terça-feira, outubro 17, 2023

«Obrigado pelo civismo»


Não gosto nada da ideia de viver num país do respeito, aliás respeitinho, como aconteceu com o salazarismo e marcelismo. Mas também não tenho qualquer vontade de ser, mais um, num país que parece fazer gosto em manter bem viva a "ignorância atrevida", dando cada vez menos hipóteses ao ensino do civismo, tanto nas escolas como nos organismos públicos (sim o civismo ensina-se, através de palavras e de exemplos...).

O último exemplo estranho que tive aconteceu na segunda-feira, em frente do edifício da Segurança Social de Cacilhas, que fica numa avenida larga (e com um passeio também largo...). As pessoas em vez de formarem uma fila lateral, ocupavam todo o passeio, obrigando a quem circulava por aquele espaço a pedir licença para passar ou a ter de se deslocar para a estrada...

Quando passei pedi licença ao mesmo tempo que disse que deviam deixar um espaço para as pessoas passarem. Disse isto com a maior calma do mundo e sem qualquer sinal de irritação.

Assim que dei um passo em frente, houve alguém que soltou um "ooohhhhhh", que rapidamente se transformou em coro. Um homem mais atrevido virou-se para os outros e disse que eu devia pensar que "era o Presidente da República".

Com a mesma calma com que pedira para passar, agradeci aquele momento com um simples: «Obrigado pelo civismo.» 

O homem que me achou com cara de "Presidente da República", talvez com alguma surdez, quase que gritou «o quê?» E eu repeti, agora um pouco mais alto, parado no passeio, «obrigado pelo civismo.»

De um momento para o outro, baixaram todos os olhos e fizeram de conta que nada daquilo se passara e que eu não estava ali parado no passeio. 

Continuei a minha marcha, sem saber o que pensar daquela reacção colectiva, a um simples pedido, que achei fazer todo o sentido, dito sem qualquer arrogância.

Sei que isto é uma coisa muito pequenina, num mundo em que as pessoas se matam umas às outras, muitas vezes sem saberem muito bem porquê... Mas até as guerras, normalmente, começam por coisas pequeninas e sem qualquer sentido...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


7 comentários:

  1. Bom dia
    Passam tantos programas sem interesse na nossa comunicação social , porque não se fala numa situação desta falta de respeito e de civismo que hoje abunda neste nosso Portugal .
    É melhor assistir aos big brothers .

    JR

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    1. Não se fala de tanta coisa importante na televisão, só se explora a parte mais miserável dos sentimentos nos programas diários, a tentar fazer chorar as pedras da calçada, Joaquim...

      Também é assim nos "grandes irmãos"...

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  2. São situações com as quais nunca me deparei. : )

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    1. És uma sortuda, Catarina.

      Nos últimos tempos tenho assistido a situações impensáveis, pessoas a terem o comportamento dos condutores, apesar de serem apenas peões...

      Quase sempre egoístas, donos do mundo e de todas as razões... (a coisa chega a ser ridícula)

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    2. Isto do civismo (ou falta dele) parece que já faz parte do ADN de muitas sociedades. : )
      Faço sempre questão de dizer que este país não é perfeito, nem quero denegrir um em relação a outro. Nunca. Apenas constato factos/realidades. : ) E as diferenças entre determinadas realidades são abismais.
      Exemplo: Se estamos numa fila, o último a chegar fica sempre atrás. Tão simples como isso. A não ser em circunstâncias excecionais em que damos o lugar a alguém com determinados problemas ou crianças pequenas. Passeios obstruídos? Não, nem nos passaria pela cabeça. Estacionamento selvagem? As multas são demasiado elevadas e os carros são rebocados. Carros em cima dos passeios... até parece irreal. : ))
      E as árvores que foram plantadas mesmo no meio dos passeios em que as pessoas com carrinhos de bebés se têm de desviar? Impensável. Neste caso, é uma falta de “civismo/organização” municipal. : ))

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    3. Mas pode-se ensinar e estimular, Catarina.

      Os bons exemplos fazem todo o sentido nestes casos... mas é tão difícil.

      (Sempre que vejo um "jabardo" a deitar lixo pela janela do carro, gostava de ter uma máquina qualquer, que fizesse com que o papel, a lata ou o bocado de maça, regressassem às suas mãos, no interior do carro)

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