sábado, agosto 06, 2022

Hábitos e Contradições da Vida Citadina...


Vou voltar ao "Homem no Arame" de Maria Judite de Carvalho, porque houve mais uma das suas crónicas ("Geometria da Cidade") a fazer-me pensar na forma como nos relacionamos na cidade com a natureza e com os animais, ao ponto de até termos criado um partido que tanto quer defender a "vida", que consegue entrar nos domínios do absurdo.

Vou transcrever um parágrafo, que apenas está "datado" pelos hábitos das crianças dos anos 70, de resto, de lá para cá, apenas transformámos o verde mais ausente ou ainda mais "sagrado":

«Na cidade as árvores são toleradas, só isso. E nem as crianças se lembram de trepar por elas acima. São crianças da cidade com os seus hábitos de televisão e cinema, de histórias aos quadradinhos, de futebol ao domingo num campo rectangular, verde e inodoro como uma bonita alcatifa.»

Com esta leitura não só pensei na relação natural que existe nos campos entre o homem e a vida vegetal e animal, onde normalmente não se limita a defender e proteger os seres vivos, também as utiliza no seu dia a dia. Claro que focando-me no pormenor das árvores, talvez já não existam crianças nas aldeias para as trepar... Ou seja, acabei por recuar também aos anos setenta, onde passava uma boa parte das férias grandes na casa dos meus avós maternos e descobria a vida de uma forma prática (com muitos disparates à mistura, próprios da "idade das descobertas"), com muitas subidas às arvores e algumas quedas, que também faziam parte do nosso crescimento.

Mas fui mais longe. Pensei que nas aldeias onde ainda existe vida de campo, que não herdaram os hábitos da cidade (ou que não se limitam a ser refúgios de reformados que interiorizaram os hábitos das cidades...), é impossível tratar um animal como uma pessoa ou fazer de uma árvore um "troféu sagrado" ou uma "estátua", onde muitas vezes nem se utiliza a sua boa sombra...

(Fotografia de Luís Eme - Beira Baixa)


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