sexta-feira, outubro 23, 2020

O Cinema não é Para Todos (e menos ainda para todas...)


Hoje ao ler o "Ípsilon" (Público), fui surpreendido pela história do filme, "O Movimento das Coisas", realizado por Manuela Serra, entre 1979 e 1985, que nunca foi exibido em salas de cinema. 

Trinta e cinco anos depois, a longa metragem que procura fazer o retrato da aldeia de Lanheses, no Norte do País, vai ser, finalmente, exibida no "Festival Lumière", que se realiza em Lyon. É um certame muito peculiar, pois gosta de recuperar filmes esquecidos, com cópias novas ou exibir filmes que nunca espreitaram para dentro de nenhuma sala de cinema.

Curioso, quis conhecer a realizadora, que se afastou da sétima arte completamente desiludida com as pessoas do meio, como explicou na entrevista que deu ao suplemento cultural do diário. Retive algumas frases bastante incisivas, que a marcaram para sempre: 

«O mundo do cinema é dos homens. Agora talvez um bocadinho menos, mas na época eram só homens. As mulheres que entravam na porta do cinema eram ”as mulheres de...”, “as sobrinhas de...”,  “as filhas de...”. E as mulheres entre si não são solidárias. Ainda hoje sinto isso: é um mundo marcadamente masculino.»

«Esse mundo masculino trouxe-me a impossibilidade de me manter no meio: assediada, ignorada, insultada, agredida fisicamente. Portanto, tinha é que me retirar.»

Embora conheça algumas pessoas ligadas ao cinema, nunca entrei verdadeiramente nos bastidores desta arte, mas sei que é um "mundo" muito fechado, em que a distribuição de apoios é provavelmente mais "viciada", que em qualquer outra área da cultura. Trocando isto por miúdos: há quem passe a vida toda de cineasta a filmar "à nossa conta" e há outros realizadores que não conseguem realizar um único filme com apoios públicos... E isto está longe de acontecer apenas por questões de qualidade. 

E não vale a pena pintar a realidade, de azul ou amarelo. Se é muito triste ser-se criador no nosso país, criadora parece que ainda continua a ser mais difícil...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


2 comentários:

  1. Depois de comissões, grupos de trabalho, quotas, nomes pomposos com o termo Igualdade, ainda estamos muito longe disso!

    Abraço

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