Tenho dois ou três amigos quase chanfrados, que primam em ser diferentes, em praticamente tudo na vida. Todos eles fingem que não gostam de ser portugueses. Mas mal passam a fronteira, dão uma cambalhota e voltam a sentir uma necessidade enorme em pertencer ao país do Ronaldo e do Mourinho.
Esfregam na cara de todos aqueles que só gostam de países com engraçadinhos de olhos e pele clara, que são sobrinhos afastados do Vasco da Gama e do Fernão de Magalhães e habitam normalmente em Portugal, um país que é quase uma ilha.
Um deles é músico, daqueles bons que até costumam ser convidados para fazer digressões com outros colegas de ofício, capazes de encher salas e pavilhões por esse mundo fora.
Pertence a uma "tribo" que gosta de oferecer nomes estranhos aos amigos. Embora não tenha nenhuma costela açoriana, é o "Whale Hunter" (Caçador de Baleias). Tudo porque um dia descobriram que gosta de raparigas com mais carne que osso.
Uma vez perguntei~lhe se ele sabia porque se tinha tornado músico e levei com uma resposta quase de cinema:
«Finjo que fui para músico porque tinha os pés rebeldes. Como havia sempre mais que uma coisa que me distraía fazia com que andasse a dançar as modas de forma diferente do resto da malta do baile, percebi que talvez resultasse melhor se eu fosse um dos tipos do palco com cara de "gira-discos".»
Soltou uma gargalhada antes de continuar: «Mas olha que é mentira. Mas como já a repeti tantas vezes, até eu já começo a acreditar que é verdade.
Soltou uma gargalhada antes de continuar: «Mas olha que é mentira. Mas como já a repeti tantas vezes, até eu já começo a acreditar que é verdade.
Com o jazz passa-se a mesma coisa, digo que durante os ensaios percebi que as minhas mãos eram parentes dos pés e acabou por ser o próprio professor a emprestar-me uns discos de jazz e a fazer um rascunho sobre o meu futuro.»
Nova gargalhada e uma pergunta: «Não achas que sou um bom mentiroso?»
Nova gargalhada e uma pergunta: «Não achas que sou um bom mentiroso?»
Abanei a cabeça e disse que não, antes de lhe dizer que ele também devia escrever histórias. Ele riu-se e desculpou-se, afirmando que não fazia ideia se ainda sabia escrever...
(Fotografia de Harry Callahan)
Luís, esta foto é belíssima... uma 'piquena' daquelas que tem mais carne que osso.
ResponderEliminarApesar da motivação que o levou a ser músico não seja grande coisa, ainda bem que é bom nessa arte. Sobretudo no jazz, pois, gosto muito.
Quanto a essa forma de estar, mentir como ele diz, não é a minha onda (ou a minha praia!) e tenho dificuldade em lidar com pessoas assim porque não lhes consigo achar piada e colidem com a minha atitude.
Sim, talvez no escrever histórias se movimentasse bem.
Quase todos os artistas são bons mentirosos, Isabel, gostam de fabular a vida. Especialmente aqueles que dão entrevistas a revistas de "mexericos". :)
EliminarPois, a imagem é belíssima.
ResponderEliminarQuanto ao mentir, comigo também não daria, certamente...
Pois é, Laura.
EliminarGostei muito da ideia de "pés rebeldes" como escolha de uma "vida" :)
ResponderEliminarO teu amigo deve ser um bom contador de histórias :)
É, dos bons, exagerados e mágicos, Glória. :)
ResponderEliminar