quinta-feira, abril 04, 2024

O cheiro destes dias de nevoeiro...


Quando me levantei e espreitei a janela, descobri uma manhã quase de nevoeiro cerrado. Apenas via a fachada do prédio de frente.

Depois abri a varanda e não foi difícil de descobrir o cheiro esquisito da atmosfera, que normalmente vem "colado" a estes episódios, em que parece que o "mundo desapareceu"...

Enquanto bebia café lembrei-me dos dias de nevoeiro do  Barreiro, no começo dos anos oitenta do século passado, em que o ar se tornava quase irrespirável, especialmente nas noites mais fechadas e húmidas. Sabíamos que as fábricas da Quimigal aproveitavam estas "quase barreiras" para misturarem os gases tóxicos das suas torres enormes com o ar que respirávamos, deixando à nossa volta um cheiro muito pouco saudável, povoado de enxofre, amoníaco e outras pestilências, que quase nos arranhava a garganta.

Nessa altura as fábricas ainda funcionavam a todo o vapor e falava-se pouco do ambiente. Mesmo que todos soubéssemos que a única coisa que aquelas coisas deviam fazer era aumentar o crescimento dos pelos no nariz, nas orelhas e nas costas... 

Claro que estou a brincar. Faziam pior que isso, de certeza.

Mesmo sendo das artes e não das ciências, continua a fazer-me muita confusão, que estes cheiros esquisitos só apareçam no ar nos dias de nevoeiro...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


2 comentários:

  1. O Tejo era um mundo de trabalho: cacilheiros, navios a descarregar ao largo, um mar de fragatas num vai-vem-rio-acima-rio-abaixo.
    Olhava-as da mansarda da avó paterna, na Rua Senhora do Monte, mesmo na esquina com o Bairro Estrela D'Ouro.
    Via-se o Barreiro, a névoa fabril a sair das chaminés, quando ainda as diversas e enormes fábricas da CUF não tinham sido construídas no Lavradio.
    A travessia Lisboa/Barreiro era feita com barcos a carvão. Quando assentou praça, em Tavira, Junho de 1967, ainda fez a travessia num desses barcos. Chegou ao Barreiro à meia-noite para apanhar o comboio-correio, um verdadeiro recoveiro, terceira classe, bancos de suma-pau, paragem em todas estações e apeadeiros.
    Chegada a Tavira às sete e meia da manhã.
    Aquela água furtada onde vivia a avó paterna.
    Algures, Walter Benjamim diz que para conhecer toda a melancolia de uma cidade, é preciso ter sido lá criança.
    António Gedeão, que viveu por aqueles lados a adolescência, na Calçada do Monte, sempre quis voltar a subir aquelas escadas, ele também quis subir as escadas da mansarda onde a avó viveu, bater à porta, dizer a quem a abrisse, que um miúdo de 8 anos, em tempos distantes, olhava o Tejo daquela varanda e se poderia rever essa sensação.
    Mas quando sobe aquela rua, olha o marco do correio que ainda se encontra junto à porta e, ao contrário de Gedeão, nem as escadas sobe.

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    1. Era um mundo de trabalho, sim, Sammy.

      Sem muito respeito pelas pessoas e pelo Tejo.

      Mas as memórias são sempre boas. :)

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