Ontem, quase no final da minha intervenção, a professora de Português daqueles jovens, perguntou-me como é que ela poderia fazer com que eles lessem.
Voltei atrás na conversa (ela esteve a dar uma aula só apareceu depois...), ao meu sétimo ano de escolaridade, à minha excelente professora de Português e à "Biblioteca de Turma" que criámos ao longo do ano, em que nos quotizávamos e comprávamos os livros que queríamos ler (com algumas sugestões da professora...) e depois falávamos sobre eles (não sei se de quinze em quinze dias se mensalmente, havia uma aula só para a nossa "biblioteca" e os "nossos livros"), sobre o que tínhamos gostado mais, das personagens, dos lugares, estimulando o interesse dos que ainda não os tinham lido.
E claro, aconselhei a professora a sugerir livros bons (mas também de boa "digestão"...), com uma linguagem acessível, boas histórias e muita acção... Falei também do realismo mágico da "latina-américa", de Jorge Amado, de Ernest Hemingway, Luís Sepúveda ou até do nosso Camilo. Desaconselhei por completo José Saramago ou António Lobo Antunes...
Mas o importante é ler, ler, viajar dentro dos livros.
(Óleo de Gustave Caillebotte)
Os de Saramago e Antunes apenas ajudariam a limitar o pouco entusiasmo que esses jovens possam sentir pela leitura (apesar de não saber qual a sua faixa etária)
ResponderEliminarSim, são livros difíceis, Catarina, nunca para iniciados.:)
EliminarAi, lá isso é! Mas olhe que os livros indicados pelo programa para os alunos do 10º ano são bem tolos...
ResponderEliminarBoas leituras!
Nunca foram os melhores para o estimulo da leitura, Graça.
EliminarExige-se aos professores bom gosto e bom senso.
O hábito de ler tem caído a pique nestes tempos. Muito interessante saber como faziam vocês com a "Biblioteca da Turma"...
ResponderEliminarUm abraço, Luís.
Bons tempos, Graça.
EliminarMas aquela minha querida professora de Português foi uma raridade...
nunca tive uma "biblioteca de escola", Luís, e é de facto tão importante.
ResponderEliminarestou a estudar uma cadeira de mestrado "estudo e formação de leitores" que já me mostrou e ensinou coisas tão interessantes sobre os livros. detalhes que muitas crianças gostariam e deveriam saber para aprender a amar a literatura.
em contrapartida tive uma biblioteca, em casa dos meus pais, que era de sonho e essa sim, ensinou-me a amar os livros.
Felizarda.:)
EliminarA biblioteca de casa foi feita sobretudo por mim e pelo meu irmão, Laura.
Incentivar a leitura, e o amor pelos livros, devia começar com os pais e desde a mais tenra idade. Nunca li nada de Lobo Antunes a não ser as crónicas e delas eu gosto. Saramago? pois li pouco e do que mais gosto são os poemas.
ResponderEliminarAbraço e bom feriado
As crónicas não têm nada que ver com os romances de Lobo Antunes, Elvira.
EliminarSão muito mais "normalizadas". :)
Mas atenção, SARAMAGO é um escritor fantástico. Estou, no entanto, de acordo com este não aconselhamento do Luís.
EliminarSaramago não é efectivamente um escritor fácil mas, tal como dizia Vergílio Ferreira, os grandes livros são aqueles que nos obrigam a pensar, e de Saramago aprende-se a gostar tal como se aprende a gostar de música; a boa literatura é arte.
Lobo Antunes não entendo, não percebo; curiosamente gostei dos três primeiros livros dele (CONHECIMENTO DO INFERNO, MEMÓRIA DE ELEFANTE e CUS DE JUDAS), mas depois disso deixei de o entender (salvo as crónicas que são óptimas).
Luís. há uns tempos deu-me para escrever sobre este meu gosto pela leitura de livros e saiu o que vai ali para baixo.
ResponderEliminarE com isto, destaco e homenageio o papel que a itinerância da Gulbenkian teve para muitas crianças e jovens que, tal como eu, tinham poucas possibilidades de aceder a livros por outras vias.
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A rapariga que gosta de livros
Com alguma frequência leio e oiço relatos de estratégias usadas para motivar para a leitura de livros, sobretudo princípios direccionados para os grupos etários mais jovens.
Mais do que pensar nas formas que melhor servirão para atingir o objectivo, mergulho deliciosamente no meu universo infantil.
Desde que aprendi a ler, subiu-me a vontade de comer palavras amarradas em livros. Uma vontade para a qual ainda hoje não tenho uma explicação, já que no ambiente familiar e no grupo de amigos não havia o hábito de ler com regularidade.
Apesar de não ter uma explicação, sei que houve uma circunstância que serviu para alimentar esse gosto e provavelmente teve uma expressão significativa ao nível da consolidação do meu hábito de leitura. Refiro-me às bibliotecas itinerantes da Gulbenkian, que, à época, em muitas pequenas localidades do interior, como era a vila onde vivia, funcionavam como o único meio de acesso a livros.
Este serviço foi criado pela Fundação Calouste Gulbenkian em 1958, de acordo com sugestão de Branquinho da Fonseca, e almejava abranger todo o território nacional. Começou com quinze carrinhas cinzentas, da marca Citroën, e teve uma grande expansão logo no início. Por exemplo, em 1961 já havia quarenta e sete veículos a circular, com o serviço gratuito de empréstimo domiciliário de livros. Estas bibliotecas itinerantes funcionaram até 19 de Dezembro de 2002.
A carrinha ia duas vezes por mês à minha terra e ficava estacionada no largo principal cerca de duas horas. Nós, os miúdos inscritos, esperávamos com ansiedade pela nossa vez. Um cartão pequenino numa bolsinha de plástico era o nosso passaporte para o mundo dos livros.
A certa altura comecei a notar que o limite de livros estipulado para o empréstimo domiciliário era escasso para as minhas necessidades. Então, o conservador-bibliotecário - era assim que se designava o "dono" da nossa carrinha - disse-me que como era assídua e não estragava o material, deixava requisitar mais dois livros por quinzena e eu fiquei muito contente. Assim, tinha sempre livros para ler!
Também nessa época, o que pedia pelo Natal e aniversário era livros. Os da "Anita" deslumbravam-me e ficava furiosa quando teimavam em substitui-los por pijamas e meias.
E há um episódio engraçado com livros. Ou melhor: com um livro proibido.
Um dia, em casa, numa gaveta da cristaleira, descobri um livro branco com letras azuis e vermelhas, cuja conjugação resultava em "Método de Ogino-Knaus".
Bom, na minha cabeça de criança funcionou assim: se este livro está separado dos outros, num sítio invulgar e de raro acesso é porque tem alguma coisa de especial. "Será melhor lê-lo", pensei. Sim, nas tardes que passava sozinha dei conta dele. Claro que os meus oito anos, e numa época em que havia menos informação, não permitiram entender nada. Mas aquelas figuras com as trompas de Falópio ainda hoje são desenhos deslumbrantes que habitam a minha memória visual. É que nem sequer imaginava que tinha trompas na barriga! E isto soa-me - sim, soa-me - a muito giro porque a trompa é o instrumento de sopro cujo timbre mais se assemelha à voz humana.
Da primeira vez que o ginecologista me deu uma explicação muito pormenorizada, com o auxílio de uns rabiscos no bloco das receitas, ri-me. "Percebeu o que lhe disse?", perguntou. Disse-lhe que agora sim, que estava perfeito e que sentia as minhas trompas devidamente encaixadas!"