quarta-feira, junho 09, 2021

Luiz Pacheco e César Monteiro, Eternos Fugitivos do Bom-Senso e do Senso-Comum


Bom-senso e senso-comum não são exactamente a mesma coisa, podemos ter as duas coisas, uma delas ou até nenhuma. 

Ontem falei ao de leve de João César Monteiro, que é tudo menos uma personagem consensual, para quem privou com ele e para quem apenas conhece as suas "aventuras". Uns conseguem olhá-lo como um génio, mas outros só conseguem avistar um oportunista e mau-carácter, que passou a vida a fingir que era "outra coisa" e que tinha como passatempo preferido, chatear o próximo.

Luiz Pacheco, embora fosse ligeiramente diferente (não costumava fazer o papel de "personagem de manicómio"...), também é olhado quase da mesma forma. Há quem continue a olhar para ele como um génio, mas uma boa parte de quem o conheceu, mais que de vista, também o considera um mau-carácter, não tão oportunista como o César, mas com um jeito especial para se aproveitar da boa vontade dos outros.

Além de serem desprovidos de bom-senso, Pacheco e César viveram em fuga permanente ao que costumamos chamar senso-comum, como se ele fosse uma "praga" ou uma "doença crónica". Estou convencido que, tanto um como outro, se tivessem tirado a carta de condução e vivessem no nosso tempo, mais tarde ou mais cedo eram apanhados em contramão, em qualquer auto-estrada...

Ao contrário de outras pessoas, que tinham medo e vergonha de pedir o que quer que fosse,  em proveito próprio (alguns morreram na miséria...), Pacheco e César nunca tiveram qualquer pudor em "pedinchar" ou "cravar", quem quer que fosse (César talvez fosse mais mal-agradecido, que Pacheco. Digo isto a recordar-me de um testemunho sobre Prado Coelho, que ao vê-lo sentado numa esplanada, em Paris, teve o cuidado de mudar de passeio, e quando foi questionado pelo amigo, desabafou que o César Monteiro era capaz de lhe pedir para pagar o almoço e depois escrever em qualquer jornal que "tinha cravado um almoço em Paris ao nosso "adido cultural"...)

De César não conheço qualquer comentário a Pacheco, mas o "escritor maldito" demonstrou conhecê-lo muito bem quando o qualificou desta forma, numa entrevista que deu ao Blitz: «João César Monteiro não tem nada de parvo. Reconheço e desde há muitos anos que ele é um tipo muito inteligente, arguto, ambicioso. Não lhe faço nisto favor nenhum. Portanto e digamos: nada do que ele faça ou escreva ou diga (e tem uma linguiça de oiro!) é inocente ou é palerma ou descuidado. É, sempre e muito, calculado, premeditado, único. Não adianta a hábil confusão que é misturarem os termos 'genial' e 'louco', como me calhou ler por aí.»

Não deixa de ser curioso, que Pacheco tenha tentado criar alguma "distância" com o realizador (talvez por nunca ter beneficiado dos subsídios chorudos que César recebeu para fazer os seus filmes nem ter tido a oportunidade de fazer algo parecido com o filme "Branca de Neve"...).

Nunca os consegui olhar como génios. Nem acho que seja uma coisa positiva, ficarmos mais conhecidos pelas nossa excentricidades, que pela obra que deixámos. Tanto Pacheco como César, ficaram muito aquém dos seus talentos literários e cinematográficos. E isso não aconteceu apenas não pelo facto de terem nascido no nosso "pobre país"... 

Fotografia de Luís Eme - Vidais)


6 comentários:

  1. Concordo, em absoluto.
    E toda aquela vida com mulheres que tinham idade para ser suas filhas....estou a falar do Pacheco, claro!

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    1. O que eu mais critico era o seu dia-a-dia, de mão estendida e língua comprida e torcida, Maria.

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  2. Gosta dos dois, mas gosta mesmo. Reconhece tudo o que de mau, de um e de outro, se diz, mas não pode esquecer que se trata de gente culta, isto numa terra de ignorâncias várias e mediocridades a todo o tempo. Vitor Silva Tavares, editor que amava livros e odiava cifrões, conheceu-os muitíssimo bem e, tem a vaga ideia de que ninguém mais os conheceu daquele modo de, acima de tudo, escreverem bem esta língua nossa, apesar da cabotinice, dos sarcasmos, das maiores sacanices.
    Quanto a génios, esqueçam: não os há!
    Felizmente!

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    1. Não morro de amores por eles, Sammy.

      Não gosto de mal agradecidos nem de "cães que não conhecem o dono".

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    2. sammy, o paquete12/06/21, 11:47

      Ele sabe – oh, se sabe! – que o bornal de um gostador de livros tem que conter aquele número q.b. de gente por quem «não se morre de amores»…

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    3. É verdade. Sammy. :)

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