As pessoas mais próximas ainda não perceberam até que ponto o António ficou afectado com a fogueira grande que deixou a casa de campo apenas com as paredes.
A Ana anda preocupada e diz a todos os amigos que o companheiro não anda bem. Tudo porque quando alguém lhe "quer medir o pulso", para saber coisas que ele desistiu de quer saber e lhe faz perguntas sobre tudo o que aconteceu, ele com um sorriso nos lábios diz: «Qual casa, quais livros, quais quadros?»
Com os amigos mais próximos vai mais longe nas explicações: «Há muito que a casa precisava de uma remodelação. Nos últimos anos foi tratada como "depósito de lixo", levávamos para lá o que não nos fazia falta. Os móveis que não queríamos, as roupas que não usávamos, os livros que não líamos e os quadros que não cabiam nas paredes. Agora voltou tudo ao início. Vai voltar a ser a casa dos primeiros tempos, quando acabarem as obras.»
E vai ainda mais longe no seu sorriso: «Talvez volte a ter tempo de pegar na viola no quintal e tocar para os pássaros.»
E vai ainda mais longe no seu sorriso: «Talvez volte a ter tempo de pegar na viola no quintal e tocar para os pássaros.»
Mesmo assim desconfiam da sinceridade das suas palavras. Não compreendem que ele seja capaz de dizer, «Voltar atrás para quê?», um lugar comum que é título de livros e de filmes, mas que é a melhor solução para se conseguir continuar a andar em frente, sem andar com os bolsos cheios de "fatalidades".
Não sei se é o facto de ser homem (com um bom poder de abstracção - que há quem chame capacidade de "fugir dos problemas"...), que me leva a compreender o António. Sei que o que ele quer dizer é que há coisas mais importantes que os objectos que vamos guardando pela vida fora, por muito que façam parte das nossas memórias...
(Fotografia de Tarlé Dominique)
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