quarta-feira, julho 25, 2018

Apontar Armas no Alentejo Puro e Duro


«Não conhecia um nem outro. Disseram-me que o meu avô, o velho Serra tinha apontado uma caçadeira ao pai, em 1975, e uma pistola ao filho, em 2010.
Trinta e cinco anos mudaram muita coisa neste país, mas pelos vistos os "filhos da puta" são praticamente os mesmos.
Mesmo assim fez-me espécie que o filho de um comunista, que queria roubar as terras ao meu avô, fosse agora "social-democrata" e tratado por "senhor ministro" - e devia gostar, porque não pedia outro tratamento -, embora tivesse sido apenas secretário de estado por curtos meses. Ficou ministro para sempre, mesmo que não passasse de mais um reles "ladrão"...
O mais curioso é que da primeira vez ninguém incomodou o avô. Desta vez apareceram por aqui dois militares da GNR, queriam que ele os acompanhasse ao posto. Gente pacata, quase com os olhos presos ao chão, apenas queriam cumprir o seu dever, registar a sua versão dos acontecimentos.
O avô disse-lhes que não precisava de ir ao posto para lhes contar a sua versão e contou-lhes «quem entrar nas minhas terras para me insultar e ameaçar, pode contar com tudo menos com o meu silêncio e a minha passividade». Explicou ainda que apenas apontou a arma para que ele percebesse que ali quem mandava ainda eram os Serra e não o "senhor ministro" e os seus capangas.
Em 1975 foi mesmo levado para o posto e ficaram-lhe com a arma. Em 2010, as palavras  do avô foram suficientes.
Os dois militares entraram no jipe e desapareceram.»

(Óleo de Jean Dufy - uma ficção pura e dura)

2 comentários:

  1. Pode ser ficção, Luís. Mas houve tantos casos assim…
    Uma boa semana.
    Um abraço.

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    1. Sim, muitos, Graça.

      E continuam a existir, aqui e ali...

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