terça-feira, agosto 06, 2013

Ser Diferente Sempre fez a Diferença


Escutava-o com um sorriso, juntamente com o Júlio, que de vez enquanto dizia uma ou duas palavras para apoiar as frases do amigo de sempre.

Falávamos dos bailes, um dos lugares de eleição para se conhecerem miúdas giras e das outras, durante uma boa parte do século XX. Ele era avesso a todos aqueles salamaleques, ao ter de receber a aprovação da mãe ou da tia da rapariga com quem pretendia dançar.

Essa era uma das razões para dançar poucas vezes, embora não se esquecesse de lançar olhares provocadores para as jovens que lhe caíam no goto. Sem se aperceber era um dos rapazes mais populares nas conversas femininas, pela sua capacidade de adensar o mistério que o rodeava. Elas diziam um pouco de tudo. Quase todas achavam que não dançava porque era comprometido. Faziam apostas que ora o davam como casado, amantizado ou de namoro sério.

Como conversa era coisa que não lhe faltava, no bufete fazia a diferença, porque havia sempre alguma moça com vontade de o conhecer. Queriam sempre saber porque razão não dançava. Sentia-se na obrigação de inventar histórias, até chegou a dizer que tinha um problema numa perna, mas a maior parte das vezes dizia que só sabia dançar o tango. E foi assim que passou a ser o "tanguista", até para os amigos...

O mais curioso é que tinha sempre alguém que se oferecia para dançar esta música que não se limitava a ser "sensual" e que se popularizara em Buenos Aires e atravessou o Atlântico, para continuar a fazer das suas.

Júlio recordou algumas aventuras mais perigosas,  protagonizadas por namorados ciumentos, que se sentiam traídos, por serem preteridos na momento solene em que se dançava o tango no salão.

Ele sorriu e disse: «ainda hoje, a única música que me dá gozo dançar, é o tango.» Era a única que entrava completamente dentro dele. Júlio deu mais um achega, confirmando que ninguém dançava o "hino" da Argentina como ele..

Mas o melhor da tarde ainda estava para vir, quando ele nos confidenciou: «guardo alguns bilhetinhos mais que prometedores, que me eram colocados discretamente nos bolsos do casaco, por meninas incapazes de partir um prato, numa caixinha de madeira.»
Bilhetes que não se limitavam a ser promessas de amor, havia também alguns de encontros...

O óleo é de Raymond Leech.

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