas.

Sim, é impossível passar ao lado das péssimas condições de trabalho que foram oferecidas, a todos aqueles que queriam ser professores, nos últimos vinte anos, conseguindo afastar os melhores das escolas  (é sempre isto que acontece em todas as profissões, quem pode procura algo melhor...). Infelizmente os que ficaram, foram ficando cada vez mais desmotivados...

A responsabilidade maior para o que se passa na educação, é de quem esteve no poder oito anos e não conseguiu (ou não quis...) realizar nenhuma reforma para melhorar o dia a dia nas escolas, preferindo fingir que estava tudo bem...

Os sindicatos dos professores também têm a sua quota parte de responsabilidade, pois a sua grande preocupação nos últimos anos foi lutar pela recuperação dos anos de serviço perdidos e aumentos de salários e não pela melhoria da qualidade do ensino.

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sexta-feira, dezembro 08, 2023

As mesmas palavras tornam-se diferentes de um dia para o outro...


No meu caderno diário, onde anoto o quer apetece, sem pensar em significados e significandos, guardei uma frase (já quase com uma semana...) que o professor, Eduardo Baptista Correia, deixou presa na capa do "D. Notícias": «O civismo é a melhor forma de implementar a democracia.»

A frase é tão óbvia, que a tendência é passar-lhe por cima. Quando a li, ainda me apeteceu ir mais longe, porque acho que o civismo é a forma de implementar tudo, é mais uma das várias coisas que nos deviam distinguir dos animais.

Logo que li a frase - demasiado simplista -, juntei meia-dúzia de palavras, neste "caderno de tudo". Até fui capaz de escrever que se existisse civismo, resolvíamos problemas tão graves como as guerras da Ucrânia e em Gaza. 

No dia seguinte tive logo a sensação que estava enganado, porque o que não faltam por aí são "loucos civilizados", que nunca irão perceber o verdadeiro significado de civismo, que começa e acaba no respeito pelo outro, por inteiro...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quinta-feira, dezembro 07, 2023

Profissões que vão sendo engolidas por este tempo que promete "matar o papel" (e a boa informação)...


Faz-me bastante confusão assistir ao fim de profissões, de lojas de comércio, embora as entenda, porque a chamada "modernidade" as vai tornando cada vez mais obsoletas. Vão deixando de ter clientes e acabam por ter de fechar portas...

A minha relação com os livros e com os jornais faz com que tenha um olhar de maior proximidade com o princípio do fim das tipografias, e também sobre a transformação dos jornais em outras coisas, com redacções cada mais curtas, desvalorizando a importância da informação e da reportagem, até fecharem portas...

O que não deixa de ser curioso, é o papel dos políticos nacionais e locais, que preferem retirar "todos os tapetes" à comunicação social, a manter viva uma informação pluralista. Em vez de procurarem saber o que se poderá fazer para que as pessoas continuem a ser bem informadas sobre o que se passa no país e no mundo (com os verdadeiros factos e não com invenções e mentiras...), esfregam as mãos de felicidade. Sim, uma boa parte deles gosta pouco (ou nada mesmo...) do contraditório, detestam jornalistas metediços, capazes de  investigar os seus pequenos e grandes pecadilhos...

É neste panorama que chegámos ao dia, em que jornal mais importante do Norte do País (e praticamente único...) deixou de sair em papel.

Ia escrever que é estranho não ouvir uma palavra do presidente da Câmara do Porto sobre o princípio do fim do "Jornal de Notícias". Mas todos sabemos que não é. Será muito mais confortável para ele que não se investiguem "casos selminhos"...

É por isso que só posso estar solidário com todos os funcionários do "JN" (mesmo que isso não tenha grande importância para o caso), que estão em greve durante dois dias, em protesto contra mais um despedimento colectivo, que se avizinha...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, dezembro 06, 2023

Um exemplo de transparência e outro da falta dela...


Ontem a Comissão Técnica Independente apresentou aquela, que achou ser, a melhor localização para o futuro aeroporto. À partida pareceu ser uma escolha honesta e consensual, para a maior parte dos políticos, opinadores e técnicos (praticamente não existiram críticas...). Claro que não se estava à espera que as gentes de Santarém ficassem satisfeitas por a escolha ser Alcochete...

Desta vez parece que a Comissão Técnica foi mesmo independente e esclareceu todas as dúvidas (se é que elas existiam...) a quem assistiu ao vivo a esta apresentação. Posso mesmo acrescentar, que se tratou de um exemplo raro de transparência, no nosso País.

Num campo completamente oposto está o caso das "meninas gémeas". Não vou falar da questão médica nem do "milagre da nacionalidade" em 14 dias. Vou falar sim de toda a trapalhada que foi criada à sua volta. Da gente com grandes responsabilidades políticas, que em vez de falar verdade, resolveu dar a desculpa do costume: "já foi há quatro anos, não me lembro sequer de ouvir falar disso". Foi o que fizeram tanto o Presidente da República como a antiga Ministra da Saúde, acabando por ter de dar o dito pelo não dito (houve um momento em que Marcelo até ameaçou os jornalistas com os tribunais...), porque é impossível esquecer um caso destes, que envolve uma doença rara e um medicamento com o custo de quatro milhões...

Como escrevi no título, são dois bons exemplos da transparência, que devia existir em todos os investimentos públicos, e da falta dela, quando as pessoas pensam que estão "acima da lei", ou que os cargos que exercem lhes permitem passar pelos "intervalos da chuva"...

(Fotografia de Luís Eme - Sobreda)


terça-feira, dezembro 05, 2023

Conseguir ouvir vozes através das palavras...


Estava a ler a entrevista de António Pinho Vargas publicada no "D. Notícias" e enquanto ia "bebendo" as palavras do músico, conseguia "ouvir a sua voz", como se ele estivesse ali, ao pé de mim, a responder ao jornalista.

Isto acontece-me várias vezes, quando conheço a voz do entrevistado. E quando existe alguma intimidade entre nós, até percebo quando ele sorri ou faz uma cara séria enquanto está à conversa...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


domingo, dezembro 03, 2023

Expressões felizes para tudo e para todos...


Embora não saiba a origem da expressão que usa um copo com algum liquido, para caracterizar quase todas as coisas da vida, acredito que tenha aparecido na cabeça de algum O'Neill, capaz de juntar as palavras com grande felicidade e até algum humor, tanto na poesia como na publicidade. 

Não há qualquer dúvida que se trata de uma expressão feliz, capaz de equilibrar ou desequilibrar quase tudo o que nos rodeia. Até se pode ter dado o caso de ter nascido no meio de uma discussão, daquelas em que se anda à procura do "sexo dos anjos" . Sim, só dois teimosos, é que eram capazes de se travar de razões, tendo pela frente um "copo meio vazio e um copo meio cheio".

Sei apenas que a moda pegou, como tantas outras, e que é com a quantidade de bebida e com um copo que se define de uma forma simplista, se somos optimistas ou pessimistas.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sábado, dezembro 02, 2023

«Não. Não temos de ser cada vez mais pobres, para meia-dúzia de pessoas serem cada vez mais ricas.»


Enquanto escrevia o texto que publiquei ontem no blogue, a RTP1 estava a transmitir uma reportagem sobre a rede de supermercados "Mercadona", denunciando o assédio laboral, e ainda questões  mais preocupantes (que se metem com a nossa liberdade individual, como a proibição das chefias - mesmo intermédias - de terem relações de amizade com subordinados, ao ponto de ter "montado" um sistema de vigilância pós-laboral). 

Nem de propósito...

É triste ver que este nosso Portugal continua a ser para cada vez para menos gente (os turistas estão obviamente fora desta equação). Dos jovens já escrevi o suficiente ontem. Em relação às pessoas com mais idade, as coisas ainda se tornam mais graves. Graças ao egoísmo e à falta de humanidade, quando começam a necessitar de mais atenção são "depositadas" em lares. Através de reportagens televisivas temo-nos apercebido do dia a dia de muitos lares, que não passam de  "asilos", onde se tenta roubar às pessoas a pouca dignidade que lhes resta...

Mas quem está na chamada "idade produtiva (e contributiva)", também enfrenta cada vez mais dificuldades no seu dia a dia. Tem de lutar contra o aumento diário dos bens essenciais de consumo, a que se somam o das rendas ou empréstimos  das casas e também o dos combustíveis. Curiosamente, ou não, todos sabemos que enquanto pagamos estes aumentos, os bancos, as gasolineiras e as grandes empresas de distribuição alimentar têm lucros diários de milhões.

Pode ser populista, mas trata-se de um "roubo" diário, com a complacência de quem governa (que também lucra milhões...).

É por todas estas razões que sou contra o "liberalismo", tão defendido pelos nossos governantes, especialmente de direita. Só cria, dia após dia, mais diferenças sociais, os ricos são cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres e em maior número...

E é por isso que digo: «Não. Não temos de ser cada vez mais pobres, para meia-dúzia de pessoas serem cada vez mais ricas.»

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, dezembro 01, 2023

Continuar a seguir a mesma marcha, para trás (nestes tempos de mil e uma promessas)...


Ontem peguei na Carolina ao colo e gostei daquela sensação, até por ela ser uma bebé alegre. Mais tarde dei por mim a pensar que há já alguns anos que não andava com um bebé ao colo.

À minha volta estavam dois casais ainda sem descendentes (os meus sobrinhos) que já ultrapassaram os trinta e não falam sequer em ter filhos...

Como vivem bem e têm bons empregos arranjei logo duas justificações para que isso aconteça: pelo desejo dos jovens em prolongarem a juventude (por culpa dos pais que lhe dão demasiado conforto...) e também por vivermos tempos adversos à criação de novas famílias.

Mas o problema não é assim tão simples. Até porque a maior parte dos jovens não têm o nível de vida deles...

Se olhar para este nosso país, com alguma profundidade, encontro muitas mais razões. A principal talvez seja a "despreocupação social", com pelo menos vinte anos, para com os jovens (quando se começou a acentuar a quebra da nossa taxa de natalidade...). 

Com ela veio o aumento da precaridade do emprego e a dificuldade em arranjar uma casa a preços decentes, que deverão ser os problemas mais graves, e que nenhum governo se preocupou em resolver, num tempo que só foi de "vacas gordas" para meia dúzia de pessoas...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, novembro 30, 2023

Prémios enfiados dentro de "nuvens cinzentas"...


De longe a longe apanho uma ou outra notícia (antigas e raras...) de gente que recusou prémios, normalmente literários, por não os considerar justos... ou apenas por aparecerem tarde demais... 

Antes de Abril não se dava qualquer destaque a estes acontecimentos (bendita "censura", que até protegia os júris dos "prémios literários"), assim como a outros que fossem passíveis de provocar polémica na nossa "santa terrinha".

Lembrei-me disto e doutras coisas, quando cheguei a casa, depois de ter passado pela pista de atletismo municipal e perceber que agora tinha um patrono, que estava longe de ser a grande figura da modalidade no concelho de Almada (vou escrever sobre isso no "Casario").

O mais curioso é que durante a tarde tinha-me deparado com uma entrevista (já com uns anitos) de Rodrigo Guedes de Carvalho, em que ele diz: «O meio literário é uma nuvem cinzenta, sem rosto, cheia de sussurros, uma casta que manobra, que atribui prémios ou que se insinua junto de agentes para traduções e que vai de alguma forma impondo uma ideia do que é bom e do que é mau, sem que ninguém lhe tenha perguntado nada.»

Apeteceu-me sorrir quando recordei um escritor amigo, que já não está entre nós, que me contou da sua felicidade quando recusou um prémio literário, com alguma importância, por sentir que este já chegava tarde demais. Disse-lhes que não precisava nem queria aquele prémio para nada. Mas eles fingiram que não se tinha passado nada e deram o prémio a outro autor, que deve ter ficado feliz da vida...

Sei que isto diz muito de nós, pois nem na atribuição de prémios, ou de outras honrarias, conseguimos ser dignos e justos. Privilegiamos mais a amizade e o compadrio, que a qualidade...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, novembro 29, 2023

Os comentários que vão directamente para o "spam"...


Só hoje é que dei uma olhadela aos vários comentários que têm ido parar ao "spam", vá lá saber-se porquê...

Por engano (e lentidão do computador, está a pedir reforma há já uns tempos...), apaguei um comentário da Rosa sobre o último texto que publiquei. Tentei recuperá-lo mas tal não foi possível (desculpa Rosa...). Foi durante essa tentativa que descobri que tinha mais de 150 comentários no "spam"... Alguns com dez anos.

Republiquei os mais recentes e reparei que a maior vítima do "spam" era a Graça Pires, que tinha dezenas de comentários "perdidos"...

Peço desde já desculpa pela minha desatenção e deixo a promessa de visitar pelo menos uma vez por semana  o "spam" dos comentários.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, novembro 28, 2023

O gosto doentio de acusar antes de julgar...


É quase como uma "peste", esta mania de se estar sempre a apontar o dedo ao outro. As redes sociais ainda agravaram mais esta nossa deficiência moral, de quem apenas se olha ao espelho, para se pôr "bonito" e ir espreitar ao mundo, mesmo que este número não passe de uma farsa.

Não sei se me assusta ou se me enoja, esta nossa nova forma de vida, que valoriza cada vez mais o espectáculo e a mentira, como se tudo o que nos rodeia não passasse apenas de ficção.

O mais grave, é que nem a própria justiça conseguiu escapar imune a esta "peste".

Quando é que tudo começou? Não sei bem. Talvez com o juiz que foi até aos Passos Perdidos prender um político suspeito de pedofilia (que depois até recebeu uma indeminização de ter estado preso sem culpa formada...). Outro bom espectáculo televisivo, foi a prisão em directo, no aeroporto, de um ex-primeiro-ministro (que depois desse "número" e de ter estado em prisão preventiva, foi devolvido à  liberdade, ainda sem ter sido acusado de qualquer crime...). Há inclusive um canal televisivo (CMTV) que trata todos estes casos de polícia como se fossem "telenovelas", com episódios diários, onde nunca falta o "suspense" final, para que se sigam os próximos capítulos.

Infelizmente, o poder judicial nunca mais deixou de estar colado ao jornalismo mais rasteiro e abjeto que existe entre nós, que além de não respeitar o "segredo de justiça", adora acusar antes de julgar.

E se chegámos a um tempo em que são os próprios agentes judiciais, que dão mostras de preferir os "julgamentos públicos" na comunicação social à aplicação da lei nas salas de audiência, parece fazer cada vez menos sentido a existência de tribunais...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, novembro 27, 2023

A vez do teatro (e do associativismo)...


Já falei mais que uma vez da "tertúlia" (a "Tertúlia do bacalhau com grão") que tínhamos às segundas-feiras no restaurante "Olivença", no centro de Almada. Tertúlia essa que passou a um almoço quase sempre a dois - de longe a longe passa a quatro, quando o Mário e o Marinho aparecem. Mas nem por isso é menos rica em episódios marcantes. Para que isso aconteça, basta que eu dê "corda" ao Chico...

Desta vez o Teatro voltou a ser Rei... 

O Chico não me falou apenas das peças marcantes, do olhar diferente dos encenadores em relação ao palco, desde o "certinho" Malaquias de Lemos ao "desconcertante" Rogério de Carvalho. Falou-me sobretudo da alegria que sentia em representar e do ambiente de grande cumplicidade e camaradagem que sentia, aqui e ali. Embora a Incrível fosse a sua principal casa, adorou representar na Trafaria, onde se vivia e amava o teatro de uma forma especial...

Também voltou a "idolatrar" Fernando Gil, que foi uma das figuras mais marcantes da história da Incrível Almadense, onde foi um "faz tudo". Além de ter sido Presidente da Direcção durante vários mandatos também adorava o teatro e foi um bom actor amador. Reviveu vários episódios hilariantes, vividos em peças dramáticas, como "Duas Causas" ou "Amanhã há Récita" mas também em peças carnavalescas, onde Gil se transvestia, ano após ano, com uma graça única.

E para terminarmos o almoço da melhor maneira, o Chico recordou, mais uma vez, o sentido de comunidade e de pertença que existia  na relação de muitos almadenses com a Incrível. Deu o exemplo das muitas famílias que cresceram por ali (deu um destaque especial aos Tavares, pelo desaparecimento do José Luís...) sem esquecer os muitos casamentos que tiveram a bênção da "Rainha do Associativismo Almadense"...

(Fotografia de Luís Eme - Almada, com o Chico em grande plano na exposição "50 anos 50 retratos")


domingo, novembro 26, 2023

A véspera e o dia seguinte...


Li a entrevista de Mário Tomé no "Expresso" e embora seja de esquerda, não comungo de uma boa parte dos seus pontos de vista sobre o 25 de Novembro. 

Hoje digo, felizmente, que tinha apenas 13 anos no final de 1975. Isso permite-me ter o distanciamento necessário para fazer uma leitura e análise, mais profunda,  e também mais livre, sobre este dia, difícil de classificar.

Um dos meus melhores amigos nos últimos vinte anos era um "Capitão de Abril" (Carlos Guilherme), que embora pertencesse ao Movimento dos Capitães, no dia 25 de Abril de 1974 estava a terminar mais uma comissão, em Angola (que se prolongou no tempo, graças aos gritos revolucionários que se seguiram depois do 26 de Abril, de "nem mais um soldado para Angola"...). Mas no 25 de Novembro já estava entre nós e fez parte do comando de operações. Conversámos muito sobre os momentos mais importantes da Revolução (do 16 de Março ao 25 de Novembro).

Mas o que quero destacar é o testemunho que recebi dos principais intervenientes nestas duas datas histórias, durante os almoços promovidos pela Associação 25 de Abril, que tinham um convidado especial (Carlos Guilherme fazia questão de me convidar e estive presente em mais de meia-dúzia deles...), que depois nos brindava com uma palestra - normalmente era um "Capitão de Abril". Como devem calcular, os temas apresentados eram sempre pertinentes,  e tinham a vantagem de no final, serem debatidos e contrariados (se fosse caso disso...) pelos presentes, que também tinham sido "actores" nos mesmos "teatros de guerra".

Sobre o 25 de Novembro, escutei mais que uma intervenção. Não esqueço o testemunho do responsável pelo Forte de Almada, que na época era uma unidade militar. Ele pertencia à facção mais esquerdista dos militares, mas mesmo assim, obedeceu às ordens que recebeu de Otelo, para não distribuir armas a ninguém, nem que para fosse necessário colocá-las em celas fechadas e fazer desaparecer a respectiva chave. Nesses dias quentes houve várias manifestações populares no exterior do quartel (com tentativas de invasão do Forte...), organizadas pela extrema-esquerda.

Percebi através do testemunho de Otelo que, o que estava verdadeiramente em causa era a eclosão de uma guerra civil. O que os militares queriam evitar a todo o custo (tal como acontecera com a Revolução de Abril...), era o derramamento de sangue de gente inocente.  Foi por isso que ele acatou as ordens do Presidente da República, o general Costa Gomes, ordenando às  unidades que ainda lhe eram fiéis, para que não saíssem para a rua (com relevo para os fuzileiros e para os pára-quedistas, os únicos com capacidade para derrotar os comandos...) nem reagissem a provocações.

Há muito quem chame cobarde ao Otelo (especialmente as pessoas da extrema-esquerda). Eu tenho cada vez mais dúvidas de que o seu posicionamento no 25 de Novembro, seja o de um homem cobarde.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sábado, novembro 25, 2023

25 de Novembro: o corte com os excessos da esquerda e da direita (que acabou por ditar também o regresso a "velhos hábitos"...)


Só as pessoas que não têm conhecimento da nossa história recente (ou que têm outros interesses, mais obscuros, como parece ser o caso do "alcaide" de Lisboa), é que podem querer comparar o 25 de Abril de 1974 com o 25 de Novembro de 1975.

O 25 de Abril é único. É o dia da revolução que devolveu a liberdade ao povo português, após quase 48 anos de ditadura. O 25 de Novembro é um movimento militar que procurou redireccionar o rumo da revolução, acabando com os excessos da extrema-esquerda (começaram a confundir liberdade com libertinagem) e da extrema direita (tentava dividir o país em dois, com acções violentas, especialmente na Região Norte).

O 25 de Novembro nunca foi festejado porque as pessoas que comandaram este movimento tinham consciência que a única vitória que conseguiram foi travar os excessos que se faziam sentir de Norte a Sul, ao mesmo tempo que colocaram o país de novo no rumo da democracia. Foi por que Vasco Lourenço,  Ramalho Eanes ou Melo Antunes, quiseram a ser apenas "Capitães de Abril" e nunca "Capitães de Novembro".

Infelizmente este novo caminho acabou também por ser aproveitado pelos meios mais conservadores (com a complacência do PS e do PSD...), com as grandes empresas e a banca a voltar, a pouco e pouco, para o controle das mesmas famílias que dominavam o país no Estado Novo, sem que Portugal obtivesse qualquer benefício com esta mudança. Sim, estas "famílias monopolistas", nunca se preocuparam com o crescimento e a modernização do país. A sua grande preocupação foi sempre o aumento do seu património e das suas contas bancárias...

São eles os principais responsáveis - a par dos muitos políticos medíocres do bloco central -, da nossa continuidade na cauda da Europa.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, novembro 24, 2023

A Marinha entre a realidade e a ficção...


Quando finalmente foram feitas reportagens sérias sobre os efectivos existentes nas nossas forças armadas e se diz o que se calculava há bastante tempo, que a pirâmide estava invertida, que existiam mais oficiais e sargentos que praças, eis que surge hoje o CEMA, radiante, com o futuro nas suas mãos.

Quando ele disse ao "D. Notícias" «Estamos a construir uma nova Marinha. Uma Marinha que assegura a defesa do país, o exercício da soberania e da jurisdição nacional, a preservação dos nossos recursos e a proteção do ambiental.» E não satisfeito, comunica que: «Também modernizaremos os laboratórios da Escola Naval, que vão permitir uma formação de excelência dos nossos oficiais, preparando-os para a era digital e um novo paradigma de atuação.»

Talvez esteja aqui a "chave do futuro", a nova marinha seja só com oficiais, os tais da formação de excelência... Que ao mesmo tempo, também são incapazes de fazer o que alguns sargentos e praças fizeram nas ilhas, por um navio não estar em condições de navegar... (abanando ligeiramente o sonho do CEMA de um dia "ser presidente da república", com mais ou menos bananas).

Pois é, talvez os navios do futuro só tenham oficiais nas suas guarnições. Talvez... 

Nessa altura já devem existir "robots" para fazer o trabalho mais duro e chato dos navios, normalmente destinado às praças...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quinta-feira, novembro 23, 2023

"Ninguém como nós conhece o sol"...


"Ninguém como nós conhece o Sol"...

É este o título da biografia televisiva do poeta Sebastião Alba, que nunca conseguiu (apesar de milhentas de tentativas...) ser aquilo que se chama uma "pessoa normal", que também terá muitas definições.

Não conheci o poeta de Braga, o nome não me era estranho, mas só depois de ver este "rascunho televisivo" - de um poeta que nos seus últimos tempos se afogava em álcool e preferia a vida de andarilho e maltrapilho, ao ponto de ser capaz de se deitar e adormecer em qualquer banco de jardim -, é que tive contacto com mais um criador, incapaz de cumprir as regras que lhe impuseram (a história que o irmão contou da sua passagem pelo serviço militar obrigatório no começo dos anos 1960, em Moçambique, com dezenas de fugas e dezenas de prisões, explica muito bem que era demasiado livre para viver "engaiolado"), num mundo que não era o dele. Talvez esta fosse mesmo a sua única certeza...

Devia ser um desses "loucos" que por vezes passam por nós e nos oferecem uma frase poética, a que nós, se estivermos bem dispostos, retribuímos com um sorriso, mesmo tímido, sem sabermos muito bem como reagir.

E não tenho grandes dúvidas que são as pessoas como o Sebastião Alba, que vivem na rua, que melhor conhecem o Sol (e a Lua, claro). É por isso que este título não deixa de ser feliz, servindo de feição o objecto biográfico deste singular documentário biográfico.

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, novembro 22, 2023

Uma memória de Fernando Maurício e da Mouraria


Quando passo na Mouraria, recordo sempre um momento especial, vivido muitos anos antes daquele bairro castiço se ter transformado quase numa "nova Índia"...

Mesmo sem nunca ter sido uma "ave nocturna", era normal que no começo dos anos 1980, com vinte anos, sentisse curiosidade em visitar e entrar na noite lisboeta. Era o que acontecia quase sempre à quinta-feira (gostávamos de fugir das confusões de fim de semana).

Felizmente tinha dois ou três amigos que tinham "livre-trânsito" nas principais casas nocturnas da Capital. Quando saía com eles sabia que não precisava de estar filas, muito menos correr o risco de ser barrado à entrada do "Frágil", do "Trumps", do "Kremlin", da "Lontra" ou do "Alcântara-Mar". Mas também descobríamos lugares completamente diferentes, entre as quatro e as seis da manhã (enquanto não chegava a hora da primeira barca que nos levava para o outro lado do rio...).

O mais curioso, é não me recordar muito desses lugares mais dançantes (o "Trumps" é a excepção que confirma a regra, por ser completamente diferente dos outros espaços...). No entanto houve outros espaços que me ficaram gravados, por serem menos barulhentos e mais castiços. Como a "Mascote da Atalaia", no Bairro Alto, onde se cantava o "fado vadio" de uma forma completamente improvisada.  Ou o "Bar das Velhas" (não era este o nome, ficava numa das ruelas de Santa Catarina e era gerido por duas irmãs, mulheres bem maduras...) Passo algumas vezes pela sua rua e sei que agora é outra coisa, ao contrário da "Mascote", que continua agarrada ao fado, embora se tenha modernizado e tenha pouco da tasca desse tempo.

O que nunca mais consegui encontrar (e passo inúmeras vezes pela Mouraria...) foi a taberna, onde numa noite, desses já longínquos anos 80, tive a felicidade de ouvir cantar um dos grandes fadistas lisboetas, Fernando Maurício.

Mal ele começou a cantar a sua "Igreja de Santo Estevão", naquela tasca repleta de gente, apenas a dois ou três metros de mim, arrepiei-me de imediato. Acho que nunca mais voltei a sentir nada assim, foi como se a sua voz entrasse dentro de mim. E quando acabou de cantar, agradeceu os aplausos e disse estar muito feliz por ver por ali tantos jovens, presos ao fado, olhando para onde eu estava com o meu grupo de amigos.

Apesar de se "vender" a Mouraria de hoje como um lugar perigoso, não sinto qualquer animosidade, quando passo naquelas ruas, mesmo nas que cheiram mais a caril e a chamuças...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, novembro 21, 2023

Memória das palavras da Augusta "Maluca" (cheias de sabedoria...)


Chamavam-lhe Augusta "Maluca" e foi das poucas pessoas da aldeia a ultrapassar os cem anos, ainda que por pouco tempo.

Já muito curvadinha, aquilo que menos gostava era de depender dos outros, foi por isso que nunca deixou de viver na sua casa, que ficava ao lado da de um dos seus filhos. O mais curioso, é que apesar de se dizer raios e coriscos dela, sempre se deu lindamente com a nora, que a recorda com um misto de saudade e emoção, por ser uma daquelas mulheres que nunca deixou de dizer o que pensava, mesmo quando tal era quase proibido.

Por ter jeito para a costura, era muito procurada na aldeia para fazer vestidos e até fatos de homem, mesmo para gente que vivia fora. O seu humor, que se confundia com a "má língua", era conhecido por todos, mesmo que nunca falasse da vida de ninguém. Falava sim, da vida de todos, em geral. Mesmo sem ter qualquer noção política, sabia, e dizia, para quem a queria ouvir, que o mundo estava muito errado, nunca iria perceber porque é que uns tinham tudo e outros tinham nada. 

Mas a sua coragem também era física. Não podia ouvir falar de padres e de religiões, porque na adolescência o padre da aldeia tentou colocar a mão onde não devia. Reagiu de imediato, dando-lhe um empurrão, deixando o padre caído no chão da igreja. No dia seguinte ele andava com o braço ao peito e cabeça baixa. Foi apenas mais uma das histórias da Augusta que correu mundo, e que foi exemplar para todas as jovens mulheres das redondezas.

Onde eu já vou e só queria falar de uma frase que lhe é atribuída, quando nas férias grandes, um dos netos estava triste, porque os pais de um miúdo da cidade tinham-no proibido de brincar com ele. Augusta não foi de modas e disse-lhe: «Não te preocupes filho, eles são ricos mas têm todos cara de parvos e pele cor de rosa como os porcos.»

Não sei se a frase correu mundo, sei apenas que chegou à minha cidade e nos deixou a todos com um sorriso no rosto.

Sempre existiram pessoas assim. Agora é costume dizer que "são fora da caixa", mas noutros tempos, eram apelidados de "malucos", por dizerem sempre o que pensavam, por muito que chocasse quem os rodeava.

Não é por acaso que, ainda hoje, quando se referem a esta Senhora, a tratam como a Augusta "Maluca"...

(Fotografia de Luís Eme - Sobreda)


segunda-feira, novembro 20, 2023

Os tempos em que quem vota parece ser ainda mais "louco" do que quem é eleito...


Eu sei que sempre houve loucos a chegarem ao poder e a dar a sua contribuição para a "destruição" de direitos e deveres que demoraram décadas a sair do papel, como se a aspiração de se viver numa sociedade mais justa fosse algo do outro mundo. Mas agora passou a ser uma coisa normal. De repente aparece um tipo com um ar de quem veio de um circo qualquer, depois de passar umas temporadas em qualquer hospício, a disparatar e a apontar dedos e medir toda a gente pela mesma bitola (são todos ladrões e corruptos...). Como se isso fosse a "chave" para a eleição...

Depois dos EUA, do Brasil e do Reino Unido, agora é a vez da Argentina ter o seu "ultraliberal" (o regime que pode ser tudo e nada ao mesmo tempo...), onde continua a sobressair uma cabeleira tonta, misturada com um discurso populista, digno de qualquer vendedor de pulseiras ou chás milagrosos.

Provavelmente muitos argentinos votaram no senhor Mitei, porque pensaram que pior do que o que vivem, deve ser impossível (com uma inflação a 150%...). Mas estão enganados. É sempre possível escavar o "buraco" ainda mais para baixo...  O maior exemplo que se lhes pode dar é o Brasil, que apesar de estar longe de ser um país pobre, a maior parte das pessoas vivem com grandes dificuldades, graças ao "desgoverno" de Bolsonaro. 

Essa será uma das explicações (a par da violência urbana...), para termos tantos imigrantes brasileiros entre nós.

Nós perguntamos, como é que alguém pode ser eleito, a defender (entre outros disparates) a livre comercialização de órgãos humanos ou a chamar o Papa Francisco de "comunista" e de "diabo".

Pode, porque quem vota parece ser ainda mais "louco" que quem é eleito...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)