Quando tu me perguntaste com um sorriso: «Ainda acreditas que as mais sossegadas são as piores?» Limitei-me a devolver-te o sorriso.
Claro que sabia que as sossegadas não eram piores nem melhores que as outras, apenas mais discretas.
Sabia que por causa deste dito popular, as pessoas sossegadas sempre foram olhadas quase à lupa, em movimentos ascendentes e descendentes. Quase que se tratava de um trabalho de investigação, como se através do olhar fosse possível entrar dentro das pessoas e descobrir os segredos que guardavam e os sonhos que tinham. Era como se escondessem um segredo, ou pior, uma anomalia.
Aquilo que eu sempre soube era que as sossegadas eram as menos desejáveis, e desde os tempos da meninice. Não que gostasse especialmente do tipo de miúda "maria-rapaz", mas era importante sentir-me acompanhado, nem que fosse para dar comer aos peixes. Nunca achei muitas piada às "torres de marfim" onde se guardavam princesas...
Infelizmente foi o que te aconteceu. Durante a infância e adolescência mal pisaste a rua. Lias muito, o que em vez de te sossegar só te inquietou. Era esse o teu maior segredo. Eras uma sossegada inquieta, com tantos sonhos escondidos nas páginas dos teus diários, que um dia queimaste.
Foi quando decidiste deixar de ser uma mulher sossegada.
O óleo é de Henri Lebasque.
Inquietante este texto (porque também andei a ler muito durante a infância e a adolescência e tive/tenho diários, embora não pense em mim como sossegada).
ResponderEliminarUm Bom Natal
um beijinho
Gábi
Inquietante? Talvez aos dias de hoje, Gábi.:)
EliminarQue belo texto, Luís!
ResponderEliminarObviamente que não me revejo nele - a não ser na inquietação provocada pelas leituras na adolescência - mas lembrei-me, e muito, de Florbela Espanca!!
Um abraço.
Janita
As mulheres sempre tiveram mais "gaiolas" à sua volta, que nós, Janita.
EliminarUm texto muito interessante. Não me revejo nele, sempre fui um bocado Maria-Rapaz e também um tanto rebelde. Li muito na juventude. Quase sempre de noite e às escondidas, minha mãe dizia que livros não enchiam barriga, e só serviam para me pôr minhocas na cabeça. E nunca tive um diário.
ResponderEliminarUm abraço e desejo-lhe um Santo e Feliz Natal, com todos os seus amores.
Um abraço
Pois é, os livros tem essa coisa boa de nos "encherem as cabeça de minhocas", Elvira. :)
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