Embora os alentejanos se deixem "pintar" pelo sol, nunca ficam da cor do Rafael, que sempre se orgulhou de ser preto e alentejano.
Claro que o "cante" nunca foi o seu forte, desde a meninice que se habituou a ser embalado por outras músicas escuras, que saiam das guitarras do avô, do pai e do baixo do tio, gajos para misturar as vozes e irem até à américa. Daí a nada o Rafael começou a acompanhá-los com a pequena bateria que ganhou num Natal.
Mas o que ele queria mesmo era dar porrada às teclas do piano, como o Alfredo, o branco que acompanhava o grupo de baile do avô, "Ritmos Azuis", que de Verão tentavam bater todas as romarias do Alentejo, Alto e Baixo.
Quando cresceu os "Ritmos Azuis" eram apenas uma memória, que quase duvidada da existência. Nunca soube muito bem o que aconteceu. Parece que se chatearam uns com os outros e não voltaram a tocar juntos nem separados.
Na adolescência tentava desafiar o pai e o tio, para o acompanharem, mas em vão... O avô era o único que continuava a fazer chorar as pedras da calçada com as mornas da Terra Natal.
Com apenas dezoito anos Rafael começou a animar as noites do bar manhoso do Evaristo, que até tinha umas raparigas que vestiam menos de mini saia.
Como gostava de pôr aquela gente a dançar, aos pulos e agarradinhos (havia sempre uns fulanos que lhe colocavam uma nota no bolso a troco de músicas lentas...). Hoje ri-se, desta sua faceta de "prostituta".
Acabou na Capital do Império. Duas ou três vidas depois, regressou, atrás dos pássaros do Sul.
Uma noite apareceu no bar do Evaristo e conheceu o novo dono do lugar, que sempre pensara que o piano era apenas um objecto decorativo, até ele lhe demonstrar que ainda estava ali para as curvas. Sorriu por isso e também por continuarem a existir raparigas, agora praticamente sem saia...
O óleo é de Keith Mallet.
O talento não morre com a idade. Aprimora-se.
ResponderEliminarUm abraço e bom Domingo
pois não, nem se esquece, Elvira. :)
Eliminar