Tenho uma amigo que trabalha como operador de câmara e assistente de realização, no mundo do futebol e conhece como poucos o cheiro da relva e os melhores ângulos de todos os nossos estádios, de Norte a Sul.
Na semana que passou falámos ao telemóvel sobre o projecto de um filme. Eu acabei por puxar para a conversa a contestação do FC Porto, aos árbitros, à procura do seu ponto de vista, completamente neutro (não é um grande amante de futebol, muito menos de clubes...). O que ele gosta é das imagens em movimento, da espetacularidade do futebol. Curiosamente, esse registo pessoal desligado da clubite, faz com que seja quase sempre escolhido para filmar os grandes jogos.
Há uns tempos houve um treinador espanhol (treina o Tondela), que falou abertamente do comportamento dos jogadores e do banco de suplentes do FC Porto em relação às equipas de arbitragem. Pressionam sempre o árbitro quando ele apita contra a equipa, ora fazendo-lhe frente no interior do relvado, ora saltando e gritando no banco de suplentes. Como este senhor tinha sido treinador adjunto do Benfica, quiseram levar esta questão para a rivalidade entre os dois clubes, sem se focarem no verdadeiro problema.
A primeira reacção deste meu amigo foi sorrir. Mas depois contou-me que no início achava tudo aquilo completamente estranho, estar ali, sem ninguém nas bancadas. Os gritos, os assobios, os aplausos, o calor humano que tomava conta de tudo, desaparecera... Ao mesmo tempo que o relvado se tornava mais vivo. Agora era possível ouvir os jogadores dentro de campo a falarem uns com os outros e com o árbitro, assim como os treinadores, a tentarem passar a sua mensagem aos seus pupilos.
Esta mudança fez com os árbitros tivessem de mudar de atitude. Não podiam fechar os olhos a situações completamente aberrantes e ofensivas, que partiam dos bancos, ou de jogadores mais exaltados. Eram de alguma forma, "obrigados" a ter uma mão mais dura, disciplinarmente, porque o que antes passava despercebido, agora era audível por todos. Isso explica que hoje sejam exibidos mais cartões, a quem não interfere directamente no jogo, como são os treinadores e os dirigentes dos clubes.
O FC Porto é o clube que tem tido mais dificuldades em adaptar-se a este novo futebol, porque um dos factores que sempre tentou usar em seu benefício, foi a tal "pressão", que Pako Ayestaran abordou, depois do jogo que disputou contra o clube das Antas. Não quero dizer com isto, que não tenha sido vítima de erros das equipas de arbitragem. Quero dizer sim, que o seu comportamento faz com que seja nos tempos que correm, um "alvo" mais visível...
(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)