Um dia qualquer reparei que deixara de aparecer e perguntei à Rita por ele. Ela disse-me que falecera, há menos de um mês.
Nesse momento, senti-me estranho, por o conhecer durante meia dúzia de anos e nunca ter trocado uma palavra com ele, muito menos conversado. As palavras dele eram todas para a Rita, como se me quisesse meter ciúmes. Às vezes referia-se a mim na terceira pessoa, do género "o seu amigo isto ou aquilo". Eram sempre coisas simples e agradáveis, que apanhava das nossas conversas e que faziam a Rita sorrir.
Depois a minha amiga fez um ligeiro esboço biográfico do homem bem vestido que eu apenas sabia que gostava de ler o "Público", no começo da manhã.
Publicitário e poeta como o grande O'Neill (trabalhou com ele no começo...), deixava viúva uma professora e também duas filhas e um neto, que nunca conhecera. Uma vez ele ofereceu-lhe um livro, com uma dedicatória deliciosa...
Não falámos da sua aparente ambivalência sexual. Não era necessário.
Foi quando a Rita disse: «Falamos tantas vezes de coisas que não sabemos. Quase sempre, estupidamente.»
(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)
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