quinta-feira, fevereiro 25, 2021

«Somos como o vinho do porto. O resto é conversa.»


Um dos meus bons amigos, "filósofos", de vez em quando oferece-me algo para escrever e partilhar, por aqui.

Falámos de um médico "péssimo", que finalmente se reformou (que só conheço de vista...). Este "péssimo" não se deve à apreciação técnica, mas sim humana. Ao longo dos anos ouvi chamarem-lhe tudo: de "sapateiro", "besta", "calceteiro" até ao cada vez mais banal, "fdp".

Este meu amigo "aturou-o" mais de vinte anos, primeiro por imposição, depois por habituação. Felizmente as consultas era curtas, mas deu para ele se aperceber que o médico tinha cada vez menos paciência para lidar com doentes e com as doenças, o que o tornou mais condescendente, com as suas "trombas de elefante".

Ele disse-me algo que todos nós sabemos, com a idade, os bons tornam-se melhores e os maus piores, mas utilizando menos palavras: «Somos como o vinho do porto. O resto é conversa.»

Eu dei-lhe uma outra justificação. Provavelmente o médico estava na profissão errada, seguiu as pisadas do pai, por imposição familiar (a velha história de um dia "vir a herdar o consultório e os doentes do pai"...) e nunca se sentiu realizado, nem feliz, no mundo da medicina. Aconteceu-lhe o que acontece à maioria das pessoas.

O meu amigo não ficou muito convencido e levou a questão para o lado material: «Isso é música de "pianola". Tens alguma dúvida de que o dinheiro que ele ganhava por consulta, devia-o fazer sorrir mais vezes para os doentes?»

Não, não tinha, mas...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)

 

8 comentários:

  1. Ontem fui ao otorrino que, bem mais novo do que eu, conheço há anos, até por alguma ligação familiar.
    Muito bom tecnicamente, explica tudo muito bem explicado mas não lhe consegui arrancar um sorriso.
    E eu até sou exímia nisso!
    Há gente assim!

    Abraço

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    1. É, há gente assim, que não gosta de "dar confiança", Rosa. :)

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  2. Também concordo, não é tudo só uma questão de dinheiro, a realização pessoal também conta! Ter muito dinheiro e não fazer o que se gosta não é o pacote completo para a felicidade!

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    1. Sim, Micaela. E o normal é fazermos coisas que estão longe de nos realizarem...

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  3. É engraçado que nós, latinos, damos muita importância à forma como somos atendidos. "Exigimos" sempre um sorriso nos lábios de quem nos atende, porque sim.
    Se formos aos países do centro e norte da Europa, as coisas são diferentes. Eu digo isto por experiência própria e de amigos que lá vivem. As pessoas fazem o seu trabalho e pronto.
    Voltando ao nosso caso: por vezes, somos atendidos com um sorriso que, quando voltamos costas, se transforma logo num esgar.
    Eu conheço um estrangeiro que viveu e trabalhou em Portugal durante alguns anos e estava encantado com a forma como era tratado pelos portugueses. Dizia ele que tinha muitos amigos! Até ao dia em que precisou mesmo de um amigo e verificou que, afinal, não tinha nenhum...

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    1. Não me importo que o sorriso se torne no asgar quando volto costas, Maria.

      Quero sim, ser atendido como deve ser (é essa a função de quem nos atende). Mas dispenso os sorrisos.

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  4. Mas um sorriso sabe tão bem bem; quem não gosta de um sorriso? Só quem não sabe sorrir.

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    1. Pois sabe, Severino. E quem está do lado de lá do balcão tem de saber isso, caso contrário, deve mudar de profissão.

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