As conversas quase de ouvido, têm quase sempre apenas um sentido, a sua vaidade pessoal, o querer exibir-se, o querer mostrar-se, em qualquer palco.
Esquecem a sua vontade de ajudar, o querer estar, o querer fazer, a aceitação de qualquer papel mesmo que seja de um simples figurante, como o de um actor amador menor, que ficou no "anedotário local", por causa da mulher. Falo do Tó da Mutela, que também gostava de tudo aquilo, de estar ali ao lado de todos aqueles homens e mulheres com muito mais jeito que ele para a arte de talma.
Quando me contaram a história da "queda em palco", sorri e lembrei-me logo do Tó...
Sim, é histórica a frase da sua mulher após a estreia. Depois de lhe fazer o jantar mais cedo, vê-lo sair de casa e passar os serões a ensaiar a nova peça do grupo cénico, meses seguidos, disse: «Tanta merda para isto? Para atravessares o palco, três vezes, de um lado ao outro, e dizeres apenas boa noite?», insistindo, irritada, «para dizeres uma merda de um boa noite, não era preciso ensaio nenhum.»
Claro que era preciso ensaio. Mas eles não sabem, nem sonham...
O Tó tinha de conhecer a deixa, tinha de saber o caminho que iria percorrer, de um lado para o outro, no palco. Bastava um precalço para tornar o drama numa comédia...
O que ela nunca percebeu, foi a paixão do seu homem pelo palco, o querer estar ali, participar, nem que fosse apenas para ver os outros.
Talvez preferisse que ele passasse os serões na taberna (lá não havia mulheres) e não no ensaio...
Foi por isso que percebi a frase do encenador, quando dois ou três elementos do grupo, o criticavam: «Dêem-lhe espaço, deixem-no ter o seu momento, deixem-no cair, sozinho...»
O papel que fazia, era de um amante, que acabava assassinado em palco. Achavam que ele não caia com naturalidade, fazia um espectáculo dentro de um espectáculo.
Eles fingiam não perceber que o teatro é isso, é o exagero da realidade...
(Fotografia de Luís Eme - Almada)
Também teve as suas tertúlias. Muitas palavras, também muitos silêncios, fios costurando o tempo como diria Mia Couto.
ResponderEliminarPor cafés, por tertúlias, lembra sempre José Gomes Ferreira, Carlos de Oliveira, Augusto Abelaira, José Rodrigues Miguéis.
Por Rodrigues Miguéis, por cafés, um depoimento da sua mulher Camila:
« Quando chegou aos Estados Unidos a primeira coisa que o ia matando foi quando descobriu que não havia cafés. Como é que podia viver sem um café onde encontrava os amigos, onde se sentava e levantava logo que se sentia desconfortável ou aborrecido, ou quando lhe surgia uma ideia e tinha de regressar a casa para a escrever? Como é que as pessoas podiam viver daquela forma? Isto foi um problema muito, muito difícil para ele, e eu sentia-me desanimada, porque não o podia resolver. Quando lhe disse o que tínhamos – restaurantes, cafetarias, balcões, vários locais -, ele disse: «Mas eu estou a falar de um café; tu não percebes.» E esta situação aborreceu-o a vida toda. Aborreceu-o mesmo.»
Percebi que este comentário é ao texto anterior.
EliminarE claro que não vem mal nenhum ao mundo por causa disso.
Grato, Sammy, pelas palavras e pela boa e útil transcrição.
Caro Luís, trocar os posts, trocar as voltas, trocar sabe-se lá mais o quê, obviamente não vem mal nenhum ao mundo, mesmo não sendo ele um picuinhas, é desconfortável, resta um pedido de desculpas e lembrar o Gabriel García Márquez : «…a terceira idade é aquela em que a gente põe óculos para ouvir o rádio.»
EliminarAbraço Sammy
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